07 janeiro, 2011

I'm Sorry / Brenda Lee

E agora, de quem é a culpa?


Do currículo de Rui Rio e segundo os seus acólitos, um rigoroso gestor, mais dado a factos que a espalhafatos, não faltam malogros e promessas por cumprir. A manifesta ausência de um projecto para cidade resumiria em poucas palavras a dimensão liliputiana do autarca do Porto. No entanto, por uma questão de objectividade, será sempre bom lembrar aos eleitores algumas das obras e problemas  que ao fim de dois mandatos ainda estão por resolver.

A saber:
  • Falta de projectos para o Parque da Cidade
  • Impasse no projecto do centro de Congressos e requalificação do Pavilhão Rosa Mota
  • Trabalho avulso e pouco estruturado de Reabilitação Urbana
  • Obras do Mercado do Bolhão sem princípio à vista
  • Indefinição sobre o Mercado de Bom Sucesso
  • Fim e desvio das Corridas de Aviões Red Bull para Lisboa
  • Abandono do Rivoli depois de o confiar às mãos do lisboeta La Féria
  • Perda acentuada da população do centro do Porto [inferior à do princípio do século XX].
Mas, a menina dos olhos de Rui Rio, que tanto protagonismo [e votos] lhe deu, todo o ruído em torno do Plano de Pormenor das Antas, ao qual a anterior Presidente da Associação de Comerciantes oportunisticamente se colou, dando origem ao gabinete Comércio Vivo para justificar os 5 milhões de euros que recebeu do Grupo Amorim como compensação ao pequeno comércio pela construção do Dolce Vita, está agora a despir a verdadeira face de tão grande polémica!

Afinal de contas, a Comércio Vivo, responsável pela gestão do cinema Batalha, agora já não pode queixar-se da influência "nefasta" do Shopping nem da falta de dinheiro [porque já o recebeu], para justificar o encerramento do histórico cinema portuense.

Não tarda, vão dizer que a culpa é do Estádio do Dragão... Será,  Dr. Rui Rio? Pense nisso.

05 janeiro, 2011

Para refrescar memórias




A INAUGURAÇÃO DA SEDE DO PARTIDO DO NORTE JÁ FOI HÁ ALGUMAS SEMANAS, MAS NUNCA É DEMAIS LEMBRAR OS NORTENHOS QUE, APESAR DE TUDO, PODE ESTAR AQUI A LUZ AO FUNDO DO TÚNEL, DO NOSSO DESCONTENTAMENTO.

Seriedade à moda de Cavaco Silva

[por CARLOS ABREU AMORIM, in DN]

1. Num dos debates televisivos da pré-campanha, Cavaco Silva, com a modéstia que habitualmente lhe é reconhecida quando se avalia a si mesmo, garantiu aos portugueses que "para serem mais honestos do que eu, têm que nascer duas vezes". A frase é sintomaticamente interessante - revela-nos o quanto Cavaco Silva se deleita com as qualidades que imagina exclusivamente suas, e, especialmente, levanta o véu a um dos maiores equívocos da portugalidade: o conceito de honestidade.

A ideia de verdade e de honestidade separa diametralmente as culturas do Norte e do Sul na Europa e nas Américas. Os significados variam consoante os pontos cardeais, acabando a geografia por reflectir concepções completamente distintas. A ética prevalecente nos países de tradição cultural católica fez medrar a noção de mentira piedosa exaltando o carácter instrumental e compromissório da verdade quando em risco de aparente colisão com um fim que se julga principal - donde, faltar à verdade, consoante as circunstâncias, pode ser permitido, aconselhável e, demasiadas vezes, louvável.

De forma transversal na sociedade portuguesa, a verdade, qualquer uma, converteu-se numa impressão plástica, moldável, quase sempre condescendente. Talvez exista, mas não conheço, qualquer outro lugar onde subsista um antigo ditado popular que sentencie o infeliz que ensaie cingir-se à exactidão dos factos deste modo tão emblemático: "Dizer a verdade como os malucos". Em Portugal, falar verdade sem rebuço constitui um acto de irrecuperável falta de etiqueta apenas tolerada aos incapacitados ou às crianças (muito) pequenas.

2. A paredes-meias com a verdade está a honestidade. Cavaco jura, em voz muito alta, que é honesto, mais do que qualquer outro. Acontece que a honestidade dos homens públicos é muito ardilosa, entre nós.

Para um político, o seu paradigma sempre clamado ainda é Salazar. O ditador viveu sobriamente, embora dominasse o País com mão de ferro. Nem os seus inimigos mais jurados alguma vez sugeriram que Salazar tivesse adquirido bens de modo ilícito. No entanto, permitiu que um banqueiro mobilasse para sempre o palácio onde a rainha da Inglaterra iria pernoitar. E, à sua volta, admitiu um rodopio de tráfico de influências, favorecimentos e o condicionamento industrial que enriqueceu alguns, os seus amigos, em detrimento do País. Salazar, ele mesmo, não o fazia mas era culpado: fingia não saber aquilo que os outros compunham em seu nome.

Cavaco, provavelmente sem o suspeitar, trata a honestidade como o tirano beirão: ele próprio não lucrou com a vigarice do BPN nem com os inúmeros desmandos que tantos dos seus protegidos têm perpetrado mas é impossível que não percebesse o que acontecia em seu redor e nem sequer deduzisse o calibre da corja que transportou consigo para os lugares mais decisivos do poder. Só que nunca se incomodou: centrado em si, julga que nada daquilo que excede a sua conduta pessoal lhe pode ser assacado, mesmo politicamente. Assim, fecha os olhos ao resto. Nisso, afinal, é excessivamente igual a todos nós...

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Nota de RoP: Mais populismo?...

Populismo

A 5ª. edição [de 1948] do prestigiado dicionário Augusto Moreno ainda não constava do termo populismo.  Deste substantivo, agora muito em voga, o mais próximo que encontrámos são os adjectivos popular e populista cujo significado é praticamente o mesmo e traduzem algo ou alguém que é amigo do Povo. Nas enciclopédias ou dicionários mais modernos é fácil encontrarmos tradução para populismo. No Wikicionário, por exemplo, diz o seguinte: estilo de fazer política, que consiste no uso de promessas demagogas, insuflações regionalistas, e atribuição de rótulos aos adversários eleitorais, com vistas a criar um clima de messianismo e segregacionismo político, de modo a beneficiar o seu praticante.

A questão que me sugere levantar e que devia obrigar certas pessoas - como políticos e empresários - , a reformular as suas intervenções públicas antes de aplicarem tão estafada palavra, é saber se alguém em consciência se pode dar à honra suprema de afirmar que nunca usou de argumentação populista para atingir os seus objectivos. Além de que, para o mesmo efeito, e salvo melhor explicação, seria talvez mais simples e eficaz falar apenas de falsidade, ou de hipocrisia.

Se quisermos registar as declarações dos políticos, antes e depois de serem Governo, depressa concluiremos pelas gritantes contradições que não há gente mais falsa e oportunista do que eles próprios. Diria mesmo que a expressão populismo terá sido criada à medida das suas tradicionais tendências, onde o cumprimento das promessas é o último dos desígnios a atingir. A preguiça e o profundo desprezo pelo serviço público está-lhes na massa do sangue. O oportunismo, esse, é o único "combustível" que conhecem.

Podemos aqui e além discordar das ideias e decisões de terceiros, mas não podemos por isso partir do princípio que nunca iremos um dia concordar com eles. Quando o Bastonário da Ordem dos Advogados afirma que [cito] "não há nenhum partido político verdadeiramente interessado no combate à corrupção" e diz que "o financiamento dos partidos é uma das principais causas de corrupção em Portugal", alguém de bom senso e sem rabos de palha será capaz de dizer que ele está a ser populista? Quando o polémico e pouco convincente candidato presidencial José Manuel Coelho declara que "o povo está farto dos partidos que só metem no Poder senhores engravatados que roubam o erário público", estará a falar de uma abstracção, de algo distante da realidade? Será populista? E que dizer de Paulo Morais, que denuncia como iníqua e suja a nova legislação para o financiamento das campanhas eleitorais? Teremos de discordar dele só para não parecermos populistas?

Até prova em contrário, continuo convencido que o maior defeito do regime Democrático,  é  a incapacidade para se aperfeiçoar em termos selectivos, tanto na escôlha como no controle de quem exerce o Poder. Temos um Governo constituído por gente incompetente e desonesta, e no entanto, esta infantil Democracia obriga-nos a mantê-los no Poder e, pior do que isso, a continuar a assistir impotentes à destruição económica e social do país,  e da própria integridade territorial.

03 janeiro, 2011

Grande entrevista de Pedro Baptista a jornal da Galiza

Novas da Galiza - Pode falar-nos um pouco dos seus antecedentes em termos políticos? Sei que o seu percurso começou durante o fascismo.

Pedro Baptista – Aos sessenta e alguns anos é a segunda vez que estou metido no projeto de criação de um partido. Na primeira vez tinha 21 anos. E às vezes dou por mim a fazer comparações entre uma coisa e a outra. As comparações não as faço muito em torno de mim mas em torno do mundo que me rodeia. E de facto são mundos diferentes.

NGZ - E qual foi esse primeiro primeiro partido?

PB – Foi o Grito do Povo, um jornal-movimento que deu origem à OCMLP, que era uma organização comunista, como eram todas, com uma orientação maoísta, como eram quase todas, que ultrapassou e abafou um pouco o PC, como também todas, no fim dos anos 60. E essa foi a minha primeira experiência política organizada, como um dos fundadores desse movimento.

NGZ - E esse segundo momento?

PB – Não tem nada a ver. Num caso e noutro, resulta de uma indignação pessoal e de sentir a nível social essa mesma indignação. Neste caso eu era militante do PS, na oposição já há muito tempo, principalmente neste período do [Governo de] Sócrates, nos últimos anos, estava completamente na oposição interna. Fui verificando a impossibilidade de fazer qualquer alteração interna dentro do PS, as coisas estavam montadas em termos de um aparelho e de uma oligarquia, que corresponde no fundo à oligarquia financeiro-política que domina o país. Senti na sociedade e várias pessoas falaram comigo no sentido de se avançar com uma iniciativa como esta. Se quer que lhe conte a estória específica, isto surgiu de uma conversa num canal de televisão daqui do Norte, num debate, em que eu, que sou que sou um homem de esquerda, convergi com alguém vindo da direita, dos setores conservadores, como é o Anacoreta Correia. Concordámos que havia uma situação que implicava a criação de uma força autónoma, aqui no Norte, para defender os interesse da Região. Este é o ponto essencial de tudo, uma vez que isto não se tratava de nenhum processo de desenvolvimento, tratava-se simplesmente de uma situação dramática que era a decadência, em particular dos últimos dez anos, em que o Norte foi a única região do país a regredir em todos os indicadores: económicos, sociais, culturais, etc. Então colocámo-nos de acordo sobre a necessidade de criar uma força autónoma. Porquê? Porque as pessoas do Norte têm consciência social e económica de que estão a ser espoliadas pelo Governo Central. Têm também consciência de que não conhecem os deputados que elegem de sítio nenhum, que vão tratar da vidinha deles e em momento nenhum pensar nos interesses do Norte. Aqui é que está o clique da questão: temos de perceber que cada um de nós como cidadão, contribuinte e como eleitor, como participante da democracia, tem direito a um voto, e esse voto é tão precioso como numa revolução uma espingarda. E portanto cada cidadão do Norte deve perceber que tem uma arma poderosíssima, que é o seu voto, mas que não deve ir para o inimigo, deve ficar consigo, deve ir para uma força que defenda o eleitorado – esta parte de Portugal – e ao defender esta parte de Portugal defende Portugal. Porque os votos que têm sido utilizados até agora pelo Norte têm ido diretamente para os partidos que dizem que estão organizados por todo o país mas que na verdade são completamente dominados pelos diretórios nacionais, que estão sediados em Lisboa. A lista do Porto, de Braga ou de Viana ou de Vila Real ou de Bragança do PS, do PSD, do CDS ou do PCP – mesmo do Bloco de Esquerda – é tudo gente de confiança da direção nacional dos respetivos partidos – ou seja, direção de Lisboa – que lhes dá garantias que eles em momento nenhum colocarão a defesa do seu eleitorado acima da defesa da estratégia desses partidos. E qual a estratégia desses partidos, sediados em Lisboa? É a defesa dos interesses da região de Lisboa, a defesa dos interesses do centralismo, a defesa dos interesses de uma corte onde vão colocando pessoal – seja como assessores, seja como secretários de Estado – em todos os lugares da administração e da política central. O necessário é que os cidadãos façam o clique. E esse clique é organizar uma força autónoma do Norte para defender os interesses do Norte, votando em peso neles. Nesse caso tudo estremecerá e tudo mudará. Nesse caso, se os partidos que são dirigidos por Lisboa forem derrotados por um partido que é dirigido pela região que representa, então tudo mudará. É este o projeto do Partido do Norte – um projeto talvez com alguma loucura – mas em 1969, 70 e 71, quando decidimos derrubar a ditadura, também houve gente a dizer que era um projeto louco, e no entanto passados três anos a ditadura estava derrubada. E foi derrubada pelo exército porque se criou um movimento de opinião a nível popular que influenciou o próprio exército. O próprio 25 de Abril foi o resultado do trabalho de revolta e de contestação que foi criado pelas ideias. As ideias é que se transformam em factos.

NGZ – Quais os objetivos imediatos do partido? Os princípios e os objetivos misturam-se um pouco. Um dos objetivos primaciais e primordiais do Partido do Norte é criar em Portugal Autonomias Regionais. As Autonomias Regionais dos Açores e da Madeira têm sido um sucesso absoluto – para eles. Se nós tivermos Autonomias Regionais em todo o país que sejam um sucesso para essas regiões são um sucesso para o país. Nós temos de perceber que o país é um todo que é constituído por partes. Um todo não é uma coisa abstrata, uma coisa que só existe no céu – o todo existe aqui na Terra, e é constituído por partes. Ora se as partes funcionam, se as partes se desenvolvem, o todo desenvolve-se. Se as partes não se desenvolvem, o todo não se desenvolve. Nós temos como objetivo…

NGZ - A regionalização, talvez?

PB - Exatamente. A criação de Autonomias Regionais, com Governos Regionais eleitos, que são necessárias para o desenvolvimento e são necessárias também no contexto de uma reforma imediata global do Estado para fazer frente à situação de défice público que resulta das políticas centralistas e do regabofe explorador em que o centralismo tem vivido de ter um aparelho de Estado a nível central absolutamente colossal, enquanto que ao nível da ligação com as populações, ao nível regional, é completamente deficitário. Isso provoca um terrível défice das Finanças Públicas e também uma grande ineficiência do aparelho de Estado. É essa a situação que se pretende inverter. Nós temos que lutar contra a cabeça do polvo para eles manterem e reforçarem as ligações do Estado às regiões e às pessoas – porque juntas de freguesias, câmaras municipais, tudo isso é Estado – e quando nós falamos de regionalização é uma regionalização para diminuir a despesa central do Estado e para diminuir o défice público. Para diminuir a despesa do Estado, para aumentar a eficiência do Estado e para aumentar o desenvolvimento económico. E nós somos contra a ideia de roubar a capacidade de investimento ao país para concentrar nos três A, os três Abortos: o Caia-Poceirão [Alta Velocidade], o Novo Aeroporto de Lisboa e a Terceira Travessia [do Tejo]. Somos contra isso. Achamos que é preciso manter o investimento, mas o investimento junto da malha produtiva, onde se criam produtos transacionáveis e onde se criam produtos de exportação. Hoje toda a gente fala disto mas nós [MPN] dissemos isto há sete meses e foi um escândalo na altura. Este é o caminho. Mas isso implica cortar com os investimentos faraónicos. Este Governo tem uma vantagem incrível – que é uma desgraça para o país – que é o apoio do PSD e do CDS ao corte nas bases do aparelho de Estado para manter os clubes de cortesãos no Terreiro do Paço, e para manter o esbulho do país (em relação ao investimento público), para a deslocação das verbas da linha Porto-Vigo, e a deslocação de todos esses investimentos para o Caia-Poceirão, Novo Aeroporto de Lisboa e Terceira Travessia tem o apoio do Bloco de Esquerda e do PCP. Chegamos à conclusão que os deputados dos cinco partidos estão completamente alienados do país. Portanto nós queremos a regionalização para que as regiões do país tenham auto-governo e voz, legal e autónoma, gastando menos dinheiro ao país. Para que o Estado sirva para ajudar as pessoas no ponto de vista social e sobretudo ajudando-as no ponto de vista económico dinamizando o tecido que existe em Portugal, de pequenas e médias empresas, dinamizando-as, seja através de incentivos, seja através das mil e uma propostas que temos plasmadas nas nossas Linhas Programáticas que temos disponíveis no nosso site, abertas à discussão pública, e mais aquelas que se seguirão no período de debate que estamos agora a abrir com a sociedade para colher novas ideias e para auscultar mais pessoas. Os objetivos da regionalização, que se misturam um pouco com os objetivos do MPN, são estes. Em relação à questão concreta de como fazer a regionalização, ela só será feita na medida em que haja um grande clamor popular na sua defesa, nomeadamente na nossa Região. Desde que haja uma grande exigência popular para que ela seja feita. Em democracia as coisas são assim. Foi assim que foi feita nos Açores e na Madeira. E na medida em que haja deputados na Assembleia da República que sejam porta-vozes desta bandeira, essencial e não aqueles que utilizam a regionalização quando estão na oposição e se esquecem quando estão no poder, como tem acontecido com o PSD e o PS. Sempre que estão na oposição agitam a bandeira da regionalização e sempre que vão para o poder colocam-na na gaveta.

NGZ – Então o objetivo primeiro será serem eleitos para a Assembleia?

PB - O objetivo imediato e primeiro será elegermos um grupo parlamentar para a Assembleia da República, porque são as próximas eleições que temos.

NGZ - A Constituição de 1976 fala da instituição de Regiões Administrativas no país. Isso foi feito na Madeira e nos Açores. Portanto, a Madeira e os Açores já tiveram a sua regionalização. O que falhou no referendo de 1998?

PB - O que falhou não foi em 98, foi logo em 76. Foram criadas as Regiões Administrativas nos Açores e na Madeira e não foram criadas no Continente. E quer que lhe diga porquê? Porque nos Açores tinham medo de uma coisa chamada FLA [Frente de Libertação dos Açores], que era um grupo separatista e na Madeira de um grupo semelhante que era a Frente de Libertação da Madeira, FLAMA. Portanto foi o aparecimento de grupos, que aliás entabularam relações com os Estados Unidos nessa altura, dizendo que se em Portugal prevalecesse a esquerda e se a bandeira vermelha do PC flutuasse sobre Lisboa, proclamariam a independência dos Açores e da Madeira, que surgiu o contexto em que Mário Soares e o Partido Socialista acederam a cumprir a Constituição. Mas como no Continente não houve a mesma reivindicação, como os líderes regionais de Portugal Continental esqueceram rapidamente o que tinham aprovado na Assembleia Constituinte para a Constituição de 76, isso não aconteceu aqui. É uma situação vergonhosa, é um escarro da nossa história jurídica e da nossa história constitucional. Porque foram anos e anos de inconstitucionalidade por omissão. Agora repara, as regiões estão lá desde 76, não é desde 98. De 76 a 98 vão 22 anos. Em 97-98 o que aconteceu foi: vamos para a frente com a regionalização. Eu, que era deputado do Partido Socialista entre 95 e 99, acho que tive algum peso nisso. Sinto-me honrado de saber o peso que tive nisso e acho que outras pessoas que hoje estão no Partido Socialista também tiveram algum peso nisso. Ao mesmo tempo outras pessoas, também do Partido Socialista, e também de outros partidos, como o PSD e o CDS, fizeram tudo para impedir essa concretização. Aliás, deixe-me voltar atrás um bocadinho, porque logo em 91 foi aprovada a Lei-Quadro da Regionalização com Cavaco Silva, que logo a seguir decidiu rasgar todo esse capítulo da Constituição. A regionalização ia ser feita em 91, havia um ministro que estava concentrado nisso, que era um homem daqui do Porto, Valente de Oliveira, e até era bom perguntar-lhe a ele o que aconteceu, porque de repente, da manhã para a noite o primeiro-ministro decidiu rasgar um capítulo inteiro da Constituição e hoje até é Presidente da República, veja lá o absurdo deste país. Isto em 91. Em 97-98 tentou-se avançar finalmente e o que é que aconteceu? Mais uma vez, houve um acordo, uma conspiração, que incluiu o estado-maior do PS e do PSD – Marcelo Rebelo de Sousa e António Guterres cozinharam ali uma coisa com Jorge Lacão, que hoje é ministro do Partido Socialista, veja lá como estão as coisas, no sentido de que a regionalização só se podia fazer se houvesse um referendo. Foi então introduzido um aborto na Constituição – uma Constituição que nunca foi referendada passa a ter uma parte que tem de ser referendada. E a partir daí surgiu um referendo. Convenhamos que a Lei-Quadro das Regiões Administrativas não era uma grande lei-quadro, não garantia que a regionalização não aumentasse a despesa e a verdade é que com a campanha feita contra a regionalização pela direita e a extrema-direita, onde pontificou o Paulo Portas, com apoio de muita gente do PS, são naturais os resultados que se verificaram.

NGZ – O mapa das regiões também era diferente.

PB - A questão do mapa diferente serviu de pretexto a muita gente para dizer que era contra a regionalização. Enquanto que nós temos um mapa consensualizado, que é o das cinco regiões, nessa altura foi criado um mapa muito esquisito que parecia mais ao sabor dos interesses de cada uma das personalidades influentes do que propriamente duma tradição que já tínhamos que vinha dos anos 60. Hoje, com as cinco regiões-plano parece que tudo é mais fácil. Convém não esquecer que são as regiões-plano considerados em termos europeus, consideradas aqui na nossa tradição desde os anos 60. Correspondem às NUTS II e existem depois as NUTS III, que são as sub-regiões. Às vezes em Trás-os-Montes dizem, “nós não queremos pertencer a uma única região”. Ora o Norte tem vários Nortes. É por isso que o Norte é uma NUTS II, é uma região, e depois há oito sub-regiões no Norte, e todas elas têm uma palavra e têm os seus instrumentos de influência e de poder democrático dentro da Região Norte.

NGZ - Como é que se pode ser regionalista e nortenho vendo que foi no Norte que houve mais votos contra a regionalização, em 98?

PB – A situação de 98 não tem nada a ver com a situação atual. Eu até nem sei se foi assim, na Área Metropolitana do Porto a regionalização venceu numa série de grandes concelhos, como Matosinhos, na Maia e no Porto. O que se notou é que os partidos da direita, PSD e CDS, fizeram uma campanha muito forte contra a regionalização. O PS não fez campanha nenhuma, e portanto isso teve influência na votação das pessoas, que foi uma votação mínima. Convém não esquecer que o referendo à regionalização não foi vinculativo, mais de 50% das pessoas inscritas não votaram.

NGZ – O modelo que o Movimento Partido do Norte defende é semelhante ao modelo do Estado espanhol?

PB - Sim. Nós achamos que não tem que haver homogeneidade no desenvolvimento das regiões. Ou seja, a sua dinâmica depende das próprias características económicas, sociais, culturais e políticas de cada região. E portanto achamos que só deve existir a segunda pergunta no referendo e não a primeira. Ou seja, não deve haver uma pergunta a nível nacional a perguntar se querem ou não a regionalização. A única pergunta a ser feita deverá ser: “quer ou não quer a sua Região? Só a segunda pergunta tem algum sentido. Ainda bem que o PSD apareceu com a proposta das regiões-piloto, porque isso permite justificar este ponto de vista. Pode haver uma região que não queira [a regionalização], e se não quiser não tem, mas passado um ano ou dois já a vai querer. Não há ninguém no mundo que diga mal da regionalização.

NGZ - Depois de a ter.

PB - Depois de a ter. Não há nenhum país do mundo, muito menos da Europa que diga mal da regionalização. Ora estávamos a falar do modelo que ocorreu em Espanha. A Galiza tem uma dinâmica, a Euskádia tem outra dinâmica, a Catalunha tem outra dinâmica, e em qualquer delas foram criados graus de autonomia diferentes, como aqui com os Açores e a Madeira, isso dependendo das dinâmicas regionais. Mas para que isso exista é preciso uma dinâmica política regional, são precisos partidos regionais, é preciso haver país, porque nós em Portugal não somos um país, neste momento somos um deserto de que vive a capital. Não temos um desenvolvimento policêntrico como tem a Espanha, e é isso que se pretende, que as próprias regionalidades (ou como se diz em Espanha, as nacionalidades e as nações) desenvolvam o policentrismo e o desenvolvimento multipolar. Em Espanha surgem movimentos de independência o que é natural porque têm razões históricas, o que não é o caso daqui, onde não há qualquer reivindicação de independência. Aliás aqui no Norte somos os fundadores da nacionalidade, existimos desde 1143, Lisboa só foi tomada posteriormente, quando procedemos à conquista de Lisboa aos mouros, portanto mal era que quiséssemos agora abandonar esse passado. Aqui não se põe nenhuma questão de independência. Temos uma língua única, uma cultura que tem aspetos unitários mas tem aspetos diferenciados, uma idiossincrasia com aspetos unitários mas também com aspetos diferenciados, temos uma pluralidade. O país só lucra se essa pluralidade se exprimir politicamente. Às vezes perguntam-me: “E se aparecer um Partido do Sul?”. Isso é a melhor coisa que pode acontecer. Se aparecesse um Partido do Sul até podíamos fazer uma coligação pós-eleitoral e governarmos os dois. De certeza que comandávamos melhor do que a oligarquia financeiro-política que tem levado o pais ao estado em que está.

NGZ - Continuando pelo Estado espanhol, como é que vê o estado das relações entre o Norte de Portugal e a Galiza e como augura o futuro?

PB - Oiça, eu acho uma coisa espantosa isso. Na Galiza toda a gente fala de Galiza e Norte de Portugal como uma euro-região, e aqui no Norte de Portugal ninguém sabe que somos uma euro-região. Nós não sabemos, ninguém sabe isto. Os galegos sabem, mas aqui não; os galegos têm um governo regional, nós não temos absolutamente nada. Nós temos perto de 100 Câmaras Municipais no Norte de Portugal, mas não temos nenhuma consciência de que a nível europeu já somos uma euro-região. O que vejo é que é preciso desenvolver o mais possível as relações entre as pessoas, entre as associações, entre os partidos – os partidos que sejam representativos da região – no sentido de estabelecer e estreitar cada vez mais os laços transfronteiriços. Para isso também é necessário romper com o muro que foi criado pelo salazarismo e pelo franquismo – o muro fronteiriço. A fronteira acabou e nós temos agora de desenvolver cada vez mais os meios de comunicação, os meios de ligação entre o Norte de Portugal e a Galiza. Mas o aspeto fundamental no que diz respeito ao Norte de Portugal, embora esteja a falar para um jornal galego, o mais importante é terem consciência de que pertencem a uma euro-região, que na Galiza percebe-se, mas aqui não. Na Galiza percebe-se porque têm um governo regional, e nós ainda não temos nada. Nós no MPN ultimamente temos defendido – para além desta reivindicação política de termos a Região Norte e fazermos a eleição de um governo regional – a necessidade de iniciativas concretas. Mesmo com as Câmaras Municipais e o governo regional [da Galiza]. Por exemplo esta questão da linha Porto-Vigo. Não há razão nenhuma para estarmos à espera. As cerca de 100 Câmaras do Norte de Portugal, ou algumas delas, deviam associar-se no sentido de criarem uma empresa pública, que pode ser feita com a participação do governo regional galego – já tenho a fundamentação jurídica – para eles próprios criarem uma empresa (como a que existe em Portugal, a REFER, mas de caráter regional) para concessionarem a linha e para que o concessionário se candidate aos fundos europeus. Nós por um lado temos de agir no plano da reivindicação, mas por outro lado temos de agir no plano da ação imediata. É bom que os presidentes de Câmara daqui do Norte também deixem de serem apenas peões e percebam que são pelo menos bispos e torres deste xadrez europeu. E que tomem iniciativas. E nesse sentido defendemos, no MPN, se tivéssemos meios para avançar com isso, nós já tínhamos criado uma empresa pública intermunicipal e transfronteiriça para concessionar a linha e para que o concessionário-construtor se candidatasse aos fundos europeus, avançássemos na linha Porto-Vigo e conseguíssemos de facto uma situação que impediria o esbulho de que estamos a ser vítimas – do tipo colonial – pelo governo de Lisboa. Pensamos que é nesta via que devemos seguir no que diz respeito à fronteira norte, com a Galiza, e também, no que diz respeito à fronteira norte-leste, desenvolver relacionamentos com Leão e Castilha, também no que diz respeito a essa zona do nordeste transmontano que também tem a mesma problemática e onde projetos como o avanço da Linha do Douro até Salamanca e outros projetos transfronteiriços têm a maior importância. Mas realmente o que é axial, o que é o eixo do ponto de vista político é esta euro-região Norte de Portugal-Galiza. É bom que os galegos também tomem consciência – os que ainda não têm – que o problema do Norte de Portugal com Lisboa é semelhante ao problema que a Galiza tem em relação a Madrid. São dois problemas paralelos.

NGZ – Já existem duas entidades que trabalham dentro do eixo. Uma é o Eixo Atlântico, uma associação de Câmaras, outro é o Agrupamento Europeu de Cooperação Territorial – a primeira a nível europeu – que, disseram no ato fundacional, poderia movimentar fundos europeus. Antes de termos essa autonomia, é importante agilizar estas entidades?

PB - É importante por um lado ir avançando nestas entidades cooperacionais que a União Europeia propicia, mas temos de saber que o mais importante é conquistar uma bandeira. Para nós, no Norte, conquistar a bandeira Norte, e depois conquistarmos a bandeira da euro-região Norte de Portugal-Galiza. Mas que ninguém pense que isto é uma luta fácil – é uma luta muito difícil. Porque Lisboa, infelizmente – não é Lisboa, são algumas pessoas de Lisboa-, nomeadamente do Governo atual, e falo em particular do Ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, que é praticamente um fanático em relação a isto, vêem com maus olhos o desenvolvimento do Noroeste Peninsular, e na sua mente, que me parece até um pouco psicótica, vêem nisto um fator de desestabilização. Ora se há alguma coisa que a Espanha dos últimos 30 anos ganhou foi exatamente o desenvolvimento dos diversos pólos, foi o crescimento das suas regiões, foi um sucesso absoluto. Aqui em Portugal o centralismo é um centralismo mesquinho que nem sequer consegue compreender a dialética entre uma unidade nacional e o desenvolvimento regional.

NGZ – O Movimento Partido do Norte, e futuramente o Partido do Norte têm como objetivo principal a regionalização. Depois de a conseguir, o Partido desaparece ou muda?

PB – O objetivo principal não é a regionalização, o objetivo principal é a defesa dos interesses do Norte. A regionalização é uma das muitas medidas que interessam à defesa dos interesses do Norte. O Partido do Norte é para defender os interesses do Norte, com regionalização ou sem ela. Defende antes da regionalização e defenderá depois. É para defender esta parte de Portugal. Agora é a defender esta parte de Portugal que se está a defender Portugal. É um Partido do Norte, é um partido regional e é um partido nacional. Porque tem consciência que ao ser um partido regional e ao defender a região está a defender o país. E de que maneira nós defendemos o país? Até fomos nós que fundámos o país. Nos momentos mais difíceis da história tem sido o Norte o elemento essencial para a consolidação nacional do país. A regionalização é o objetivo primeiro? O objetivo primeiro é a defesa dos interesses da Região Norte. A regionalização defende os interesses da Região Norte? Defende, assim como defende os interesses das outras regiões. O que nós pensamos é que a defesa da Região Norte através de um Partido do Norte é a defesa do país inteiro e é a defesa do sistema democrático, também. Porque os nossos deputados vão ser deputados com um compromisso direto em relação à defesa da Região Norte. Vão fazer um juramento, que estamos a preparar, sobre a defesa do eleitorado da Região Norte, e assim defenderem o país. Se o traírem, acontecer-lhes-á o que acontece aos traidores. Trata-se também aqui de aproximar os eleitores dos eleitos. Enquanto atualmente, com este sistema, as pessoas não sabem em que é que estão a votar. Quem votar nas próximas legislativas no Partido do Norte sabem que vão votar em pessoas que defenderão sempre a Região e nunca votarão um orçamento que prejudique o Norte. A sua forma de defenderem o país é defenderem a região. E terão toda a consideração pelos deputados das outras regiões que defendam as outras regiões.

NGZ - Pode dar algum exemplo do mal que o centralismo nos tem feito?

PB - Basta ver, nos últimos dias, esta tentativa de assaltar o Porto de Leixões, por exemplo. Queriam tomar o Porto de Leixões e passá-lo para uma gestão nacional, da mesma forma que não querem que o Aeroporto Sá Carneiro se autonomize, querem mantê-lo dominado pelo centralismo para que se possa fazer a gestão que interessa a Lisboa. Já que estamos a falar com os nossos companheiros e compatriotas galegos, basta ver o assalto às verbas da via férrea Porto-Vigo lá para baixo, para o Caia-Poceirão. É uma vergonha que demore tanto tempo uma viagem entre o Vigo e o Porto, de 120 km. Não precisamos de TGV, de grandes velocidades. Mas precisamos um meio de transporte que faça esses 120 km numa hora, como fazemos Porto-Coimbra. Mais coisas? Constantemente! Ainda agora o assalto ao Teatro de São João. Isto é todos os dias. Ou no turismo quando querem acabar com as direções regionais. Esses estúpidos, em vez de perceberem que é preciso cortar na administração central, que é a que gasta o dinheiro, querem cortar nos órgãos que têm o contacto direto com os cidadãos, que são as Direções Regionais de Turismo. Em vez de cortarem lá em cima querem cortar cá em baixo. Em vez de descentralizarem para reduzir os custos, não, querem centralizar para reduzir os custos. Isto é um erro completo, porque não só não reduzem os custos como impedem o desenvolvimento. E ao impedirem o desenvolvimento impedem a criação de riqueza e portanto a criação de massa tributável e portanto os próprios impostos para os sustentar.

[Fonte: Blogue Movimento Pró Partido do Norte]

Nota do RoP
Não deixa de ser elucidativo o facto de a Galiza dedicar mais atenção aos problemas do Norte que o próprio Norte. Os jornais do Norte, JN e Público, não parecem muito interessados em desenvolver e discutir as questões regionais. Por que será?