18 fevereiro, 2013

Limites da indecência



O Conselho Superior da Ordem dos Advogados instaurou-me um processo disciplinar com base numa participação de um advogado de Coimbra chamado Orlando Maçarico. Aparentemente nada de anormal nisso. Este é o sétimo ou oitavo processo disciplinar de que sou alvo desde que assumi o cargo de bastonário.

Esta é também a sétima ou a oitava vez, desde 2008, que esse advogado faz participações disciplinares contra mim. E, tal como esta, nenhuma das anteriores se referiu a factos que tenham a ver com o próprio participante, pois nunca sequer me referi a ele direta ou indiretamente. Todas as participações que ele fez contra mim relacionavam-se com outras pessoas. O que tem de espantoso (mais) este processo disciplinar é ter sido instaurado por eu ter criticado a ministra da Justiça num programa de televisão, chamando-lhe barata tonta. Os aliados da ministra dentro da Ordem dos Advogados são, de facto, incansáveis e, incentivados pelo aparente marasmo de uma classe que tudo parece disposta a suportar, julgam não haver quaisquer limites para a indecência. Vejamos.

O advogado delator começa por dizer que as minhas críticas à ministra revelam "pobreza de espírito". Depois, afirma que essas críticas permitem perscrutar o âmago da minha alma, onde só se vê - garante - "lodo e lama e orgulho jactancioso". Seguidamente afirma que eu sou um "reincidente na incivilidade" e que, com as minhas críticas, fiz o que não faria um qualquer "pífio e latrinário jornaleiro". Acusa-me ainda de ausência de "qualquer escrúpulo de decência e de elegância moral". Devo precisar, segundo o Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, o sentido das palavras "pífio" ("desprezível", "vil", "reles") e "latrinário" ("que se cria nas latrinas", "imundo", "repugnante", "sórdido"). Não sei se a palavra "jornaleiro" foi usada com o significado de "trabalhador a quem se paga o jornal" ou a quem se paga à jorna ou ainda como referência ambiguamente achincalhante ao facto de eu ter sido jornalista.

Seja como for, o advogado delator permitiu-se bolçar essas injúrias para - pasme-se - impedir que o (meu?) "egotismo", enquanto "sintoma ominoso das piores loucuras individuais", "conspurque, ainda mais, a advocacia e o que resta de advogados portugueses" (sic). Afirmou ainda que fez a delação porque as minhas críticas à ministra da Justiça e o local onde foram produzidas constituem "representação de um uso do poder fáctico de acesso a auditórios como instrumento de humilhação, mas também impressão digital de caráter". Curiosamente, nem o advogado delator nem o órgão que acolheu a infâmia da delação indicaram a norma do Estatuto da Ordem dos Advogados alegadamente violada com as minhas críticas.

Não me espanta que haja advogados que digam que o bastonário da OA é pior do que um "pífio e latrinário jornaleiro" e que afirmem que só veem "lodo e lama e orgulho jactancioso" na alma do presidente da OA. Também não me espanta que o escrevam em peças dirigidas ao supremo órgão jurisdicional da OA. O que espanta é que este órgão aceite essas injúrias sem a mais leve hesitação, como se de factos se tratassem e instaure procedimento disciplinar contra o injuriado.

Nunca participei criminal ou disciplinarmente, em nome próprio, contra qualquer advogado e manterei, mesmo agora, esse princípio, porque acredito que há um efeito regenerador e pedagógico no exercício da liberdade. Por isso, mesmo perante a dimensão da dupla infâmia de que sou alvo - a das ofensas do advogado delator e a da decisão dos inquisidores que as coonestaram -, limito-me a proclamar publicamente a superioridade moral e cívica da liberdade de expressão sobre as mentalidades enrugadas dos zelotas, dos bufos e dos delatores profissionais, bem como dos inquisidores morais e dos pina maniques do espírito, mesmo que uns e outros vistam a toga de advogado. Contra todos eles, contra todos os que odeiam a liberdade e quem a pratica, eu ergo esta serena e inabalável determinação de ser um homem livre e de continuar a sê-lo - como cidadão, como advogado e como bastonário da Ordem dos Advogados Portugueses.

Nota de RoP:

É impossível ficar indiferente a esta crónica. Se algum vestígio de honorabilidade houver nos advogados que se revêm no comportamento de Orlando Maçarico, o advogado que processou o bastonário Marinho Pinto, então, é porque alguém lhes transmitiu uma ideia errada do que isso realmente significa. Mas, sinceramente, eu inclino-me mais para a versão da cumplicidade entre padrinhos... 

2 comentários:

  1. Rui, pior que o Maçarico e como refere Marinho e Pinto, é a posição do Conselho Superior da Ordem. Não sei quem são os cavalheiros, mas cheira-me a interesses instalados que o Bastonário está a colocar em causa.

    Abraço

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  2. Ó senhor Bastonário, partícipe também desse senhor advogado que o injuriou.
    É mais um tonto a defender uma barata.
    Não é só a ministra! é todo o governo uns baratas tontos.
    Tanta gente zelosa num país em que os políticos como dizia Eça de Queiroz: São semelhantes a fraldas, possuem o mesmo conteúdo.

    O PORTO É GRANDE, VIVA O PORTO.

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