Estamos numa boa semana para atacar este tema dos famosos independentes que também admite que se incluam no mesmo "barco" os independentes famosos. Historicamente, esta saga dos independentes na política portuguesa (ou talvez melhor, na política à portuguesa) começou no dia em que um deputado de um determinado partido, prevendo que a sua inclusão nas listas para as eleições próximas estava em perigo, resolve tratar da sua vida noutra agremiação, aproveitando para lhe começar a fazer o jogo ainda durante o mandato que lhe tinha sido conferido na sua candidatura pelo partido que passa a renegar. Que é um termo mais suave que trair, embora seja de traição que se trata.
Dos famosos deputados independentes passamos aos famosos
independentes da política, que são aquelas "almas" que se desfiliaram de
um partido, ou que até nunca militaram em nenhum, mas estão sempre a
postos para se juntarem a um partido qualquer, tentando preencher a sua
quota de independentes. Reclamando sempre os direitos e esquecendo
frequentemente os deveres.
Num sistema político e eleitoral como o
português, o independente é uma figura aberrante que não faz qualquer
sentido. Numa candidatura às legislativas, um independente no meio de
uma lista de militantes filiados é um corpo estranho. Mesmo para aqueles
que julgam ver nessa excrescência uma mais-valia, ela normalmente só
dura até ao momento da eleição, desvanecendo-se de seguida. Abundam os
exemplos, de Vasco Pulido Valente a Manuela Moura Guedes ou Rosário
Carneiro. Ou, pior, transformando-se numa menos valia, se o independente
é um profissional e começa a preparar a sua próxima eleição, na mesma
categoria, mas por outra lista, logo no day after das eleições.
Já
nas autárquicas o caso muda um pouco de figura, invertendo- se um pouco
as situações. Numa candidatura autárquica independente já não é o
candidato que faz a figura aberrante, mas sim, não raro, os seus
apoiantes militantes de um qualquer partido que se juntam ao comboio
independente, sem terem a decência mínima de se desfiliarem primeiro.
Na
versão candidatos ou na versão apoiantes, o que os independentes gostam
de dizer é que pensam pela sua cabeça e que a verdadeira democracia tem
de garantir a todos liberdade de pensamento, opinião e expressão.
Contra
isto nada, o problema é que não é isto que está em jogo. Porque se
estivesse, não estaríamos a viver numa democracia. Quem quer intervir na
política e se filia num partido, como é normal no nosso sistema
pluripartidário, pode e deve continuar a pensar pela sua cabeça e a
expressar livremente a sua opinião. Mas a democracia sem regras passaria
a bandalheira no dia em que todas as opiniões dentro de um partido
tivessem igual peso e legitimidade, independentemente do seu sufrágio
maioritário ou minoritário.
Como sócio (mais do que adepto) do F.
C. Porto, nem sempre concordei com todas as decisões dos dirigentes ou
treinadores do meu clube. Sinto-me até à-vontade para exercer
publicamente o meu direito de crítica, ainda que em função da audiência,
pública ou privada, voluntariamente decida o tom e alcance dessas
críticas. Mas em caso algum, por maior e mais estrutural que possa ser a
minha discordância, admito dizer a mais pequena coisa, ou fazer o mais
pequeno gesto, em apoio de qualquer dos adversários do meu clube.
Aliás, se algum dia o fizer (o que só admito por doença...) fica aqui dito que espero que o meu clube me expulse de imediato.
É
por isso que se Rui Moreira se candidatar à Câmara do Porto e algum
militante de outro partido com candidato o apoiar e não for expulso no
mesmo dia, vou começar a temer que a nossa democracia pluripartidária
está a caminho da maior bandalheira. [do JN]