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Eixo do Mal um programa de contrastes e ambiguidade |
Já faz uns tempos que deixei de ver a televisão lisboeta. Abri poucas excepções que mais adiante explicitarei porquê. Dispensar a televisão sediada em Lisboa não é o mesmo que não ver televisão portuguesa. Em Lisboa cultivam-se as preferências locais para as imporem ao país real, mas nunca a portugalidade. Tomei esta decisão com a profunda convicção que não tenho nada a perder. Nada mesmo.
Nem mesmo a RTP, canal designado como público, merece a minha atenção por não lhe reconhecer o estatuto de nacional que a sigla sugere. Só escapa a RTP 2, um canal decente, mas que ao mesmo tempo serve de máscara para simular o pouco que resta de digno na RTP1 - o que é injusto para os que lá trabalham honestamente (na dois) -. Uma empresa promiscua, como é a RTP, pode sempre contagiar as outras (já presenciei na RTP2 uma metástase chamada Carlos Daniel), o que é mau sinal para os apreciadores do canal.
Resta-me o Porto Canal, que infelizmente não tem sabido aproveitar adequadamente o deserto de (boa) comunicação, culta e íntegra, em que ainda vive o país (repito: país não significa Lisboa). A gala do Dragão de Ouro de este ano foi talvez uma das causas de tanto abandono, porque apesar de ter melhorado, comparada com as anteriores, não justifica deixarem os espectadores tanto tempo sem programação, sem a mais pequena explicação (se calhar acham que não devem). O Porto Canal passou todo o verão a oferecer aos espectadores "comida" ultra requentada sem ter a gentileza de dar uma simples explicação. Imagino que a causa possa ter sido devida à ausência do Director Geral...Adiante.
Por conseguinte, tive de recorrer a um canal estrangeiro de que muito gosto e não faço publicidade, para não correr o risco de ver aumentado o preço da NOS... Vejam lá ao que chegamos: vermo-nos "empurrados" para outros países por falta de alternativas no nosso, (como emigrante à procura de emprego). Mas o país está bem, segundo alguns iluminados, muito bem mesmo...
O meu critério é este: não criar maus hábitos. Ou seja, ter força de vontade para abdicar do que não vale a pena ser visto. Simples, como vêem. No entanto, às vezes interessa ver o menos mau do que há nos canais de Lisboa. Como já aqui disse, acompanho com moderada frequência programas como o Eixo do Mal e a Quadratura do Círculo. Aí, podemos ouvir opiniões e ideias interessantes, o que não significa que concorde com todas elas, o que é natural. Mas, a maior virtude desses programas, consiste em detectar a coerência e incoerência de cada interveniente. Muito do que é ali dito, louvado ou criticado, serve também para o espectador descobrir os pontos fortes, e sobretudo os fracos dos participantes. Vale isto por dizer que não obstante a capacidade de argumentação e as preferências políticas de cada comentador, é possível avaliar melhor a coerência intelectual e política um a um, consoante as personagens e os temas abordados.
No último programa Eixo do Mal, um dos conteúdos abordava a suspensão da transferência do Infarmed para o Porto pela parte do Governo. Foi um tema excelente para mais uma vez percebermos quão preconceituosos e centralistas são os lisboetas, à excepção de Pedro Marques Lopes, que vive em Lisboa, mas é do Porto e conhece a sua realidade. Para os outros, falar-lhes do Porto, ouvir algo que possa significar uma mais valia, é o mesmo que retirar poder a Lisboa, até uma instituição mediana como é o Infarmed. Se estivesse no lugar de Rui Moreira preferia ter recusado gentilmente a "oferta" da Infarmed, porque era mais que expectável que a reacção dos funcionários fosse a que foi. Cordialmente, agradeceria e pediria ao 1º. ministro que reservasse a gentileza para projectos novos, feitos de raiz, para lá instalar portuenses sem problemas, evitando assim a comichão dos meninos da capital. Ofertas em 2ª. mão são como presentes envenenados (como se constatou).
Uma vez mais Clara Ferreira Alves não resistiu a ironizar com o assunto. Se prestarem atenção ao comportamento de Daniel Oliveira (um esquerda caviar) não foi muito diferente, ainda que tenha corroborado pontualmente da opinião de Marques Lopes. Clara Ferreira Alves terminou com este humor negro: "se quiserem até mandamos a Madona para o Porto".
Resumindo, pessoas que discutem sobre tudo e mais alguma coisa, incluindo política de teor internacional, com os quais concordo muitas vezes, sempre que se fala de descentralização (o que é muito raro e evitado) o desconforto é total, e a azia faz-se logo notar. Clara F. Alves chegou ao cúmulo de copiar a treta dos centralistas mais básicos afirmando que o Porto também era centralista, sendo inteligentemente interceptada por Marques Lopes, deixando a nu a sua ignorância total do que significa o centralismo, caindo assim no ridículo.
Fixem o que vou dizer: se o problema da Catalunha virar para o torto podem ter a certeza que o assunto vai servir de pretexto para malhar contra a regionalização. Vão falar de patriotismo, de coesão nacional, como se fossem os portugueses mais puritanos do mundo. Nesse preciso momento, vão-se esquecer totalmente dos 44 anos de centralismo que impuseram ao país, à boa maneira dos fascistas.
Eles ainda não perceberam que para serem democratas têm de ser menos hipócritas, e menos egocentricos.