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Justiça cega para pilha-galinhas e sedutora para ricos |
Tão descrente estou a despeito da vontade de regeneração da classe política, que tenho a impressão que se o Renovar o Porto encerrasse para férias, e daqui a 30 anos o voltasse a abrir, as incompetências que revelam os governantes e os escândalos em que se envolvem não seriam muito diferentes de hoje.
Os optimistas da praxe, que mais não são que colaboradores cúmplices desta forma aviltante de fazer política, detestam ouvir este tipo de linguagem e não é pelas melhores razões, é porque lucram de alguma maneira com a situação, ou tencionam vir dela a beneficiar um dia.
Não é possível acreditar seriamente em mudanças quando se entopem todos os caminhos para corrigir o que está mal. O pior dos cenários não pertence ao futuro, podemos vê-lo agora mesmo, claramente: os políticos não respeitam o povo, sabem que estão cada vez mais desacreditados e não se impressionam minimamente com isso. Aliás, a primeira disciplina que procuram seguir à letra e que devia estar mais ligada ao teatro, é a Representação. Eles esforçam-se por falar de forma convincente de modo a transmitir a quem os ouve uma grande determinação e uma férrea vontade de acabar com as asneirolas que os adversários políticos lhes deixaram de herança. No capítulo da simulação e da mentira, são de facto uns artistas. Depois, sabem que podem contar com a habitual ingenuidade dos eleitores, induzindo-lhes mentalmente pecados ridículos - como a importância de votar - para lhes refrearem os ímpetos abstencionistas e assim terem garantido, na pior das hipóteses, uma cadeira no parlamento.
O resultado destas rotinas não podia ser famoso, como é bom de ver . Maus governantes, geram cidadãos mal formados e com más práticas de cidadania. Só da integridade intelectual de cada um depende a imunidade a esta praga. Mas essa, como era de prever, vai rareando. Os assaltos continuam numa escala ascendente, os homicídios também. São casais desavindos a recorrer à violência extrema para "resolver" querelas, são os pais a liquidar [e violar] os filhos e os filhos a maltratar os pais, provando que o respeito pela vida humana anda arredio. Nas estradas conduz-se mal e desobedece-se às regras do trânsito, há insultos e pouca tolerância. Os pais, distraídos e nariz no ar, levam os filhos bébés em carrinhos para locais indesejáveis, para grandes superfícies, sem prestarem atenção, arriscando-se a magoar quem passa e as próprias crianças. As pessoas estão a perder o hábito de olhar e respeitar quem passa denunciando uma débil ideia de cidadania. Por experiência própria já tive de me impor em variados locais públicos devido à negligencia e à falta de profissionalismo [também já tive casos exemplares, diga-se] de quem devia zelar pelo interesse dos clientes e se esquece que está a ganhar a vida através deles. Enfim, não querendo infernizar o mundo, nota-se no ar um descontentamento geral. Será caso para nos admirarmos?
É perante este quadro de extrema vulnerabilidade e desequilíbrio social, que não sou capaz de compreender - excepto como um acto de supremo egoísmo e máxima estupidez -, como é possível que um casal de ex-namorados ande há 5 anos a perder tempo e dinheiro em tribunais por se recusarem [é irrelevante saber se são os dois ou apenas um] a dividir um prémio de 15 milhões de euros, sem ao menos se lembrarem das milhares de pessoas que hoje nem sequer emprego têm. O Supremo Tribunal de Justiça esteve muito mal. Não precisamente pela decisão, porque depois de tanta teimosia de parte a parte, só podia mandar repartir o prémio, mas sim pelo tempo que demorou a proferir a sentença e pelo dinheiro que fez gastar ao erário público com tão comezinho caso.
Pela Justiça se vê também o que é Portugal. Vamos lá colocar bandeirinhas nas janelas e apelar ao Órgulho [com o "o" aberto, lembrem-se] nacional.