Agora que o apuramento de Portugal para o Europeu de 2008 está conseguido, sinto-me à vontade para confessar que tenho sentimentos contraditórios quanto à realização no Dragão do jogo contra a Finlândia.
A dupla Madail-Scolari vem agora dar pancadinhas de amizade nas costas do público do Porto e restante Norte. Somos os melhores, fantásticos, nunca os desiludimos, bla, bla, bla. O público foi efectivamente super entusiástico e criou um ambiente caloroso, mas devemos nós, nortenhos, estar orgulhosos porque 50 mil pessoas se reuniram no Dragão para ver e apoiar um jogo da selecção nacional? Devemos considerar normal ver o presidente do FC Porto fazer o papel de solícito anfitrião? Aceito que Pinto da Costa tenha tomado a decisão mais sensata, mas ( aqui estão os sentimentos contraditórios) não gostei.
A adesão do público preocupou-me, não do mero ponto de vista futebolístico, mas porque representa a aceitação passiva pelo Norte ( que para o efeito considero do Mondego para cima) de todas as humilhacões sofridas às mão da dupla Madail-Scolari. Maus prenúncios para a regionalização no que diz respeito à região Norte, pois quem aceita humilhações no futebol, também aceita que continuar a ser colonizado pelo Terreiro do Paço é uma situação normal e aceitável. Eu sei o que os anti-Porto ( cidade e clube) alegam. "O problema é dos portistas que ficaram furiosos por o Scolari não ter convocado o Vitor Baía, mas o FC Porto não é o Norte e nós, que também somos nortenhos, não temos nada com isso". Raciocínio redutor que não leva em consideração que o caso do Vitor Baía é apenas um pequeno detalhe, e não o mais relevante.
Por razões desconhecidas, o técnico brasileiro mal tinha aterrado em Lisboa pela primeira vez, e já estava a tomar atitudes de hostilidade insultuosa a tudo o que dissesse respeito ao Norte, incluindo entre os seus alvos o clube de futebol do Porto que provavelmente já nessa época era o mais representativo de Portugal.
Mas enquanto o seleccionador hostiliza, com o silêncio cúmplice da Federação Portuguesa de Futebol, esta ignora, ostracisa e até humilha o Norte do País, e não é a realização do Campeonato Europeu de sub-21 que me fará mudar de opinião.
Lembremos os factos. No Euro 2004 o Norte apenas teve direito ao jogo inaugural. Todos os outros jogos de Portugal foram disputados em Lisboa. No apuramento para o Mundial 2006, dos seis jogos em Portugal, quatro foram no sul e dois no Norte (Aveiro e Porto) contra adversários sem interesse. E no Minho? Há quantos anos não há um jogo oficial em Braga ou Guimarães? E não esqueçamos que para o estágio final do Mundial, se fêz à pressa um centro de estágio em Évora. Nenhum dos centros que já existiam no Centro e Norte pareceu servir para o efeito. Mais uma vez fomos ostensivamente ignorados sem uma explicação. É indiscutível parecer haver a preocupação de isolar a selecção de futebol no Norte do País, e com este panorama só havia, em minha opinião, uma atitude possível: a selecção ignora-nos? Pois vamos ignorar a seleção. Mais uma vez aparecem os
mixed feelings. Não tenho nada que condenar quem foi ao Dragão, mas ...
E é por tudo isto que me sinto incomodado pelos elogios hipócritas do Sr. Scolari ao público do Dragão, e muito embora tenha ficado satisfeito com o apuramento de Portugal, lamento que o jogo tenha tido a moldura que teve, até porque isso não vai servir para que no futuro sejamos melhor tratados, pelo menos enquanto a dupla se mantiver em funções. Só se lembram de nós quando troveja. Em 1975 onde se refugiaram os jactos da Força Aérea, e para onde iria fugir o Governo se fosse proclamada a Comuna de Lisboa?