21 dezembro, 2013

Carlos Eduardo

Ainda é cedo para se poder traçar um perfil consistente das qualidades do médio do FCPorto, que tantas expectativas está a levantar aos adeptos portistas. Mas há coisas que não enganam, para lá das suas valências como jogador: a sua personalidade. Posso vir a arrepender-me do que hoje estou a dizer, porque as pessoas mudam bruscamente, mas é assim que penso neste momento. Carlos Eduardo reúne todas as características daquilo que deve ser um jogador à Porto. Tem qualidades técnicas, inteligência, humildade, garra e boa têmpera. Nem sempre é possível, porque não há muitas pessoas com este perfil, e ainda menos no mundo do futebol, mas deviam ser assim todos os jogadores do FCPorto.

Carlos Eduardo sempre aceitou, sem reclamar, o facto de não ter sido inscrito na Champions por opção do seu treinador, nem ser encaminhado muitas vezes para jogar na equipa B. Quando entrevistado, não personaliza demasiado a sua importância na produção da equipa optando preferencialmente pelo colectivo. Posso enganar-me, mas o FCPorto tem aqui um diamante já meio lapidado. Oxalá saiba aproveitá-lo e rentabilizá-lo, como costuma. Tem a batuta, o treinador.
CARLOS EDUARDO

19 dezembro, 2013

Jornalismo à Pingo Doce

Já todos sabemos que os jornalistas não gostam de ser criticados, que preferem que os leitores aceitem incondicionalmente tudo o que escrevem e decidem, como se fossem proprietários exclusivos do saber. Afinal, esta forma de estar na vida não difere por aí além da dos políticos e de outras profissões com algum peso social. Julgam-se insubstituíveis a tal ponto que nem se dignam admitir que alguém, que não os próprios, possa ver as coisas com mais objectividade que eles. É pena que assim seja, porque se descessem mais vezes à terra, em vez de levitarem na inocuidade das sua convicções e das entrevistas à la carte, talvez prestassem melhor serviço público do que imaginam.

Os anos que tenho de idade a ler e a conhecer jornalistas são demais para poder tolerar o marasmo em que a classe se deixou cair. A ideia com que ficamos  muitas vezes é que, mesmo quando se atrevem a usar da irreverencia junto de algumas figuras públicas poderosas, nunca tocam nos pontos mais incómodos de forma a deixá-las sem resposta. Parece que já ficam realizados com a glória de ter conseguido a entrevista. A proximidade com os poderosos inibe-lhes a coragem e fá-los imaginar estarem no mesmo patamar de importância, ainda que por instantes. A vaidade tem destas coisas...

Não tenho a menor dúvida do que atrás escrevi, porque se assim não fosse nunca mais veríamos na televisão figuras como o dono do Grupo Jerónimo Martins (do Pingo Doce) a dar pareceres políticos,como se fosse alguém com estatuto cívico e moral para o fazer. De todas as ocasiões que Alexandre Soares foi à televisão, não me lembro de nenhum jornalista lhe ter perguntado porque é que não pagava condignamente aos seus empregados para ajudar a economia a rolar, e porque é que sediou a empresa na Holanda e fugiu ao fisco escandalizando o país inteiro... Mas não. Só podemos deduzir que o exemplo deste "grande" empresário deve ser para louvar, caso contrário não se entenderia porque continuam a chamá-lo à televisão. O resultado é que cada vez o homem diz mais disparates, mas tal como num Big Brother ele aproveita para se achar importante. Mas, pior que ele, é o jornalismo de sarjeta que se continua a fazer em Portugal.  O jornalistas querem audiências não querem mudar o país.


17 dezembro, 2013

RTP 2 vai passar para o Porto. Irá mesmo? E em que condições?

A produção da RTP2 vai passar para o Porto, uma transferência que já está a acontecer, disse à Lusa fonte oficial da Rádio e Televisão de Portugal (RTP).

“Toda a produção da 2 vai passar para o Porto e outras produções de outros canais passam também para o Porto”, nomeadamente da RTP 1 e da RTP Internacional, afirmou a mesma fonte, adiantando que esta decisão da Administração liderada por Alberto da Ponte não traz encargos extra já que alguns serviços que eram contratados externamente passam a ser feitos dentro da estação pública.

Questionado sobre se a decisão implica a contratação de trabalhadores ou a ida de alguns de Lisboa para o Porto, a mesma fonte disse apenas que esta “significa a melhor utilização dos meios humanos e físicos que existem no Porto”.

Os serviços de produção da RTP2 vão começar a ser transferidos ainda durante o mês de Janeiro.
(do jornal Público)


Nota do RoP:
Notem bem as preocupações de quem está mal habituado. Em vez de se regozijarem com a notícia [que ainda nem sequer está garantida], os jornalistas querem é saber se o pessoal de Lisboa vai ser transferido para o Porto, em vez de procurarem saber quantos postos de trabalho serão abertos aos nortenhos, que como é sabido têm sido muito mais flagelados com o desemprego que qualquer outra região do país. Por outras palavras, o que eles querem dizer é o seguinte:  se querem descentralizar descentralizem, mas nunca à nossa custa.
Tenho a impressão que isto ainda vai dar muito que falar. Aguardemos...   

15 dezembro, 2013

Portocentrismo


 

Porto, Gaia e Matosinhos resolveram criar uma liga de cidadesquecendo o passado dividido, por vezes conflituoso. Procuram uma Frente Atlântica, que poderá mesmo dar origem a uma associação de municípios, para perseguir interesses comuns. Aquilo que, em abstrato, seria uma boa ideia tem todas as condições para se transformar num movimento divisionário típico do pior portocentrismo.

A forma mais benigna de olhar para esta nova liga é considerá-la um exercício exploratório de um objetivo de união mais amplo. Vale aqui recordar que Rui Moreira defendia há 10 anos a criação de uma única cidade, unindo o Porto, Gaia e Matosinhos, invocando a mais óbvia de todas as razões: não existe fronteira real entre as três. É bom de perceber que não é aceitável que três presidentes recém-eleitos coloquem sobre a mesa a fusão dos respetivos municípios, sobretudo quando tal não estava explícito nos seus manifestos eleitorais. Assim, iniciar um processo de aproximação mais técnico e menos político permitiria ir, paulatinamente, entranhando a ideia da cidade única. A verdade é que os três autarcas emprestaram à iniciativa um simbolismo político mais amplo do que um simples processo incremental de aproximação.

Abre-se, assim, espaço para uma leitura menos prosaica, que é a de que o Porto vira costas à região. A história recente da região Norte revela um espaço geográfico, administrativo e político muito dividido e muito desequilibrado, que entrou numa deriva de empobrecimento verdadeiramente vergonhosa. E, por muito que o Norte grite contra o centralismo de Lisboa, quase sempre com razão, a suposta liderança desta região tem também sérias responsabilidades nesta rota de insucesso. O Porto, sempre mais preocupado com o seu umbigo, não tem sabido nem querido liderar. Satisfaz-se com o exercício do controlo dos fundos do Programa Operacional Regional, capturando por completo as estruturas de decisão, esquecendo que, com isso, enfraquece toda uma região e, por maioria de razão, definha ele próprio.

A prova acabada desta visão curta é a declaração que os autarcas do Porto, de Gaia e de Matosinhos vão assinar contra "o reforço centralista" da RTP. É claro que o Centro de Produção da estação de televisão pública em Vila Nova de Gaia tem de ser preservado, e sobre isto sou insuspeito pois já o defendi neste mesmo espaço, mas o que estes três autarcas parecem ignorar é que esta é uma infraestrutura que serve e interessa a toda a região Norte. A lista de subscritores de tal documento teria de ser mais regional e menos portocêntrica.

Mas é ao nível da Área Metropolitana do Porto (AMP) que a nova Frente Atlântica causa mais engulho. A AMP foi recentemente redesenhada, num exercício cínico de lhe conferir uma massa crítica esmagadora face às restantes NUT3 do Norte. Foram assim considerados metropolitanos municípios como Arouca, Oliveira de Azeméis e Vale de Cambra, o que não deixa de ser surpreendente. A razão reside, naturalmente, na perspetiva de este ser um nível territorial supramunicipal privilegiado na atribuição de fundos europeus. Tal facto faria supor um aguçado apetite pelo controlo do Conselho Metropolitano. Surpresa das surpresas, assim não foi. Os municípios de maior peso mostraram-se muito desinteressados no processo, acabando por ser eleito presidente Hermínio Loureiro, um autarca muito competente que, todavia, representa um município de menor peso.

Percebe-se agora que havia já uma estratégia autónoma para a captação de fundos por parte de Porto, Gaia e Matosinhos, a qual será, quer queiramos, quer não, conflituosa com a estratégia que estava já a ser iniciada pelo Conselho Metropolitano do Porto. O facto de este órgão não ter tido conhecimento da nova liga de cidades é bem elucidativo.

O desconforto está instalado a todos os níveis. Na capital, o que me preocupa pouco, mas também na CCDRN, na AMP e em muitas das mais importantes cidades e municípios da região.

Não escondi o meu ceticismo quando, no seu discurso de tomada de posse, Rui Moreira se referiu a uma liga de cidades. Achei a ideia demasiado vaga para merecer uma referência explícita. Esperei. Confesso hoje que o meu ceticismo, ao invés de se diluir, se intensificou. Temo que possamos ter mais do mesmo.

Nota de RoP:

Sempre embirrei com esta mania, [ainda mal resolvida], de relacionar o protagonismo do Porto com o portocentrismo [versão "regionaleira" de centralismo que alguém, em má hora, se lembrou de inventar]. Em primeiro lugar, porque a responsabilidade  de descentralizar ou concentrar o poder, parte, antes de mais, de quem o detém, ou seja, do Governo central, e não das autarquias, cujas competências já de si limitadas pouco podem fazer e decidir a nível nacional contra a macrocefalia do poder do Terreiro do Paço. Em segundo lugar, porque por vezes se confunde o dinamismo próprio e histórico de cada cidade/região com a vontade intrínseca de nelas concentrar o poder, secando todas as outras. O Porto, tal como Braga [o autor do artigo é bracarense], tem a sua história ligada à do país, ainda mais importante que a da própria capital.

O autor tem razão quando refere que o Norte "tem empobrecido nos últimos anos o seu espaço geográfico, administrativo e político", mas mais por culpa do marasmo dos nortenhos em geral, do que por culpa exclusiva dos portuenses, porque de facto, ainda não foram capazes de se unir e afirmar como um contra-poder respeitável. Mas, não me parece oportuno, nem feliz, que no momento em que Rui Moreira consegue dar o primeiro passo no sentido de juntar as forças políticas do Grande Porto, coligando-se estrategicamente com as câmaras de Matosinhos e Vila Nova de Gaia, se veja nisto a intenção de virar as costas ao resto da região. Pelo contrário, pode ser o primeiro dos pequenos grandes passos que será preciso dar, com a inclusão das principais cidades nortenhas. Francamente, não creio que Rui Moreira tenha uma visão tão curta e mesquinha da descentralização.

Por isso me parece algo precipitada a conclusão de José Mendes, de mais a mais, quando a presidencia da CCDR-Norte não tem sabido bater o pé às decisões arbitrárias do governo central, como aconteceu recentemente, com o cancelamento abrupto de uma conferencia previamente marcada com o Governo no sentido de o informar sobre as necessidades e os destinos dos fundos europeus. O Dr. Emídio Gomes, limitou-se a calar e obedecer. O que me leva a concluir que este artigo foi redigido sob o efeito de alguma pressão, com os preconceitos regionalistas do costume, esses sim, divisionistas. 

Falar de portocentrismo depois de tantos entraves e marchas-atrás à Regionalização, é um contra-senso. O poder não está no Porto. O Porto é vítima do centralismo, tanto quanto Braga, o Norte e, sobretudo, o nordeste transmontano.