Recentemente, e a propósito dos défices das empresas de transporte, assistiu-se a um inusitado ataque ao Metro do Porto. Primeiro, foi Miguel Sousa Tavares que se pronunciou sobre o projecto, tecendo críticas muito severas à sua sustentabilidade. Depois, foi Luís Filipe Menezes quem apareceu, em entrevista a este jornal, a criticar as sucessivas opções da empresa. Prefiro concentrar-me naquilo que Miguel Sousa Tavares (MST) escreveu, porque conheço a sua seriedade intelectual e tenho a certeza de que se baseou em informações e análises que certamente julgava credíveis, mas que, como adiante demonstro, carecem de fundamento.
A primeira questão, na comparação do Metro do Porto (MP) com o Metropolitano de Lisboa (ML), diz respeito ao esforço financeiro do Estado, ou seja, ao que o Estado português gastou com cada um dos projectos, em diversas rubricas que incluem o PIDDAC, as Indemnizações Compensatórias, Outras Subvenções Públicas e Dotações de Capital. Verifica-se, através da soma das parcelas, que o Estado gastou, entre 1993 e 2010, cerca de 209 milhões de euros com o MP, e nada mais, nada menos, que 1252 milhões de euros com o ML. E, quando decompomos estas verbas, apuramos que os problemas de financiamento do MP decorrem do facto de o Estado nunca ter feito dotações de capital significativas, já que estas ascendem a 2,5 milhões de euros, enquanto no mesmo período recapitalizou o ML, que em 1993 já existia como se sabe, em 658 milhões de euros. Ou seja, e para quem não é especialista em contas, o Estado avançou com o projecto do MP sem o dotar de capitais próprios, o que justifica que as sucessivas administrações tenham sido forçadas a contrair financiamentos bancários, e o que explica o montante do endividamento e os juros acumulados.
Relativamente aos rácios de operação, verifica-se que as comparações são favoráveis ao MP, ainda que seja necessário ajustá-las às características diversas de ambos os sistemas. O MP tem uma rede com a extensão de 67 quilómetros, com 81 estações distribuídas por 6 linhas, enquanto o ML tem 39,6 quilómetros, com 52 estações distribuídas por 4 linhas, mas é claro que essa comparação não é linear, na medida em que o MP é maioritariamente de superfície, enquanto o ML é totalmente subterrâneo. No que diz respeito à procura, que tanto preocupa MST, o metro atingiu em 2009 uma taxa de ocupação de 18,7%, muito próxima da que se verificou no Metropolitano de Lisboa que, no mesmo ano, rondou os 19,4%. Estas taxas são, note-se, razoáveis, quando comparadas com as que se verificam em sistemas de transporte idênticos em outras cidades europeias.
Já quanto às receitas por passageiro por quilómetro, verifica-se que a comparação é muito favorável ao MP, atingindo 2,5 cêntimos contra 1,5 no ML. Isso explica, aliás, os resultados económicos do MP, cuja taxa e cobertura (que considera as receitas de bilheteira e os custos directos da operação) passou de 53%, em 2007, para 75%, em 2010, sendo expectável que esta taxa seja, em 2011, superior a 92%. Não se conhecem os resultados comparativos do ML.
É evidente que Portugal tem, a exemplo de outros países, um sério problema político e orçamental com a avaliação dos benefícios económicos e sociais que resultam do transporte público e que não se repercutem nos resultados financeiros das empresas que, muita das vezes, são avaliadas ou criticadas de acordo com a óptica privada que é mais restritiva. Ora, sendo desejável que os custos de operação sejam cobertos pela receita, não é expectável que, num serviço público desta natureza, o investimento em infra-estruturas seja recuperável. É essa a situação do nosso metro, que está próximo do equilíbrio na exploração, mas cuja sustentabilidade está posta em causa pelo facto de ter sido financiado exclusivamente através do crédito bancário que vai crescendo, ano após ano, através da acumulação dos juros. Ainda assim, a análise comparativa permite concluir que, apesar desse pecado original, o MP não é tão desastroso como contaram ao MST, e nos querem fazer crer.
[Fonte: JN]