Agora, mais a frio. Desculpem se me recuso a inverter a ordem da pirâmide hierárquica, mas tem de ser assim. Foi assim que me ensinaram, é assim que deve ser. Se o fizesse, estaria a ir contra as minhas convicções e a contribuir para adensar os nossos problemas, que já não são poucos. Sempre que se trata de avaliar uma organização, da mais sofisticada à mais simples, seja ela desportiva, empresarial ou política, a escala das responsabilidades mede-se na descendente.
Pode afirmar-se, sem risco de equívoco, que o FCPorto acumula em si mesmo essas três vertentes (desportiva, empresarial e política), e nem creio ser preciso explicar porquê. É talvez por essas razões conjuntas que escrevo mais do FCPorto do que seria natural, caso vivessemos num país eticamente justo e respeitador dos valores da democracia. Não vivemos. E é por saber que não vivemos num país desses, que considero inqualificável o comportamento de Pinto da Costa e do corpo directivo do FCPorto.
Podem-me dizer que não é a Pinto da Costa que compete resolver problemas do fôro político, mas isso é não compreender uma realidade indesmentível: na sociedade contemporânea quase tudo é político, pouco sobra da generosidade e do desprendimento. Não falo de política no sentido partidário, mas sim do modo como avaliámos a própria política e os efeitos daí decorrentes.
Pinto da Costa foi (foi) um competentíssimo dirigente desportivo que elevou o FCPorto ao mais alto nível do futebol mundial, com recursos desproporcionais aos êxitos conseguidos contra adversários nacionais e estrangeiros económica e politicamente mais favorecidos. Lutou internamente contra a macrocefalia da capital e a discriminação consequente. Essa, foi a faceta política de Pinto da Costa que devia ser da responsabilidade dos vários governos. Realizou negócios excelentes na compra e venda de jogadores e treinadores, com idênticos resultados no âmbito desportivo, provando habilidade na área empresarial do futebol.
Foi a trilogia Desporto/Empresa/Política, porventura dissimulada, mas eficaz, que fez dele o líder do futebol português mais temido e invejado pelos adversários e respeitados pelos portistas. Provam-no, as perseguições com julgamentos na praça pública de que foi alvo, tendo como objectivo acabar com a supremacia nacional do FCPorto.
O certo, é que, não obstante a absolvição no vergonhoso Processo Apito Dourado (para a Justiça Desportiva e Comunicação Social), os seus delatores continuaram (e continuam) a difamá-lo e a discriminar o clube como queriam, numa despudorada falta de respeito pelas decisões dos tribunais. Se foi por desgaste físico ou psicológico que Pinto da Costa mudou, não sei, o que posso dizer é que a vil estratégia resultou. Pinto da Costa claudicou. O silêncio, à mistura com o distanciamento dos adeptos, são a prova magnânima do que agora está a acontecer no escalão principal do futebol.
Na vulgar entrevista que deu ao Porto Canal, Pinto da Costa afirmou sentir-se em boas condições de saúde para se recandidatar à presidência, mas as alterações do seu comportamento apontam o contrário. Nada nos garante que ele esteja consciente dessa mudança, e o que é mais grave, poderá não ter a noção do mal que está a fazer a todos os portistas, que são a alma do FCPorto.
Afinal, o que se passou ontem no Dragão no jogo com o Arouca, não foi mais do que o reflexo de outro triste episódio da capitulação do dirigente portista.
Seria mais cómodo, menos comprometedor, estar aqui a falar da aselhice de José Angel, da atitude inenarrável de Maicon, ou da recontratação de Varela, mas isso seria virar ao contrário o pico da pirâmide hierárquica a que me referi no início. Era estar a lançar para cima dos jogadores e do(s) treinador(es) erros e competências de outros departamentos, que em primeira instância pertencem à área administrativa. É daí que nasce a fonte de toda a instabilidade ilustrada no rosto dos jogadores.
Ontem, pela enésima vez, os jogadores e treinador provaram o fel amargo do que é jogar num clube sem alma para se respeitar nem coragem para se defender das arbitrariedades e dos ladrões que enchameiam o futebol português.
Meus caros, esqueçam a garra, essa coisa de jogar à Porto, porque isso, para já, não existe. Veremos na próxima sexta-feira se estarei enganado e tudo não passa de pessimismo derrotista...
Off topic:
Gostei de ouvir Bernardino Barros, ontem na TVI24. Não se coibiu de usar, alto e bom som, o verbo roubar, quando se referia ao lance de golo anulado ao FCPorto pelo fiscal de linha. De tal modo, que o ex-árbitro Pedro Henriques se tomou das dores da classe, mostrando-se muito ofendido pelo uso da expressão, mas teve de engolir em seco. Não deixou de mandar um recado ao silêncio do FCPorto, o que se aplaude, tendo em conta o medo que se instalou nas hostes portistas.
O curioso (ou, nem por isso), é que Bernardino está mais à vontade na TVI que no Porto Canal. Por que será?