07 setembro, 2012

RTP, mas onde está o serviço público?

Como diria o meu saudoso amigo e colaborador de blogue, Rui Farinas*, quando a conversa inclinava demais para a lamuria, bradava com humor, naquela voz metálica que o catacterizava: "já estou a ficar deprimido!". Por mais que tentássemos evitar, lá estávamos nós outra vez  a voltar ao mesmo, falando embora de vários assuntos. 

A incompetência, a irresponsabilidade [e mesmo a desonestidade]  dos nossos governantes ocupavam como lapas praticamente todos os temas abordados. O problema não era de Rui Farinas - que até tinha um sentido da vida muito pragmático e não era nada dado a lamechices -, nem era nosso [meu, e do Vila Pouca], era o país onde nascemos. O país? Nós? Todos? Da mesma maneira? Com igual  responsabilidade? Ou, mais de alguns, que de muitos outros?

Falemos sério. É claro que não são os cidadãos que vão para o executivo, são os que eles elegem para  desempenhar tais funções. Aniquilemos de vez essa conversa de que a "culpa é de todos", porque repetí-lo, é perpetuar uma mentira que não é nossa, e que só serve para desculpabilizar os governantes e seus compadres das asneiras que vão fazendo. É importante não esquecermos isto. É que se tivéssemos plena consciência do nosso grau de responsabilidade no destino do país, talvez hoje fossem outros a pagar a crise...

A facilidade com que os portugueses pegam num falso assunto e o propagam,  é impressionante. Os portuenses em particular, e mais genericamente os próprios nortenhos, sabem por experiência própria que a RTP nunca foi verdadeiramente uma televisão de serviço público. Durante muitos anos a RTP dispôs de dois canais abertos [a RTP1 e a RTP2] e nos últimos tempos mais 4 canais por cabo [RTP Internacional, RTP África, RTP Informação e RTP Memória]. Apesar disso, nunca dedicou um canal às Regiões e ao Norte, como está agora, por exemplo, o Porto Canal a fazer [e muito bem]. 

No campo desportivo, mais propriamente no futebol, a RTP geminou-se e até superou em centralismo e facciosismo, as 2 estações privadas [SIC e TVI], desprezando levianamente o papel de televisão subsidiada pelos contribuintes. Inclusive, usa o canal 2 para passar desporto, privilegiando sem pudor as modalidades onde o Benfica está presente [futsal] e ignorando aquelas onde o FCPorto tem brilhado [o basquete, o hóquei e o andebol], alterando as transmissões consoante o êxito ou o insucesso das respectivas modalidades do clube de Lisboa. Daqui  poder-se inferir sem sombra de dúvidas que nem mesmo a RTP 2, o mais estatal dos canais da televisão do Estado, presta serviço público com a isenção e o rigor a que devia estar obrigada [vêm, como não é a nós que compete ordenar o cumprimento das obrigações dos órgãos do Estado?].

Resumindo: não é o facto de a RTP ter o privilégio de viver sob a tutela do Estado que lhe confere o estatuto de servidora de conteúdos de interesse público, mas a noção rigorosa do que isso é, e representa. Além de que concorre de forma desigual com as estações privadas, sem no entanto as superar em probidade e  isenção. Para se destacar destas e hoje merecer a solidariedade de todos os portugueses, teria de gozar de boa reputação, de um cadastro acima de qualquer suspeita.  E não goza. Pela minha parte, sou totalmente contra o tipo de serviço que me tem prestado, e até agradecia que alguns dos seus dirigentes e funcionários fossem irradicados, porque são maus profissionais, são desonestos e geradores de conflitos.

Mas desenganem-se aqueles que pensam que a privatização da RTP vai torná-la melhor e menos onerosa. Ainda a privatização não foi consumada e a desonestidade mantém-se: o Governo tenciona(va) transferir para a empresa privada que eventualmente ficar com ela as taxas de audio-visual que nós pagávamos pelo serviço público, o que além de ser um abuso, não prenuncia nada de bom em termos de ética e de seriedade. Por aqui, podemos imaginar o que o futuro nos reserva.       

* Fez no passado dia 6 dois mêses que nos deixou.

100 milhões a todo o gás



Há países que vendem petróleo, automóveis, software, telemóveis e outras coisas em que fazem a diferença na economia global. Portugal a esse nível, verdadeiramente, só tem três coisas: o vinho do Porto, a cortiça e a valorização dos jogadores de futebol. A venda de Hulk e Witsel por 100 milhões de euros é um dessas coisas: o momento mais importante do mercado mundial de futebol deste ano. É pura arte de prospetar e valorizar os jogadores através da capacidade de chegar aos grandes palcos. Mas mais: é ser-se capaz de definir condições de venda a um nível de exigência mundial e fechar os negócios no timing certo.

Como é isto possível? Porque Pinto da Costa sabe muito de futebol e Luís Filipe Vieira aprende depressa. Porque o empresário Jorge Mendes suscitou uma escola de compra e venda de jogadores que tem sido seguida à risca por muitos colegas de profissão. E porque o conjunto de todos estes elementos permitiu projetar jogadores e figuras nacionais para o mais alto estrelato mundial. Desde logo Cristiano Ronaldo, criado numa das mais extraordinárias escolas de jogadores da Europa (a do Sporting). Depois, José Mourinho, cujo sucesso no F. C. Porto lhe deu visibilidade e credenciais para ascender a um plano estratosférico. E finalmente André Villas-Boas, cujos 15 milhões pagos pelo Chelsea ao F. C. Porto continuam a ser recorde mundial por um treinador.

Voltando a Hulk e Witsel: 100 milhões é muito dinheiro? Depende. Vejamos em pormenor o que é a Gazprom, a patrocinadora do Zenit de São Petersburgo. Para começar: trata-se da empresa mais rentável do Mundo - 44 mil milhões de dólares de lucros, apesar de ser apenas a 15.ª maior companhia do Globo. As vendas em 2011 somaram 157 mil milhões de dólares. A Apple, maior empresa do Mundo em valor bolsista, lucra "apenas" 25 mil milhões de dólares, ou seja, pouco mais de metade da Gazprom.

Para se perceber a escala a que atua o patrocinador do Zenit basta dizer que, nas 15 maiores empresas do Mundo, nove são do sector dos petróleos e gás natural. (A maior do Mundo é a Shell, logo seguida da Exxon-Mobil.) Quanto mais caros estão os combustíveis, mais elas ganham. A empresa russa é detida em 50,02% pelo Estado - Putin é apenas o mais moderno ditador democrático protegido pelo petróleo e gás. Acrescente-se, aliás, que o conjunto das empresas russas a explorarem combustíveis fósseis tornaram aquele país no maior exportador de combustíveis mundial, à frente da Arábia Saudita.

Uma questão então - faz sentido gastar-se tanto dinheiro em jogadores de futebol? A cartada de notoriedade é a Liga dos Campeões. É puro marketing. É a afirmação dos russos nos mercados europeus para onde a Gazprom exportou 150 mil milhões de metros cúbicos de gás natural em 2011 através de pipelines diretos da Rússia ao coração da Alemanha, Reino Unido e Turquia, já para não falarmos dos países vizinhos (desde logo a Ucrânia) e todas as ex-repúblicas soviéticas no Leste da Europa. A Gazprom aquece (literalmente) a Europa do Norte durante o Inverno.

Voltemos aos números: não há nenhuma empresa portuguesa entre as 500 maiores do Globo. Mas os clubes portugueses e a seleção nacional conseguem fazer parte dos cinco países mais importantes da Europa neste negócio. E só chegaram ao atual patamar porque existiu o Euro 2004 e os novos estádios do Dragão, Luz, Alvalade, Braga, entre outros. O nível de receitas e qualidade dos espectáculos (mesmo em termos televisivos) explodiu. Nem todos os clubes aproveitaram a oportunidade, é certo, mas uma coisa é factual: desde 2004 os clubes portugueses venderam, entre outros, Mourinho, Coentrão, Pepe, Falcao, Anderson, Nani, David Luiz, Di Maria, Ricardo Carvalho, André Villas-Boas, etc., e agora Hulk e Witsel e Javi García. Só estes 13 somaram perto de 380 milhões de euros em transferências, correspondentes a margens de lucro quase sempre acima dos 70% entre o valor de chegada e o valor de saída. Quem continua a falar dos custos do Euro 2004 tem de reconhecer pelo menos uma coisa: o investimento do Estado neste sector económico está mais que pago. Quando se estudarem os 10 anos pós-Euro 2004 ver-se-á que, afinal, o futebol deu lucro ao Estado.

06 setembro, 2012

Degradação bateu no fundo

Fernando Gomes: uma "coisa" que se faz pelo outro lado?
O futebol até pode alienar, até pode não ser a coisa mais importante da vida, mas a verdade é que continua a ser o desporto mais popular do mundo e, ao contrário do que se pensa, pode ajudar a desmascarar muita malandrice. Estou mesmo convicto que se houvesse mais atenção ao que se tem  passado no mundo do futebol, talvez hoje não tivéssemos governantes tão básicos. Isto, considerando que as campanhas eleitorais não passam de banha da cobra, e que os mecanismos usados para a escôlha das lideranças partidárias estão longe de corresponder à vontade dos eleitores.

O paradigma que trago hoje à liça, e que anteriormente reproduzi, é simplesmente aviltante! Para quem acompanha estas coisas, não é surpresa, já aconteceu mais vezes. Mas para quem se limita a ouvir a televisão [A RTP é das piores], fica sempre mal informada, porque quando se trata do Benfica a história dos factos é sempre mal contada. 

Na questão em apreço, a FPFutebol cozinhou o caso com uma hipocrisia cirúrgica, maquiavélica e até provocatória, aproveitando a paragem do campeonato de modo a não prejudicar o Benfica, ou seja, contabilizando os 15 dias de "castigo" a Jorge Jesus durante um período em que a sua presença não pode causar qualquer dano ao clube! Em resumo, não houve castigo. E só falta saber se Jorge Jesus também vai pagar os irrisórios 1500 euros de multa! Isto, já para não falar da gravidade das suas declarações em contraste com outras produzidas por treinadores do FCPorto, incomparavelmente menos gravosas,  que foram rapidamente castigados e assim impedidos de acompanhar a sua equipa.

As eleições para a Federação Portuguesa de Futebol decorreram em Dezembro do ano passado, e o eleito para presidente foi, como é sabido, Fernando Gomes, ex-dirigente do FCPorto que, apesar disso, não foi apoiado pelo FCPorto [como é público, Pinto da Costa descartou-se de envolver o FCP neste processo]. Tão pouco tempo passado já se notam sinais preocupantes de arbitrariedade, quer nas nomeações de árbitros, quer nas decisões do Conselho de Arbitragem e de Disciplina, cujo modelo de eleição gerou aliás muita confusão. A questão que se sugere  levantar é a esta:  Pinto da Costa já não confiava em Fernando Gomes para não o apoiar? Se sim, por quê?

O certo, é que ainda mal começou o campeonato, e já se fazem sentir flagrantes critérios de favoritismo ao Benfica que, se entretanto nada fôr feito para bloquear estes procedimentos, pode um dia destes redundar em cenas de violência. E não venham depois esses palhaços, vestidos de cargos para os quais não têm categoria, nem saber, carpir mágoas, porque um dia a ira dos portuenses pode-lhes cair em cima do próprio pêlo. Fechar os olhos ao que se está a passar, é assinar de cruz um atestado de irresponsabilidade que só pode ter uma só interpretação: Portugal está nas mãos de facínoras! E não venham depois dizer que a culpa é do futebol. Não! A culpa é dos governantes, das autoridades públicas, que em vez de se colocarem no seu lugar, de se distanciarem deste tipo de eventos para os poderem regular com isenção, andam a ganhar avenças para falar de futebol.  

Ah, e se algum desses cretinos me estiver a ler, deixo-lhe aqui um recado: nas próximas campanhas eleitorais informe se faz favor por que clube vai torcer e já agora, em que programa desportivo tenciona resolver os problemas do país...

Nota do autor de humor sério:

SE eu fosse primeiro ministro, antes de constituir governo, reunia os putativos candidatos e dizia-lhes:

Meus amigos, podem achar estranho, mas eu tenciono mesmo governar o país. Por isso, aqueles que nomearei para comigo formarem governo terão de aceitar as condições que propuser. Em primeiro lugar, terão de dedicar 90% do vosso tempo ao país, e o resto, à família.  Ora o país, como sabeis, não é mais do que o povo, o que significa que se o nosso trabalho não privilegiar a qualidade de vida desse povo, o nosso objectivo terá falhado. E eu não quero que falhe. 

Posto isto, faço-vos este ultimato:  
  • Ou optam pela política, ou saem dela. Não quero acumulações com cargos privados, sejam de que natureza forem. Quem não concordar, levanta a mão e sai. Já!
  • A vossa participação em debates políticos e programas desportivos está-vos totalmente vedada. Regularmente programarei um espaço nos media de informação  e esclarecimento públicos sobre o andamentos dos trabalhos. O laxismo, e a falta de rigor com as metas traçadas serão motivos para vos exonerar do cargo.  Quem não concordar, levanta a mão e sai. Já!
Muito provavelmente, a sala ficaria vazia, mas eu seguia a minha vida de consciência tranquila e sem problemas na dorsal...

 

Jogo de março com o F. C. Porto vale 15 dias de castigo a Jorge Jesus


Jorge Jesus foi "castigado" com 15 dias de suspensão e uma multa de 1500 euros. Em causa declarações do treinador do Benfica proferidas após o jogo com o F. C. Porto, em março.


Artigo salva Jesus de falhar jogo com o FC Porto
Um comunicado da Liga de Clubes refere ainda que o técnico foi multado em 1500 euros pela Secção Profissional do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol (FPF), na sua reunião plenária de 4 de setembro.

A deliberação agora anunciada não vai ter efeitos práticos, uma vez que a Liga está parada devido aos compromissos das seleções e o próximo compromisso do Benfica é na quarta jornada da I Liga, agendada para 23 de setembro.

Jorge Jesus foi castigado por "afirmações proferidas" no final do encontro Benfica-FC Porto de 02 de março de 2012 (2-3), a contar para a 21.ª jornada da Liga portuguesa de futebol e divulgadas nos jornais A Bola, Record e Correio da Manhã nos dias sequentes.

A participação que deu origem ao processo disciplinar e ao castigo a Jorge Jesus foi apresentada pelo árbitro assistente Ricardo Santos.

O treinador do Benfica insurgiu-se na altura contra a validação do golo de Maicon, aos 87 minutos, que fixou o resultado e garantiu a vitória dos "dragões", acusando o árbitro assistente de não ter assinalada a posição irregular do brasileiro, apesar de alegadamente ter visto que o defesa portista estava em situação de fora-de-jogo.

05 setembro, 2012

O nosso orgulho...

 

 

Mas que orgulho! Isto é que é um país! Heróis do mar, pobre povo nação cadente, iiiimor....al! Mas temos o Ronaldo, aquele exemplo de jogador. Temos Cavaco, Sócrates, Passos Coelho, Portas, submarinos, BPN's, RTP's...


04 setembro, 2012

Renovar a Democracia

Como seria este Homem hoje?
Quando criei este blogue tinha como primeiro objectivo dedicá-lo à cidade onde nasci e que amo como nenhuma outra, salvaguardando no entanto algum espaço para falar dos mais diferentes assuntos. Quase simultaneamente, concebi outro blogue [As Casas do Porto], este inspirado especificamente numa temática que muito me preocupa, que é a degradação urbana de toda a cidade - e não apenas do centro histórico - que, para mal dos portuenses ainda se mantém actual.

Por razões que para o caso não interessam, não pude [com muita pena minha] continuar o trabalho que levei a cabo cerca de 3 anos, prestando gratuitamente e sem falsas modéstias, melhor serviço público do que muitos jornais e que a própria televisão, dita como pública, presta. 

Entretanto, o decorrer do tempo, mais o registo dos acontecimentos, fez-me consolidar convicções simples, mas antigas, que se traduzem nisto: fazer bem, ou mal, tudo depende da competência e seriedade de quem o faz.

Quando falámos de saúde, de urbanismo, de educação, de futebol, de prosperidade, da ética, do ambiente, ou simplesmente da qualidade de vida, tratando-se embora de coisas distintas, estamos resumidamente a falar de política. E  falando de política, temos fatalmente que falar de democracia. Por mais voltas que dêmos, acabámos sempre por regressar ao mesmo ponto de partida: democracia. É difícil, senão impossível, melhorar tudo o resto se não aperfeiçoarmos os processos de  a exercer. E neste capítulo não podemos dizer que estamos a ter grande ajuda da comunicação social, que não sabe, ou não quer pôr em causa a previsível falência deste regime. Comodamente, os media usam essa grande figura do século XIX, e inícios do século XX, que foi Winston Churchill, para perpetuar uma sua bela frase ["a Democracia é o pior dos regimes, exceptuando todos os outros"], como se ela albergasse uma única interpretação possível.   Apesar de conservador, não creio que Churchill quisesse dizer que a democracia do seu tempo não podia evoluir um século depois, mas é essa avaliação abusiva que alguns fazem dela. 

Como cidadão e eleitor, atingi há muito o meu ponto máximo de tolerância. Recuso-me terminantemente a votar só porque sim, ou porque um badameco qualquer mo recomenda [só de ver Marques Mendes gesticular me dá vómitos]. Para mim, é condição sine qua non blindar o meu voto da usura política. O voto, em termos democráticos, é o instrumento mais precioso que disponho para exercer o meu direito de escôlha, talvez o único, o mais importante. Mas, é curto. E uma vez que só posso eleger mas já não  posso exonerar, então reservo-me ao direito de aguardar por mais garantias para conferir mais maturidade ao meu voto. Não quero mais votar às cegas [já não o faço há anos, diga-se]. E se até lá essas garantias não chegarem, então também o meu voto não vai para ninguém.  Isto, em termos absolutos, vale o que vale. Sim, porque infelizmente muitos dos meus conterrâneos vão-se encarregar de contrariar a minha resiliência, e vão continuar a votar... Porque sim. Apesar de se andarem a queixar pelos cantos, a chorar o fado, em estúpida homenagem a um património de misérias.

Talvez esteja aí a explicação de me ter passado pela mente a ideia de rebaptizar este blogue para "Renovar a Democracia". É que o Porto coitado, esse, já não é o que era. Vive de géneses antigas, mas não as assume. E o seu povo, fruto de um cosmopolitismo traiçoeiro, que lhe roubou muito da alma, também não. Apesar do FCPorto...