13 abril, 2012

Crónica de leitura obrigatória


A ditadura chegou ao campo

 
Sei que é difícil atrair a atenção dos leitores para um assunto como este: "sementes". Mas das sementes e da liberdade de as plantar depende uma boa parte do nosso futuro porque 75% da biodiversidade agrícola foi extinta no século XX e as coisas não vão ficar por aqui. O esmagador poder financeiro da indústria química quer multiplicar leis, por todo o Mundo, para impedir os agricultores de serem livres de usar as sementes não certificadas nas colheitas seguintes. A espiral é terrível: quanto menor produção agrícola com sementes ancestrais, pior comeremos.

Num filme notável chamado "Food Inc." (Comida, Lda.) os autores mostram, por exemplo, como a multinacional Monsanto consegue perseguir e levar à falência vários produtores rurais. O argumento é simples: se no campo deste agricultor houver plantas cultivadas com sementes Monsanto e ele não for cliente da empresa, é processado por estar a usar sementes patenteadas, mesmo que elas tenham sido propagadas pelo vento e estejam misturadas com as suas. A natureza passou a ter 'dono'.

A Monsanto é a mais importante empresa mundial produtora de transgénicos. Atrai os agricultores através de um marketing aliciador de melhores colheitas. Mas os alimentos obtidos a partir de sementes alteradas laboratorialmente, cujo ADN não é compreendido pelos organismos humano ou animal, arrastam interrogações que não compreendemos antecipadamente. Foi assim que se alimentaram herbívoros com rações à base de carne e se rompeu uma lei da natureza. Esta experiência foi um dos motivos apontados para o surto da doença das vacas loucas.

As culturas transgénicas estão já na mesa de pessoas de todo o Mundo. Surgem em coisas tão importantes como a alimentação dos bovinos (por exemplo, na carne importada do Brasil ou da Argentina), na soja, arroz, milho ou em algo tão simples como o mel produzido por abelhas próximas de campos transgénicos. Um relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) dizia recentemente que a maioria dos alimentos consumidos no mundo ocidental provém apenas de 12 espécies de plantas e cinco espécies de animais, apesar de terem sido catalogadas milhares de espécies comestíveis. Pior: arroz, trigo e milho constituem 60 por cento da alimentação humana, sendo estes, na sua esmagadora maioria, provenientes de sementes tão apuradas que o nosso corpo já não 'lê' estes alimentos como "arroz", "trigo" ou "milho". Obviamente nem vale a pena falar da 'fast-food' ou da comida industrial.

Cristina Sales, uma médica que o Porto tem a sorte de ter por perto, escreve há vários anos sobre o caos da alimentação moderna e percorre o Mundo como oradora em conferências com este tema. E o que diz? "O nosso corpo tem um histórico de milhões de anos na absorção dos alimentos e está cada vez mais incapaz de reconhecer o que come. Não tem as enzimas necessárias à sua digestão e metabolismo. Por isso gera uma reação inflamatória contra os alimentos porque os considera 'elementos estranhos', como se fossem tóxicos. Essa é uma das razões porque tanta gente aumenta de peso ou de volume: porque retém líquidos nesse processo inflamatório. E isso afeta todas as pessoas, incluindo as magras".

Jude Fanton, da organização "Seed saver (Salvar as Sementes)" disse há meses ao programa Biosfera, da RTP2 (com o qual trabalho) uma coisa simples: "Se nos recordarmos do sabor da comida dos nossos avós - as maçãs, os vegetais, etc. - eles tinham um sabor verdadeiramente forte e intenso. Isso significa mais nutrição. Essa é talvez a razão pela qual estamos a engordar. Temos de comer cada vez mais para conseguir os nutrientes de que precisamos".

A ditadura agrícola e alimentar é este louco processo de quebrar as regras da natureza em busca de mais rentabilidade. Se fecharmos os olhos à origem dos alimentos, contribuímos gradualmente para uma vida cada vez mais tóxica. Essa perda de 'liberdade de escolha' e 'biodiversidade essencial' afeta o ADN humano que não deveríamos alienar numa só geração. Além disso, replica o modelo económico que supostamente queremos combater: os lucros ficam com as grandes multinacionais e as doenças em cada um de nós.
[do JN]

12 abril, 2012

Tudo gente séria...

Não é por nada, mas gostava de adivinhar o ritmo cardíaco do Presidente da República depois de confrontado com as notícias, ou com os artigos de opinião - baseados em factos -, como os enunciados na crónica aqui abaixo do Jorge Fiel.  Falei do ritmo cardíaco, e não como seria mais indicado, da consciência, porque, ao contrário do coração, a consciência é mais difícil de sondar, sobretudo em pessoas com o perfil altivo e  a cara de pau de Cavaco Silva.

Se estivesse no lugar do Presidente, eu que algumas vezes peco por me levar demasiado sério e por gostar de pagar as minhas contas, já teria feito um pedido de explicações aos responsáveis por estas notícias, caso fossem falsas, ou, a serem verdade, como tudo aponta que sejam,  ter-me-ia já demitido. O drama é que eu sou apenas o cidadão Rui Valente, praticamente um desconhecido, e ainda por cima honesto, tanto quanto é possível sê-lo numa sociedade com uma ancestral tradição desonesta como a nossa, enquanto pessoas como o PR investem tudo no estatuto, incluindo a própria honestidade.

Penso não me enganar se disser que a política é a melhor escola para se aprender a controlar as emoções e transmitir uma imagem de integridade e competência nem sempre condizente com o perfil dos alunos. Talvez por isso a política seduza mais os visceralmente oportunistas que os bem intencionados. Pelo menos é assim que vem acontecendo. Não viria mal ao mundo se a espaços pousassem na política estes paraquedistas, se o regime em que vivemos fosse uma democracia a sério, mas até ela sucumbiu à génese trapaceira dos portugueses. Percebe-se assim por que é que os políticos se sentem tão confortáveis neste esboço de democracia, e por que é que consideram as eleições livres [até ver...] a única ferramenta prestável para provar ao mundo que Portugal tem um regime democrático, e porque não estão interessados em criar outras...

Outro [mau] exemplo: numa Democracia [escrevi com maiúscula de propósito] a valer, seria impossível que Mário Lino não tivesse já sido julgado e punido por ter interferido activamente enquanto Ministro das Obras Públicas nos negócios de uma entidade pública como a REFER e tentado influenciar [e desautorizar] o responsável por essa empresa para beneficiar uma outra privada [a O2 de Manuel Godinho]. Mas o que vai acontecer [podem escrever o que digo] é que Mário Lino vai ter apenas o "incómodo" de algumas deslocações ao tribunal - para simular o funcionamento da Justiça -, para passados uns penosos mêses [ou anos], sair imaculado...

«A gaja é que o está a segurar», dizia o sucateiro ao cúmplice da REFER, referindo-se a Ana Paula Vitorino, ex-secretária de Estado dos Transportes, que foi resistindo às pressões do Ministro Jamais e mantendo no cargo o Presidente da REFER...

Meus senhores, será preciso um desenho para concluirmos quão rasteira e marginal é a nossa classe política? Eu respondo: é! Sabem por quê? Porque a comunicação social não sendo burra, às vezes gosta de passar por burra ou - o que é mais intolerável -, de fazer de nós burros. Mas a resposta não é essa. A resposta é: pousada a poeira do caso Face Oculta, vamos todos ver de novo o ex-Ministro Mário Lino a opinar sobre a seriedade de outros como ele, mas de partidos diferentes, e o murcão do povo a ouvir.

O BPN dava um filme indiano


Não imaginam  quanto  lamento não  ter o tempo  nem  o  talento  para digerir  os 70 volumes e  700 apensos  do caso  BPN  e escrever   um  thriller  baseado  nos factos reais  da   maior   fraude    portuguesa  do século.   A  realidade   supera  sempre   a ficção.  Duvido que  John  Grisham  fosse capaz de imaginar a cena do juiz presidente do coletivo ter de fazer uma coleta para comprar no IKEA uma estante para arrumar o processo - que lhe foi negada pela DG da Justiça.


A galeria de personagens é estupenda. Ken Follet teria de nascer duas vezes para conseguir inventar um naipe tão rico, denso e variado. No protagonista, Oliveira e Costa, que por alguma razão era conhecido na sua terra (Esgueira) como Zeca Diabo, e que munido de um cartão laranja subiu na vida ao ponto de chegar a secretário de Estado.

Saído do Governo de Cavaco, na sequência de um perdão fiscal mais que suspeito a empresas de Aveiro (Cerâmica Campos, Caves Aliança), foi recompensado pelo seu amigo com uma vice-presidência do BEI, apesar de ter um inglês ainda mais rudimentar que o de Zezé Camarinha.

Amigo do seu amigo, Costa comprou, em 2001, um lote de ações da SLN (dona do BPN), a 2,4 euros cada, que revendeu com prejuízo (a um euro/ação) ao amigo algarvio (o Aníbal, não o Zezé) e à filha dele. Menos de dois anos depois, Cavaco e Patrícia venderam as ações com um lucro de 140% - ele ganhou 147 mil euros, ela 209 mil. Nada mau.

Quando o naufrágio foi evidente, Zeca Diabo teve a dignidade de ir ao fundo com o barco, aceitou fazer de único responsável pelas patifarias. Em recompensa pela imolação, foi libertado devido "ao seu estado de saúde e por se encontrar em carência económica".

O elenco de atores secundários também é muito atraente e diversificado. Por exemplo, Manel Joaquim (Dias Loureiro), o filho de comerciantes de Linhares da Beira que chegou a ministro, conselheiro de Estado e administrador-executivo do BPN, carreira em que fez fortuna ao ponto de poder comprar, por 2,5 milhões de euros, à viúva de Jorge Mello, uma mansão no Monte Estoril.

Temos também Vítor Constâncio que, apesar de usar óculos e ser o governador do Banco de Portugal, foi o último a ver a falcatrua, anos depois da Deloitte, Exame e Jornal de Negócios terem alertado para o assunto.

E ainda Scolari, que recebia 800 mil euros/ano, Figo (apenas 400 mil/ano) e Vale e Azevedo, que sacou dois milhões (passaram-lhe o cheque antes de verificarem as garantias), e tantas outras figuras do nosso Gotha que lucraram com um banco que tinha balcões em gasolineiras e ativos tão extravagantes como 80 Mirós e uma coleção de arte egípcia.

O enredo é fabuloso. Dava um filme indiano. Só espero que, na venda ao BIC, o Estado tenha tido o bom senso de reservar os direitos de adaptação ao cinema desta história, que estou certo será disputada por Hollywood e Bollywood. Sempre será algum dinheiro que entra para minorar o prejuízo de seis mil milhões.

[do JN]

11 abril, 2012

Europa e Regiões [Espanha]

A Espanha está organizada sob a forma de um governo parlamentar  numa monarquia constitucional. Ao contrário de Portugal com a queda de Salazar, os espanhóis aproveitaram a morte de Franco para se democratizarem e implantarem no país 17 regiões autónomas, 4 das quais [Galiza, País Basco, Catalunha e Andaluzia] beneficiando constitucionalmente do estatuto de "Nacionalidades Históricas".

As restantes comunidades autónomas não gozando embora da mesma autonomia beneficiaram de condições para ao longo dos anos irem progressivamente adquirindo um maior autonomia.

Hoje em dia, a Espanha está considerada como um dos países mais descentralizados da Europa, visto que todos os seus diferentes territórios administram localmente os seus sistemas de saúde e educativos, bem como alguns aspectos do orçamento público. Apesar da crise global, Espanha é um dos países mais desenvolvidos do mundo, com tudo o que de ambíguo tem o termo.
  • Área:               504.030 Km2
  • População:  46.063.511 habitantes
  • PIB.           US$ 1.4013 biliões



10 abril, 2012

Destrunfar

Em comparação com a Grécia e a Espanha, a forte coesão nacional é considerada um dos nossos principais trunfos para enfrentar a actual crise. Politicamente, o acordo tripartidário com a troika criou um apoio ao programa que lhe dá credibilidade, simplificando a sua execução. Socialmente, há a percepção de que não existe alternativa espelhada no fracasso da recente greve geral. Como em qualquer jogo, ter trunfos é melhor do que os não ter. Para se ganhar é, porém, preciso saber como e quando os usar e não os desbaratar. O Governo parece ainda não o ter percebido. 

Há vários modos de ser arrogante. Sócrates foi um caso extremo. Consegue-se, porém, ser tão ou mais arrogante falando mansa ou lentamente. As consequências podem ser perigosas. A Grécia é, também a este propósito, uma lição. Quando os socialistas gregos ganharam as últimas eleições, encontraram um país numa situação que era bem pior do que aquela que, por cá, PSD e CDS herdaram, sobretudo na discrepância entre números comunicados às entidades europeias e os verdadeiros. Depois, o PASOK cometeu erros, não tendo, segundo a troika, ido tão longe quanto devia nas reformas estruturais e na aplicação das medidas de austeridade. Mesmo assim, a Grécia está a ferro e fogo! A fazer fé nas sondagens, as eleições serão ganhas por aqueles que, há quatro anos, deixaram o país à beira do caos. Admito que, por cá, este facto não deixe alguns membros do aparelho socialista indiferentes e que, entre eles, comece a fazer caminho a ideia de que a evolução grega poderá ser replicada, trocando as cores. Com o tempo, é provável que as suas fileiras engrossem. Se vierem a tornar-se dominantes, o PS renegará o que assinou, invocando argumentos que o Executivo lhes terá dado, o que, ao ritmo que tem vindo a cometer gafes, não será difícil. Politicamente a estratégia será proveitosa, não obstante as consequências económicas serem desastrosas. Mesmo um governo a quem os eleitores conferiram legitimidade para escolher um caminho próprio tem de saber resistir à tentação de dar como adquirida a neutralidade socialista. Se o Governo não for capaz de limitar o sectarismo da sua pretensa omnisciência, mais cedo do que tarde perderemos um dos nossos trunfos mais importantes. 

A tentação do PS para seguir esse caminho aumentará com a erosão social decorrente das medidas de austeridade e dos erros cometidos na sua concretização. Pelo seu papel de garante de direitos mínimos, o sistema de segurança social é uma área nevrálgica para a coesão nacional, exigindo-se que seja gerida com rigor e transparência. A forma como os pedidos de reforma antecipada foram congelados não é a mais adequada mas, face ao propósito maior de não hipotecar a sustentabilidade do sistema, não era fácil proceder de outro modo. Se o modelo assentasse na lógica de desconto para si próprio, um pilar neoliberal estranhamente invocado pela Esquerda, as pensões já há muito tempo seriam bastante mais baixas, em especial as antecipadas. No nosso sistema, há um contrato social implícito que nos dará direito a uma reforma, embora os nossos descontos sirvam, numa lógica de solidariedade, sobretudo, para financiar os actuais reformados. A confusão é grande, o que facilita a demagogia e se ultrapassa com informação e esclarecimento, sem estigmatizar seja quem for. Nas antípodas do que o Governo fez a propósito dos beneficiários do RSI, objecto de uma suspeição generalizada, primária e infame, que permite um simétrico com base no qual todos os ricos são desonestos, ressuscitando uma luta de classes que se julgava morta e enterrada. A coesão nacional ainda é um trunfo. Ao ritmo que o PSD e o CDS estão a destrunfar, não durará muito. Só que neste jogo, ninguém ficará a ganhar. P.S. Mário Soares foi apanhado a 199 km por hora. Ninguém estranhou que um episódio privado tenha chegado à Comunicação Social. Investigou-se a violência policial nos incidentes do Chiado, mas considera-se normal que haja "bufos" nessa corporação. Assim vamos nós......
[do JN]


Nota de RoP:

Não sei em que é que o autor do artigo estaria a pensar quando escreveu: «Em comparação com a Grécia e a Espanha, a forte coesão nacional é considerada um dos nossos principais trunfos para enfrentar a actual crise.». Quero crer que estaria a brincar, porque, nos tempos que correm levar a sério esta frase,
é para os nortenhos uma verdadeira provocação. Pelo menos para mim, é. 

Em meu entender, o que este e outros governos  fizeram de "melhor", com as suas alucinantes políticas centralistas e discriminatórias, foi provocar graves fracturas na coesão nacional. Só não tiveram por enquanto grandes consequências porque o povo português continua demasiado alheado da política. 

Mesmo assim, e por este andar, não tardará muito para se começarem a manifestar os sintomas. Para já, graças à leviandade dos governantes, a par do desemprego, os assaltos à mão armada subiram vertiginosamente; daqui a uns tempos, com a subida expectável do preço da água e do que vier por arrastamento, talvez comecem a nascer grupos organizados de "indignados" menos brincalhões do que aqueles a que estamos habituados, e  se notem com outra nitidez os sinais da tal «coesão nacional»... É uma questão de tempo. 

09 abril, 2012

Europa e Regiões [Bélgica]

Reino da Bélgica
A Bélgica é um Estado federal, membro fundador e sede da União Europeia, dividido em três regiões: Bruxelas, Flandres e Valónia. Estas três regiões têm autonomia e legislação próprias, bem como um parlamento composto por representantes regionais eleitos. Todas beneficiam de amplo poder na vida económica, ambiental e nas relações internacionais. 

As duas maiores regiões da Bélgica são a região da Flandres, a norte, de língua holandesa [flamenga] com 59% da população, e a sul a região da Valónia francófona, a sul, habitada por 31% dos belgas. 

A região de Bruxelas com 10% da população, é um enclave bilingue, de maioria francófona na região flamenga.

Há ainda uma pequena comunidade de língua alemã existe no leste da Valónia.

Línguas oficiais:
██ Holandês (~59%)
██ Francês (~40%)
██ Alemão (~1%)




  • Área total:    30 528 km² 
  • População:   10 403 951 de habitantes 
  • PIB:             US$ : 316,2 mil milhões