O futebol, como desporto de eleição a nível mundial, pelo seu poder de atracção popular, é um dos temas que mais paixões desperta. As paixões trazem as críticas, as críticas os críticos, e os críticos, os críticos dos críticos. Talvez seja isto que explica a venda fácil dos jornais desportivos, incluindo a dos pasquins arbitrários que por aí vemos (que me recuso a ler, e ainda mais a comprar), sem ponta de seriedade editorial .
Ontem, o meu clube de eleição, o FCPorto empatou com o Trofense em casa, coisa que já está a tornar-se demasiado rotineira este ano para os saudáveis hábitos antigos que não "permitiam" que alguém mandasse no jogo e o vencesse para além do clube anfitrião. Neste grande clube, há muitos anos que se instalou (e bem) uma rotina de domínio sobre os visitantes, resultante de um sentimento misto de revolta e injustiça que transcendem largamente a mera competitividade desportiva. O FCPorto, mais do que um factor alienante, foi, para as populações locais, pela mão de Pinto da Costa, no pós 25 de Abril (agora também do país), a única instituição da cidade que conseguiu superar o domínio neo-imperial de Lisboa e a subserviência dos sucessivos representantes políticos, exclusivamente interessados em governar a sua vidinha miserável de paus mandados.
Um pouco off topic, mas a bem da justiça, há que o reconhecer, apenas outra instituição extra futebol, tem, nos anos recentes, dado passos significativos para contrariar a obediência canina às iniciativas despóticas do poder central e ao marasmo instalado, chama-se: Associação Comercial do Porto, e o seu timoneiro, Rui Moreira. Isso é indesmentível e perceptível em qualquer local, incluindo aqui, na blogosfera, onde é frequentemente solicitado, desafiado mesmo, para se candidatar a todo o tipo de cargos que vão da política local (Câmara do Porto), à nacional (fundar um novo partido), até ao desporto (Presidente do FCPorto, após a saída de Pinto da Costa). Tem sido ele quem tem sabido congregar todas as outras entidades e associações nortenhas de relevo, e levar a cabo as iniciativas mais pertinentes para o Porto e para toda a região Norte, como é a conhecida questão do Aeroporto Sá Carneiro. Até o quezilento Rui Rio, como Presidente da Junta Metropolitana do Porto, está a retirar dividendos políticos com o seu dinamismo. E esse, é o meu único receio...
Mas, voltemos ao futebol e aos críticos. Os adeptos gostam de futebol. É, pois, natural, que percebam também alguma coisa do ofício e que, sem quererem propriamente tirar o lugar ao treinador de facto e de direito, gostem de opinar sobre o assunto, porque, afinal, o que pretendem é ver bons espectáculos e que o seu clube ganhe, de preferência, sempre.
É do conhecimento público, que a maioria dos adeptos portistas não vai muito à "missa" do treinador Jesualdo Ferreira, apesar dos categóricos 20 pontos a que deixou o adversário mais próximo no campeonato passado, mas tal, só prova que os números nem sempre podem servir de explicação para tudo, especialmente, para a qualidade. Se a teoria fosse fiável, o Benfica, com os seus improváveis 6 milhões de adeptos, seria a melhor equipa portuguesa, e como se sabe não o é, há já muitos e benditos anos...
O problema maior de Jesualdo não é empírico nem do foro técnico, é um caso de complementaridade que estabelece a diferença entre os bons treinadores (mas, «normais»), e os treinadores extraordinários. Falta-lhe aquele must, que faz a diferença. Em primeiro lugar, penso que comunica mal com os jogadores, e comunicar bem quer dizer fazer com que os jogadores cumpram regularmente as sua directrizes.
O jogo de ontem foi mais um entre muitos, mas noutros, em que até saiu vencedor, voltou a verificar-se o mesmo problema. Os jogadores estiveram toda a 1ª. parte a jogar a passo, a um ritmo enfadonho, sem chama nem velocidade em que a previsibilidade foi o dominador comum. Resultado: os golos não apareceram. Para mim, banal «treinador de bancada», é incompreensível que Jesualdo não saiba, ou considere importante, transmitir para dentro do campo e em tempo útil, sinais de inconformismo com a forma de jogar dos seus pupilos, de modo a obrigá-los a alterá-lo muito antes do tempo se esgotar. Nota-se em Jesualdo uma tolerância excessiva que em nada se recomenda. José Mourinho (e não só), quando as coisas não estavam a correr como ele pretendia, enviava bilhetinhos para o terreno de jogo que pouco tempo depois se traduziam numa mudança radical do ritmo ou estratégia do encontro. A passividade de JF, nestas situações é recorrente, coisa que não me parece um pormenor irrelevante. Chega a ser irritante.
Outro aspecto em que é notória a falta de mecanismos da equipa, é o da chamada (e necessária)pressão alta. Já o ano passado se notou essa lacuna. A equipa dá imensos espaços ao adversário e corre mais atrás da bola do que do jogador que a tem. Um único jogador o fazia (e bem): Lisandro Lopes. Só que, isso era (e é) resultado da garra individual do atleta, não de um sistema devidamente treinado, caso contrário, todos os jogadores o sabiam executar. É essa falta de treino adequado que explica vermos frequentemente os n/ jogadores a correrem de forma algo anárquica atrás da bola sem a conseguirem interceptar e quando o conseguem perderem-na logo a seguir, nos ressaltos. Os tempos são desajustados com as acções.
Boby Robson - um dos treinadores que mais gostei de ver treinar o FCPorto - tinha esse tal must que falta a Jesualdo. Era um prazer observar o seu trabalho de mentalização aos jogadores. Ouví-lo gritar aos atletas "confiance!" no momento do remate. Quando repetiam o exercício raramente falhavam a bola. Outra aspecto que soube impor no âmbito mental, foi o da procura rápida do primeiro golo, logo seguida da busca do segundo, como forma de consolidar prematuramente os níveis de confiança à sua equipa, ao mesmo tempo que desmoralizava a dos adversários.
Em Jesualdo, há uma ilusória postura asséptica que não corresponde a um controle efectivo dos acontecimentos. Quando as coisas correm mal, lembra-se finalmente de comunicar, mas quase sempre fora de tempo, para o exterior e para se desculpar, quando a comunicação deve ser uma constante no seio dos jogadores, no balneário e nos treinos, e realizada com eficácia.
A procissão ainda vai no adro, já sabemos, mas apesar disso, tenho a certeza de um factor que, nesta hora, deve dominar o sentimento dos portistas em relação a Jesualdo Ferreira. Chama-se: insegurança.