Curioso, o fenómeno futebol! Cada vez que resolvo escrever sobre o tema, o nível de comentários sobe de forma vertiginosa. Isto, vale o que vale, mas pode querer dizer alguma coisa.
Quando criei este espaço de opinião, fiz questão de não o emparedar dentro de uma temática específica, tendo embora a cidade do Porto e tudo o que a envolve, como ponto nuclear. A abertura descomplexada ao debate sobre futebol foi intencional, uma espécie de teste, procurando estabelecer a ponte entre os afectos clubísticos dos leitores [que são dos mais fortes] e os interesses económico-sociais.
Noutros espaços do género, há quem discuta os assuntos com propostas vestidas de soluções consoante a área académica ou profissional de quem as apresenta. É uma opção válida, mas um tanto inócua, considerando as minúsculas oportunidades de execução das mesmas. Nós cidadãos, podemos teorizar, apresentar esquemas cientificamente válidos, mas ainda não vivemos numa sociedade devidamente estruturada para os aproveitar. Contudo, interiorizamos a ideia reconfortante para o ego de estarmos a fazer algo mais do que simplesmente criticar. Pura ilusão. Por mais sérios e rebuscados que sejam os nossos planos ou ideias, são outros, quiçá os mais incompetentes, quem os executa [quando executa].
Naturalmente, seria demagógico indignarmo-nos com os métodos distorcidos de premiar financeiramente o mérito de gestores de empresas publico-privadas e fechar os olhos aos dos directores desportivos do nosso clube, apenas porque se trata do nosso clube. O amor ao nosso clube não deve superar a exigência do rigor. Mas há um pequeno/grande detalhe a separar as mesmas águas: é que as vitórias do nosso clube funcionam como lenitivo para todas as frustrações, e por isso, consciente ou inconscientemente, nos dispomos a irrelevar a obscuridade das contabilidades e das grandes negociatas. Mas o futebol não é pior do que o resto. É igual. A diferença está no tipo de compensações, no feed-back do desperdício.
Ao gestor de uma grande empresa não toleramos que beneficie de sumptuosos vencimentos, porque não nos contentamos em saber dos lucros [objectivos] dessa empresa sem conhecer o destino que tiveram, de como, quem e quantos, deles beneficiaram. E com razão. Porque esse é o mistério que, curiosamente, nem os próprios jornalistas se interessam em desvendar... Ao dirigente desportivo, só pedimos é que vença, caso contrário, as contas terão então de ser feitas.
Com isto, não se deve extrapolar para o preconceito espalhado que diz que o futebol aliena. Não, a sociedade, tal como está esquematizada[mal, quanto a mim] é que aliena e mitifica. O futebol, limita-se a ser um ramo de uma gigantesca árvore com uma vantagem sobre todos os outros: distribui a "riqueza" dos afectos e encobre secretas frustrações com mais democracia. Por isso, agrada a uma maioria.