01 julho, 2011

A direita não tem emenda...

...sofre de um crónico desprezo pela cultura profunda. O grande "defeito" da cultura, é tornar as pessoas um pedacinho mais lúcidas. É o que a direita pensa, mas nunca o irá confessar.

Há quem acredite não existirem diferenças entre esquerda e direita. Politicamente, e se acreditarmos que o PS é um partido de esquerda, talvez não. Intelectualmente ainda há muitas diferenças. Este Governo acaba de o provar, e o anterior, nem com o charme da Gabriela Canavilhas conseguiu provar o contrário.

Abrunhosa diz que "o Porto está a competir com a Rechousa" em termos culturais

F.C Porto assume gestão do Porto Canal em Agosto

Adiou-se por um mês. O F.C Porto começa dia 1 de Agosto a tomar conta da grelha do Porto Canal. Numa primeira fase, está prevista a inclusão de espaços informativos acerca das actividades desportivas.

Só em Janeiro se apresentará uma antena completamente renovada e também se reserva para essa altura um contributo regular ou pontual em antena, ainda a definir, de Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do F.C. Porto.

O clube adquiriu a parte detida pela Media Luso (97%), pertencente ao grupo espanhol Mediapro, mediante um acordo que prevê uma aquisição completa de capital em três anos e o compromisso de fornecimento de programas durante quatro anos, cujo tecto mínimo é de 60%.

"O compromisso é o da qualidade e não o da rapidez", justifica fonte ligada ao processo. Durante Agosto, será visível a pincelada azul e branca transversal a alguns programas focados no clube, ainda que a ideia seja sempre adaptar esse grafismo ao existente, para que não destoe.

Um ponto forte será a transmissão desde o estúdio criado no estádio do Dragão. Garante-se ainda o manutenção do carácter generalista da estação e a cobertura da região Norte, como tem sido estratégico.

A direcção do canal foi confiada a Rui Cerqueira, director de comunicação do clube. Nos próximos dias, será fechada a contratação do director de Informação.

[Dina Margato/JN]

30 junho, 2011

O Metro e os fundos que não tem




  

 Amo-te metro

O metro do Porto demorou anos de luta, exigiu muito dinheiro europeu e nacional, mas é a maior conquista do Porto do início do século XXI. Quando arrancou, em 2002, tivemos a esperança de ter conseguido algo absolutamente essencial para a nossa sobrevivência como área metropolitana produtiva, capaz de ajudar o comércio de rua, a produtividade laboral, a cultura, a presença dos estudantes na cidade, a manutenção dos consultórios médicos, profissões liberais, etc..

A vida da cidade, de facto, mudou e trouxe-nos esse ícone - o metro a passar na ponte D. Luiz, como se fosse um sonho pintado a amarelo e cinzento sobre o ferro centenário, em tons de castanho, e o Douro e a Foz ao fundo... Dentro das carruagens, as nossas pessoas, ricas ou pobres, a poderem usufruir de um transporte digno, que as deixa organizar a vida com mais qualidade. Mas estamos a meio deste sonho, que pode tornar-se num pesadelo.

Infelizmente, a extensão da rede está altamente ameaçada pela falta de dinheiro do país. Ainda por cima o JN avançava que os fundos comunitários previstos para o (erradamente intitulado) "TGV" não vêm para o metro do Porto. Mas não há razões para se desistir: a União Europeia vai querer que Portugal aproveite os fundos e mantenha algumas obras. Ora, o metro enquadra-se na política que é a menina dos olhos de Bruxelas - o uso mais eficiente da energia e o fomento de melhor mobilidade urbana. Isto significa maior produtividade e menos CO2. Com persistência, talvez o Governo recupere o dinheiro que esteve previsto para a alta velocidade Porto-Vigo.

Para se justificarem novos investimentos precisa-se, em primeiro lugar, de garantir que o número de passageiros do metro continue a crescer. É fundamental que cada cidadão olhe para a utilização do transporte público da sua cidade como se estivesse a marcar um golo pela sua equipa.

Além disso, há que escolher: estender mais a rede ou dar-lhe densidade de passageiros? Seria importante reanalisar-se bem a nova fase planeada. Por exemplo, a engavetada "linha circular", no miolo da cidade (o projecto inicial apontava para as ruas de Fernão de Magalhães, Costa Cabral, Rotunda da Boavista, Campo Alegre, Palácio de Cristal e a Praça dos Leões). Ela ajudaria muito à essencial revitalização da Baixa do Porto - importante para garantir novas indústrias culturais, melhor turismo, mais reabilitação urbana. Esta linha pode muito bem ser o ovo de Colombo de uma maior capitação de passageiros no metro.
É preciso também dar solução ao problema da Avenida da Boavista. É inacreditável que a maior artéria da cidade, com elevada concentração de serviços, hotéis e pólos de turismo, esteja desintegrada da rede. Rui Rio tinha razão ao insistir com o desastroso ministro Mário Lino na necessidade de se executar a linha Matosinhos Sul-Boavista - mais barata porque está à superfície, e rápida de construir. Ainda é possível voltar atrás?

Convém, a este propósito, não esquecer o que tem dito Souto de Moura sobre a alternativa entretanto aprovada, a linha Matosinhos Sul-São Bento: "O metro não cabe" no troço Campo Alegre-Praça da Galiza. Ora, se o 'Prémio Nobel' da Arquitectura diz isto - ele que conhece tão bem o metro do Porto, - vale a pena, pelo menos, perceber porquê. Desde o princípio que fica a ideia de que o 'bom negócio' seria levar o metro pela futura Avenida Nun'Álvares (junto à Foz) e com isso potenciar-se-ia a valorização imobiliária (de luxo) da nova artéria. É em momentos de crise que as decisões públicas têm de ser ainda mais criteriosas. Quem tem razão? Souto de Moura ou os estudos da Metro do Porto?

Acresce que o Porto talvez necessite mais de reabilitação do que fomentar construção hipervalorizada pelo metro à porta. Precisamos de mais prédios a entrar no mercado? Ou a reabilitação da baixa exige que se concentre ali o dinheiro que resta? Um miolo de cidade recuperado é a melhor alavanca para o crescimento dos serviços e do turismo em toda a Área Metropolitana, e isso cria emprego. A mobilidade urbana inteligente, fiável, e sem poluição, é o que vai distinguir as cidades do futuro onde valerá a pena viver e investir. O metro, e uma visão integrada de transportes ao seu redor, é a chave desse futuro.

Nota de RoP:
Espero não se tratar de uma mera ilusão óptica, ou cosmética, mas noto uma ligeira melhoria no JN, nomeadamente em matéria de colaboradores. Gostava de não me estar a precipitar...

Dêem-lhe tempo, ou, se não podes vencê-los...


Dêem-lhe tempo

A apresentação do Programa de Governo funcionou como tiro de partida para que vários "lobbies", habitualmente discretos, saltassem alvoroçadamente da toca vendo os seus interesses na iminência de ser beliscados.

Para Pais do Amaral e para Balsemão, não existe, no actual panorama televisivo, lugar para outro concorrente (e que raio terão os contribuintes com isso?). Com a hipotética privatização de um dos canais da RTP passaria desta vez a haver, para alguns voluntariosos críticos do "excesso de Estado", "concorrência em excesso". Ou seja: pensando melhor, talvez afinal o Estado não seja mau, principalmente se somos nós quem está debaixo do seu guarda-chuva proteccionista.

Também a notícia da suspensão do TGV parece ter posto os cabelos em pé a muita gente, do consórcio ELOS, liderado pela Soares da Costa e pela Brisa (que se preparava para cobrar 1,359 mil milhões de euros, sem IVA, pela construção, mais 12,2 milhões por ano pela manutenção dos 167 quilómetros do troço Poceirão-Caia, ameaçando agora reclamar 150 milhões de indemnização ao Estado, ao... ministro espanhol do Fomento, para quem suspender o TGV é uma "má decisão" pela qual poderão vir ser pedidas explicações a Portugal (que é como quem diz aos contribuintes portugueses).

Passos Coelho não sabe onde se meteu. Dêem-lhe tempo. Acabará, como Sócrates, por descobrir, os "lobbies" regressarão a penates e tudo voltará à normalidade.

[Do JN]

29 junho, 2011

Povo-enigma

O leitor não levará a mal se começar por dizer uma redundância. Que tudo aquilo que aqui escrevo, não é mais do que uma súmula de opiniões. Das minhas opiniões, claro. Compreenderá, espero, que por mais fortes que sejam as minhas convicções [e pode crer que são], não tenciono impô-las a ninguém. Deixo ao critério de cada um, retirar as conclusões que entender melhor. É que, de vez em quando, gosto de fazer breves exames à consciência, tal é a frequência com que censuro o meu povo, sentindo-me apesar disso, sua parte integrante. 

Fiz esta breve introdução, porque tenciono continuar a falar do povo, e no grande mistério que ele constitui para mim. Mais do que o enigma chamado políticos, preocupa-me aquele que se chama  povo.

Vi com muito estranheza, a reeleição de Rui Rio como Presidente da Câmara do Porto, mais exactamente, a do 2º. e 3º. mandato, já que o 1º., houve quem o visse como um castigo ao PS pelo abandono de Fernando Gomes da chefia do município, a troco de uma vaidadezinha carreirista. Outro mistério, foi o eleitorado ter permitido a José Sócrates a manutenção do Governo durante tanto tempo, depois de tantas e repetidas asneiras. Enfim, foram verdadeiros fenómenos sem qualquer explicação racional que os justifiquem.

A realidade, é que  a soberana vox populi, que apenas se faz ouvir através do voto, e sem conhecer minimamente os eleitos, não teve sabedoria bastante, tanto para evitar a intervenção do FMI no país, como para correr com o pior, e mais abulíco Presidente de Câmara que a cidade do Porto jamais conheceu, o que, contraria, em parte, a ideia ,de que o povo tem sempre razão. Antes tivesse.

A entrada da Troika em Portugal, não serve apenas para alimentar centenas de debates televisivos, com a bafienta colaboração de muitos co-autores de descalabros antigos, serve também para a população (se para tal estiver disponível), estabelecer contrastes entre o que se disse, e se fez, em anteriores tomadas de posse, e o que se diz, e sobretudo o que se terá mesmo de fazer, na presença do FMI. Se assim entender, se o povo não se distrair demasiado com  telenovelas e futebol [e eu gosto de futebol], então irá talvez estranhar quando ler títulos noticiosos como o que hoje vinha  no JN : "Ministros que falhem orçamento são penalizados". Depois de lidos tais títulos, o que é que nos ocorrerá imediatamente concluir? Que, antes, ministro que apresentasse derrapagens orçamentais nunca era penalizado? Pois, não era, não. Talvez com a polícia Troika por perto as coisas melhorem...

Há uma outra curiosidade que vale a pena observar. São visíveis, da parte de alguns membros do novo governo, alguns sinais, ou vontade, de mostrar depressa serviço, principalmente os mais novos, o que é de louvar, mas receio que tal não passe de uma euforia momentânea e que cedo tudo volte à histórica (a)normalidade, quando, e se, a Troika deixar de os "policiar".

Duvido que o FMI, tão cedo, dê rédea-solta ao governo e que este se possa dar ao luxo de cometer as asneiras de governos do passado recente, e remoto. Por enquanto, está obrigado a fazer bem o trabalho de casa, e não tem margem de manobra para errar. Mas cuidado, que não se estique demais a corda da austeridade, porque aquilo que está a acontecer na Grécia, pode repetir-se aqui, se o bom senso não acompanhar as medidas que devem ser tomadas.   Os gregos revoltosos, a quem Judite de Sousa se lembrou de chamar anarquistas, dizem [e ela parece não ter ouvido], preto no branco, que não estão mais dispostos a fazer sacrifícios por uma crise extremada pelo comportamento corrupto dos seus políticos, e isso é que devia preocupar a jornalista e o nosso Governo. 

Palpita-me portanto, que a ideia lançada por Paulo Portas de tratar todos os subsídio-dependentes comprovadamente pobres, como um bando de oportunistas preguiçosos, e obrigá-los a trabalho comunitário, parece-me, além de ofensiva, discriminadora, demagogo e uma pura aberração política. Pode até ser a primeira bomba a explodir nas mãos de Passos Coelho. Será uma medida que pode virar-se contra o objectivo pretendido, pois configura o aproveitamento de mão d'obra miserável em beneficio do Estado, não sendo por aí que o país irá progredir.

Há que ser realista, não tratar as pessoas como mentecaptas, sem esquecer as centenas que todos os dias aumentam a longa lista de desempregados, com o mercado trabalho sem nada de concreto para lhes oferecer. A livre iniciativa não é para todos, custa dinheiro. Salvadores Caetanos, não abundam,  políticos sérios e competentes também não.

Será que o povo, o enigma povo, tem consciência disso? Cá por mim, tudo indica que o povo continua a votar orientado por um único critério: o das aparências.  Será? Sinceramente, não sei responder. O enigma permanece.

28 junho, 2011

Marcelices e antípodas

Se o ex-político, Marcelo Rebelo de Sousa e o empresário recém falecido Salvador Caetano, fossem territórios ou oceanos, sem dúvida formariam, dois pontos completamente antipodais.  Enquanto Salvador Caetano fez do trabalho duro e da sua 4ª. classe, um império de sabedoria, traduzido em cerca de 2,4 mil milhões de euros e em 6.500 "irrisórios" postos de trabalho distribuídos por vários países do Mundo, Marcelo Rebelo de Sousa, com a sua licenciatura em direito, e enquanto político, pouco fez de relevante pelo país...

Ou me engano muito, ou foi mesmo por Marcelo ter a língua comprida, que Passos Coelho travou a ida do administrador da TVI, Bernardo Bairrão para Secretário de Estado da Administração Interna. E se foi de facto essa a causa da súbita mudança de ideias de PPC, só tenho é de o elogiar. Primeiro, porque deu um claro sinal de querer blindar o novo governo das prodigiosas boatices de governos anteriores. E segundo, porque sem entrar em explicações estéreis, disse claramente quem manda no partido e no Governo. Espero que esta atitude seja seguida de outras semelhantes sempre que achar imperativo fazê-lo. Se tiver arcaboiço para suster as pressões internas e dos media, pode ser que este seja o princípio de uma nova forma de fazer política. Não tenho lá muita fezada, mas quem sabe?

Não vejo pois, como populistas [longe disso] estas recentes notícias que dão conta da fuga de alguns membros do Governo às futilidades protocolares. O que é preciso é continuar, não abrandar, nem dar sinais de que estes actos não passam de romanticos e voláteis processos de intenções. Acho bem, didáctico até, que alguns deputados e membros do governo, passem a ir [sempre que possível, claro] de bicicleta para o parlamento ou para os ministérios. Acho correcto que tentem evitar tanto quanto possível o recurso a luxos e mordomias num momento como o actual, onde o desemprego sobe vertiginosamente e o custo de vida também. A isso chama-se, bom senso.  Ao contrário do professor Marcelo, que até sobre futebol gosta de dar pareceres, não penso que o actual Ministro da Economia tenha deixado cair os parentes na lama por gostar que o tratem pelo nome. Afinal, é pelo nome que todos nos devemos tratar. O senhor Ministro Álvaro Santos Pereira viveu alguns anos num país moderno e evoluído, como o Canadá, limpou a cabeça de preconceitos. Não será portanto Portugal o país mais indicado para lhe dar conselhos, e muito menos o senhor Marcelo.

O uso extemporâneo do título académico antes do nome, mais não é do que uma manifestação bacôca de provincianismo e pedantice que só agrada às pessoas  que não confiam nas suas capacidades e na sua honra pessoal. Marcelo, até neste comentário foi ridículo, deixando bem visível os laços que ainda o prendem ao Estado Novo...

Gostava, era de ver Marcelo preocupado com outras situações, essas sim, graves e indignas de quem ascendeu a lugares políticos de relevo, como os seus ex-colegas de partido, Dias Loureiro e Duarte Lima [só para citar alguns]. Presumo que falar destes políticos «exemplares», e da pouca vergonha que os envolve, seja proibido, assunto tabu, acto populista, mas diga-se de passagem, tanto cinismo, já começa a agoniar.   

Bem tinha as minhas razões em desconfiar das palavras de Ludgero Marques, proferidas aqui há uns anos, quando pretendia acabar com o tratamento de engenheiro nos círculos empresariais. O português-tipo não alinha em pragmatismos, gosta da - desculpem-me a grosseria - cagança. Põe sempre o parecer à frente do ser.

Talvez seja esta vacuidade mental que continua a dar lastro a futuros Marcelos Rebelos de Sousa. Convencidos e hipócritas.

27 junho, 2011

Um buraco chamado Lisboa

Olhado de cima e visto em perspectiva, Portugal é como um bilhar snooker que descai sempre para um buraco chamado Lisboa, que absorve, bulímico, os recursos humanos e materiais do resto do país.

O problema não é novo. Quem leu a "Queda de um anjo", de Camilo, sabe que este maléfico magnetismo já era poderoso mesmo num século como o XIX onde o Porto liberal, invicto e vitorioso da Guerra Civil, viveu um dos períodos de maior esplendor da sua história.

Ao nacionalizar os grupos económicos que viviam à sombra da protecção do Estado Novo, o 25 de Abril abriu o espaço para a emergência, a Norte, de uma nova geração de empresários, de que Belmiro de Azevedo e Américo Amorim são as cabeças de proa, que mudaram a face do país.

O poder económico deslocou--se para Norte, onde uma impressionante multidão de PME produtoras de bens transaccionáveis salvaram, com as suas exportações, o país da bancarrota.

Os empresários do Norte não ficaram à espera das privatizações e aventuraram-se a criar os primeiros bancos privados (BPI e BCP) após a revolução, numa altura em que os velhos capitalistas ainda mantinham bens e famílias na Suíça e no Brasil.

Cavaco pôs um ponto final a esta fase de desenvolvimento harmonioso e liberal da economia do país ao usar o programa de privatizações para fazer renascer os grupos engordados à mesa do salazarismo. Nenhum analista político e económico honesto deixará de identificar a década cavaquista como o período em que os portugueses, anestesiados pela chuva torrencial de dinheiro vindo de Bruxelas, consentiram na construção de um estado ultracentralista e fecharam os olhos ao nascimento de dois monstros (o do défice e o da Função Pública).

Fernando Gomes foi o líder que capitalizou a nível político o poder económico da região, que já se deslocava para o buraco negro lisboeta. A proclamação pela UNESCO do Centro Histórico do Porto como Património da Humanidade, o metro do Porto, o Parque da Cidade, o Porto Capital Europeia da Cultura, a Casa da Música são as marcas deste período áureo da metrópole que, com o seu porto de Leixões e aeroporto Sá Carneiro, é a cabeça natural da mais empreendedora região do nosso país.

Apesar de ser o líder respeitado de uma região e de estar informado das desventuras na capital do fidalgo minhoto Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda (o herói da novela camiliana), Fernando Gomes não resistiu ao cântico das sereias lisboetas e na primeira oportunidade trocou a vista da Avenida dos Aliados pela do Terreiro do Paço, com o resultado conhecido (o suicídio político).

A contínua migração para Lisboa de líderes e massa cinzenta tem de deixar de ser uma fatalidade.

Para ressurgir, a Região Norte precisa de políticos que olhem para o Porto, Aveiro, Braga, Guimarães, Viana do Castelo, Bragança, Viseu, Guarda e Vila Real como pontos de chegada - e não como pontos de partida.

[Jorge Fiel/JN]

Nota de RoP:
Esta crónica já tem alguns dias, mas como os factos mostram, não perde na oportunidade. Nem irá perder, no futuro.

Razia idêntica à do fim dos anos de 1980

Estudo entregue à troika propõe fecho de 800 km de linha férrea

A concretizar-se, será uma razia idêntica à do fim dos anos de 1980, quando Portugal encerrou 800 quilómetros de linhas de caminho-de-ferro, sobretudo no Alentejo e em Trás-os-Montes. O Governo de José Sócrates propôs à troika o encerramento de 794 quilómetros de vias-férreas, também com particular incidência no Norte e no Alentejo, mas desta vez incluindo algumas linhas do litoral, como a própria Linha do Oeste, que seria encerrada entre Louriçal e Torres Vedras (127 quilómetros).

O estudo foi realizado, à revelia da Refer, por uma equipa conjunta do Ministério das Finanças e do Ministério das Obras Públicas e Transportes. E consolida o fim das linhas que até agora estavam encerradas "provisoriamente" à espera de obras de modernização (Corgo, Tâmega, Tua e troços Figueira da Foz-Pampilhosa e Guarda-Covilhã, num total de 192 quilómetros). Inclui também a Linha do Douro, entre Régua e Pocinho (68 quilómetros), a Linha do Leste entre Abrantes e Elvas (130 quilómetros), a Linha do Vouga (96 quilómetros), o ramal de Cáceres (65 quilómetros), a Linha do Alentejo entre Casa Branca e Ourique (116 quilómetros). Esta última deixaria Beja sem comboios, apesar de, neste momento, a CP estar a preparar uma oferta especial desta cidade aos Intercidades de Évora.

O documento foi apresentado à troika como uma medida eficaz de redução da despesa pública, uma vez que tem um forte impacto simultâneo nas contas da Refer e da CP. Na primeira empresa reduz custos de manutenção e de exploração e na segunda permite-lhe acabar com o serviço regional onde este é mais deficitário (embora nalgumas linhas a abater exista um significativo tráfego de mercadorias).

O impacto deste eventual encerramento deixa a rede ferroviária circunscrita basicamente ao eixo Braga-Faro, Beira Alta e Beira Baixa, desaparecendo as restantes linhas, sendo amputadas outras.

O PÚBLICO apurou que a administração da Refer não subscreve esta visão sobre a ferrovia portuguesa e que tem em cima da mesa um documento de trabalho - ainda não terminado - com uma proposta de cortes mais modesta.

Nela se mantém o fecho das linhas já encerradas (com excepção da ligação Guarda-Covilhã) e se estuda o encerramento do ramal de Cáceres (Torres das Vargens-Marvão), a Linha do Vouga apenas entre Albergaria e Águeda (14 quilómetros) e a Linha do Alentejo entre Beja e Ourique (36 quilómetros). No total, são 240 quilómetros, contra os 800 preconizados no documento elaborado pela equipa mista das Obras Públicas e das Finanças do Governo anterior, liderado pelo PS.

Técnicos da Refer contactados pelo PÚBLICO dizem que esta é uma proposta "cega" e que ignora a importância das redundâncias do sistema. Por exemplo, a Linha do Oeste serve de alternativa à Linha do Norte e a do Alentejo à do Sul. O encerramento conjunto do ramal de Cáceres e da Linha do Leste privaria Portugal de qualquer ligação ferroviária a Espanha a sul de Vilar Formoso, aumentando a distância dos portos de Sines, Setúbal e Lisboa a Madrid e à Estremadura espanhola.

No Douro, o encerramento da linha a jusante da Régua compromete o desenvolvimento turístico da região, que é património mundial. Paradoxalmente, o que os autarcas da região têm vindo a pedir é a reabertura do troço Pocinho-Barca de Alva para fins turísticos e para aproximar a região do mercado espanhol.

Outro paradoxo é a linha entre Guarda e Covilhã, na qual a Refer tem investido, nos últimos sete anos, dezenas de milhões de euros e onde decorrem presentemente investimentos de 7,7 milhões de euros para reparação de túneis. Este troço arrisca-se a não reabrir depois deste dinheiro gasto.

Já sobre a Linha do Oeste havia a promessa da sua modernização, dado tratar-se de uma linha que atravessa uma das regiões do país com maior densidade populacional, unindo um corredor que contém Torres Vedras, Caldas da Rainha, Marinha Grande, Leiria, Figueira da Foz e Coimbra. Um corredor, de resto, que tinha tanto potencial em termos de mobilidade que justificou a construção das auto-estradas números 8 e 17."Dizem que a crise é boa para mudarmos hábitos e mudarmos de paradigma. Uma dessas mudanças tem a ver com uma mobilidade mais amiga do ambiente, com o uso do transporte público e o fim do "deus automóvel", mas não é a fechar linhas que isso se consegue. Se se acaba com a infra-estrutura, o comboio, que já hoje é pouco relevante, terá no futuro uma quota ainda mais residual", queixava-se ao PÚBLICO um quadro da Refer que pediu o anonimato.

Se a Refer ficar aliviada destes 800 quilómetros de linhas, os seus quadros ficarão anda mais sobredimensionados, pelo que, em vez dos 500 despedimentos previstos (PÚBLICO, 14/4/2011), este número poderá chegar aos 800. O Governo actual poderá "comprar" este documento e fechar as linhas sem grandes dificuldades, alegando as imposições da troika e com a vantagem acrescida de o trabalho de casa já ter sido feito pelo anterior Governo socialista. Ou poderá mandar estudar tudo de novo, ou ainda aceitar como bom o estudo em curso na Refer.

O actual conselho de administração desta empresa pública (nomeado pelo Governo de Sócrates) termina o mandato no fim do ano, pelo que dificilmente o novo Governo o substituirá - caso contrário, teria de pagar chorudas indemnizações a administradores, em época de crise.

[No Público]