Recortes secretos de jornais
Faz agora um mês. Mas vamos começar por anteontem. O secretário-geral do Sistema de Informações da República, Pereira Gomes, assumiu no Parlamento ter sabido do assalto aos paióis de Tancos pelo SIS (os serviços secretos).
O SIS soube a 29 de junho do furto de material. Pela Imprensa. No dia em que a Imprensa o noticiou.
A secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, Helena Fazenda, que chefia a Unidade de Coordenação Antiterrorismo, também soube pelos jornais.
Neste entretanto, durante os três meses anteriores andava o Ministério Público a investigar informações (dadas por fonte anónima) de que estaria iminente o assalto a um quartel. Disto, não sabia o SIS, nem os serviços de informações militares.
Ponto intermédio. A Lei de Segurança Interna obriga à partilha de informação entre todas as estruturas associadas à segurança, desde o crime organizado, ao terrorismo.
Está a ser aplicada, como se percebe.
Recuemos ao dia do assalto. Ou melhor, aos dias em que se soube pela Imprensa.
O chefe do Estado-Maior do Exército considera o caso grave. O ministro da Defesa admite que as armas roubadas possam ir parar às mãos de uma rede terrorista. A Procuradoria-Geral da República alinha pelo mesmo temor. O primeiro-ministro vai de férias com as garantias, fornecidas pelos militares, de que o furto não tinha o dramatismo que lhe estavam a dar.
Cinco comandantes são afastados. Temporariamente. Para não constituírem um entrave às investigações. E reintegrados nos seus postos 15 dias depois por já não constituírem qualquer ameaça às investigações. Sem que se tenha qualquer informação sobre as conclusões das ditas investigações.
O primeiro-ministro regressa de férias. E reúne os militares. Que o sossegam. O material roubado só valia 34 mil euros. E a maior parte dele até estaria obsoleto. Um roubo que foi um alívio, portanto. Explosivos. Granadas de mão. Lança-roquetes. E munições.
Voltemos a anteontem. Júlio Pereira considera pouco provável que o armamento seja usado em Portugal, mas, claro, ninguém pode dar garantias quanto a isso. E claro que, através de sucessivas transações no mercado negro, o material pode ir parar "às mãos da ameaça terrorista".Já passou um mês. Voltamos ao assunto para o ano.
Domingos Andrade
DIRETOR-EXECUTIVO (JN)