21 dezembro, 2012

Prefiro Manoel de Oliveira

Tenho idade que chegue para saber que para triunfar na vida a honradez de um Homem é um bem que pode obstaculizar o intento.

Sem nos darmos conta, continuamos a culpar a vida pelos nossos erros, quando até certo ponto, cabe a cada qual evitá-los e procurar fazer o necessário para que não se repitam. Paradoxalmente, há quem goste de enfatizar os progressos da humanidade e ao mesmo tempo comparar a vida das pessoas à dos animais selvagens, sem perceber quão radicais e opostos são estes pontos de vista. Tal como na selva, dizem, na sociedade humana, vence sempre o mais forte [seja lá o que eles entendem por forte]... Esta é uma ideia particularmente enraizada nos Estados Unidos, e que o mundo depressa absorveu, tão poderosa é a máquina de propaganda deste país. O grosso das pessoas absorve tudo, principalmente o lixo ideológico, e até a violência.

Felizmente que as imagens não mentem, e ainda podem provar o que atrás afirmei de forma incontestável. Hoje, com a profusão de canais por cabo, o cinema deve ocupar cerca de 90% (ou mais) de toda a programação televisiva, e a percentagem de filmes americanos também andará lá perto disso. Faça-se o teste, e veja-se quantos desses filmes é possível vermos sem contemplar perseguições, corridas loucas com carros de polícia,  ruídos irritantes de sirenes, assassinatos às dezenas, cansativos chiar de rodas, tiros, facadas, explosões "espectaculares", corpos decepados, derrapagens, heróis e assassinos, enfim, o sangue, a violência. 

É deste tipo de "arte", em suma, que se alimenta a indústria cinematográfica americana. E é a que predomina. Justificação? Simples! Vende, meus senhores, vende! A violência vende, e se vende, fim de papo! Haverá argumento mais nobre, mais "forte"? Aqui chegados, colocados perante o peso do dinheiro, todo o pensamento se esgota e não há lugar para a sensatez . Mesmo assim, ainda há quem se espante com os massacres que alguns seres mais vulneráveis vão provocando por esse mundo fora, particularmente na América. Pergunto: não será também esta a lógica "comercial" que inspira os nossos programas e os jornais "desportivos"? Talvez o Cavaco possa responder, esse grande homem, esse estadista ímpar... 

Não queria extrapolar deste cenário para a vida comezinha de muita gente, de todas as profissões, mas o critério que explica a cobardia, a traição e a falsidade instalada na nossa sociedade, é exactamente o mesmo da cinematografia americana: o dinheiro.

Prefiro Manoel de Oliveira. Ao menos a ele ninguém pode acusar de ter semeado o ódio e a violência com a sua arte.

20 dezembro, 2012

Revoltas contidas

O Arquitecto Gomes Fernandes, ex-vereador da Câmara Municipal do Porto, incomodado com a notícia da transferência do programa Praça da Alegria para a sempre "amiga" capital, termina a sua coluna de hoje no JN, desta maneira: " Falta uma Voz que seja a síntese de muitas vontades e bastantes 'raivas acumuladas' pelo desprezo com que aqueles que nos governam e seus acólitos a partir de Lisboa, têm demonstrado pelo Norte e sua cabeça, a Invicta e Honrada cidade do Porto. Convenhamos que isto é demais, está a passar das marcas e tem de acontecer o tal 'espirro' que faça 'estremecer' Lisboa».

Na rúbrica de opinião do mesmo jornal, Jorge Fiel chamava intrujão ao Governo por este não ter honrado a palavra do anterior Secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, que tinha garantido que o corte ao financiamento público à Casa da Música seria de 20% , e não de 30%, como agora parece ter sido decidido. Logo abaixo na mesma página, é Daniel Deusdado quem arrasa de alto a baixo o actual Governo, alargando as críticas ao acervo de discriminações negativas com que o centralismo tem brindado o Porto,  e todo o Norte de um modo geral.

Eu próprio estou cansado de criticar duramente o racismo político usado contra a nossa cidade e região, tanto pelo governo de Sócrates, como pelo de Passos Coelho, e não sinto que essa liberdade democrática tenha surtido qualquer efeito prático para alterar a situação. Todos estamos cansados de ser mal tratados, que é uma condição muito mais grave e abrangente do que sermos simplesmente mal governados.

Fala muito bem o arquitecto Gomes Fernandes, quando reclama dos nortenhos uma reacção mais forte, capaz de fazer estremecer Lisboa. Eu subscrevo a vontade. Mas para que isso aconteça, teria de haver outro tipo de comportamento. Devíamos começar por não dar ouvidos àqueles que, apesar de reconhecerem a gravidade da situação, não deixam de nos aconselhar a manter a mesma brandura cívica, alegando que substituir agora o governo não iria resolver nada, profetizando todo o tipo de calamidades e desgraças se tal acontecesse, mas por outro lado esquecendo de dizer o que acontecerá aos governantes caso os fracassos se repitam, e nos deixem daqui a uns tempos numa situação ainda mais insustentável que a actual.

É preciso interpretar correctamente a actuação dos governantes, porque isso não pode resumir-se candidamente a questões de competência ou incompetência. E estes governantes, não são apenas incompetentes, são potenciais criminosos, e para os criminosos que andam à solta, é preciso fazer duas coisas: primeiro prendê-los, e depois julgá-los num tribunal constituído pelos juízes mais reputados que o país ainda conservar.

    

18 dezembro, 2012

Hospital de São João tem 30 cirurgiões que nunca foram ao bloco operatório


 

Cada cirurgião do Hospital de S. João, no Porto, faz em média uma cirurgia por semana e há 30 que que nunca foram ao bloco operatório, explicou, segunda-feira à noite, o presidente do Conselho de Administração do São João, em declarações à TVI.
 

Hospital de São João tem 30 cirurgiões que nunca foram ao bloco operatório
António Ferreira (Administrador do H.S.João)    


 

"Cada cirurgião faz em média uma cirurgia por semana", afirmou o presidente do Conselho de Administração do São João, António Ferreira. "No Hospital de São João, 30 cirurgiões nunca foram ao bloco operatório", revelou, em entrevista ao programa "Olhos nos Olhos", na TVI24.

"O cirurgião que fez maior número de cirurgias por ano no hospital fez 543, fez 12 por semana. O cirurgião com menor número de cirurgias, e que fez cirurgias, fez duas. Há 30 que nunca foram ao bloco", revelou António Ferreira.

"A taxa de absentismo é de 11%, isto significa que estão ausentes todos os dias, dos 5600 funcionários, cerca de 660", disse o presidente do Conselho de Administração do São João.

Nota de RoP:
Só assim se explica por que é que a lista de espera para as cirurgias marcadas pelos Centros de Saúde é interminável e os prazos de espera são irresponsáveis. 
 
 

Pedro Passos Coelho, o novo Frei Tomás

Este podia bem ser Pedro Passos Coelho
Quando Pedro Passos Coelho declarou textualmente que «alguns, que hoje recebem pensões não descontaram na proporção das pensões que recebem», provavelmente terá havido no local um qualquer ciclone tropical, porque, ao que parece, além do Chefe do Governo não devia encontrar-se ninguém por ali [um repórter, por exemplo] para lhe perguntar se ele estava a referir-se à classe política, e às várias pensões de reforma acumuladas que lhes foram atribuídas, nalguns casos, com pouco mais de 50 anos de idade. Ninguém se lembrou de lhe perguntar se a natureza das suas declarações era suficientemente séria para as decretar a ele próprio e a toda a equipa governativa, ou se era mais uma boca demagógica igual a muitas que tem vindo a proferir.

Mas não, a imaginação dos jornalistas não chega a tanto, porque a um 1º. Ministro parece que é proibido colocar questões "populistas". De mais a mais, agora, que a RTP Porto está num processo de limpeza, para corporizar o famoso efeito difusor invertido, muito do gosto dos governos centralistas [ leia-se: parasitas].

Enfim, temos de nos resignar. Não podemos mais pensar que os paizinhos destes garotos, precoce e estupidamente promovidos a elites, alguma vez lhes disseram que para nos darmos ao respeito temos de começar por nós, aplicando à nossa vida aquilo que propomos como patriótico aos outros. Não é a pregar como Frei Tomás que se ganha credibilidade.

17 dezembro, 2012

O de cima diz bem do de baixo



Ao ver que não o ia conseguir domesticar, Lisboa recebeu-o com pedras. A campanha suja contra o bastonário eleito pelos advogados da província decorreu com o profissionalismo que Fernando Gomes testemunhou quando teve a fraqueza de trocar o lugar de melhor presidente da Câmara que o Porto teve por um gabinete subalterno na esquina do Terreiro do Paço, onde Manuel Buíça feriu de morte a Monarquia.

A campanha falhou no que estava programado ser o ato final da lapidação, o tribunal da TVI onde a tonta Moura Guedes teve a imprudência de chamar bufo a um homem que após ter sido preso pela Pide, em Coimbra, aguentou como um herói as humilhações, os três dias e três noites de interrogatórios e os 34 dias no isolamento, em Caxias.

O arraso que o bastonário deu à apresentadora televisiva, que por ter a boca maior que o cérebro está sempre a tentar dar passadas maiores que a perna, é um dos meus vídeos favoritos (a par do dos golos do 5-0 que o meu Porto deu ao Benfica do Marinho), que de vez em quando revisito no YouTube. É um espetáculo de cidadania.

Tenho muito orgulho em ser amigo do Marinho, de quem fui colega durante quase 20 anos, na Redação do "Expresso", quando ele usava o nome António Marinho.

Um das coisas que mais admiro nele é que ao longo das suas sucessivas reencarnações - universitário revoltado com a ditadura, professor, advogado, jornalista e bastonário - nunca teve medo de dizer o que pensa em voz alta e de pertencer aquele raro grupo de pessoas que quando lhe fazem uma pergunta a sua resposta não tem por objetivo agradar a quem a fez.

Com o Marinho e Pinto, bastonário reeleito por maioria absoluta e com a maior votação de sempre, estive apenas umas duas ou três vezes, a última das quais, há quase dois anos, terminou à mesa, à volta de um leitão, no Albatroz.

Mas, para além de coabitarmos um vez por mês esta página do nosso JN, vou acompanhando e aplaudindo à distância o seu combate por uma justiça mais barata, contra a soberba dos juízes, que se julgam donos dos tribunais, e um Parlamento que se tornou numa central de tráfico de influências, onde os deputados podem ter clientes com interesses nas leis que eles fazem.

Gostei da frontalidade com que avisou os estudantes para fugirem do cursos de Direito, evitando assim que a massificação acentue a proletarização e degradação da classe. E assino por baixo quando ele, de sobrolho carregado, denuncia uma Justiça injusta, cheia de silêncios e mentiras, que se curva perante os ricos e poderosos - e maltrata os pobre e desprotegidos.

Mas o que mais tenho a agradecer ao meu amigo Marinho é ter desmentido a fatalidade dos provincianos, como nós, se deixarem corromper pelo luxo e prazer - o cheiro a canela... - de Lisboa, tão bem caricaturado por Camilo, em "A queda de um anjo", na pessoa do deslumbrado fidalgo minhoto Calisto Elói.*

Nota de RoP:

* Este último parágrafo é que me parece não corresponder lá muito à realidade. Faz-me recordar - só para citar um exemplo - o regionalista "convicto" Carlos Abreu Amorim, que agora, que aderiu ao PSD, já usa a cassete da "inoportunidade" do momento, para justificar o abandono da causa regionalista, provando que na política o oportunismo não conhece excepções. São de facto todos iguais.  Uma merda.