12 abril, 2012

O BPN dava um filme indiano


Não imaginam  quanto  lamento não  ter o tempo  nem  o  talento  para digerir  os 70 volumes e  700 apensos  do caso  BPN  e escrever   um  thriller  baseado  nos factos reais  da   maior   fraude    portuguesa  do século.   A  realidade   supera  sempre   a ficção.  Duvido que  John  Grisham  fosse capaz de imaginar a cena do juiz presidente do coletivo ter de fazer uma coleta para comprar no IKEA uma estante para arrumar o processo - que lhe foi negada pela DG da Justiça.


A galeria de personagens é estupenda. Ken Follet teria de nascer duas vezes para conseguir inventar um naipe tão rico, denso e variado. No protagonista, Oliveira e Costa, que por alguma razão era conhecido na sua terra (Esgueira) como Zeca Diabo, e que munido de um cartão laranja subiu na vida ao ponto de chegar a secretário de Estado.

Saído do Governo de Cavaco, na sequência de um perdão fiscal mais que suspeito a empresas de Aveiro (Cerâmica Campos, Caves Aliança), foi recompensado pelo seu amigo com uma vice-presidência do BEI, apesar de ter um inglês ainda mais rudimentar que o de Zezé Camarinha.

Amigo do seu amigo, Costa comprou, em 2001, um lote de ações da SLN (dona do BPN), a 2,4 euros cada, que revendeu com prejuízo (a um euro/ação) ao amigo algarvio (o Aníbal, não o Zezé) e à filha dele. Menos de dois anos depois, Cavaco e Patrícia venderam as ações com um lucro de 140% - ele ganhou 147 mil euros, ela 209 mil. Nada mau.

Quando o naufrágio foi evidente, Zeca Diabo teve a dignidade de ir ao fundo com o barco, aceitou fazer de único responsável pelas patifarias. Em recompensa pela imolação, foi libertado devido "ao seu estado de saúde e por se encontrar em carência económica".

O elenco de atores secundários também é muito atraente e diversificado. Por exemplo, Manel Joaquim (Dias Loureiro), o filho de comerciantes de Linhares da Beira que chegou a ministro, conselheiro de Estado e administrador-executivo do BPN, carreira em que fez fortuna ao ponto de poder comprar, por 2,5 milhões de euros, à viúva de Jorge Mello, uma mansão no Monte Estoril.

Temos também Vítor Constâncio que, apesar de usar óculos e ser o governador do Banco de Portugal, foi o último a ver a falcatrua, anos depois da Deloitte, Exame e Jornal de Negócios terem alertado para o assunto.

E ainda Scolari, que recebia 800 mil euros/ano, Figo (apenas 400 mil/ano) e Vale e Azevedo, que sacou dois milhões (passaram-lhe o cheque antes de verificarem as garantias), e tantas outras figuras do nosso Gotha que lucraram com um banco que tinha balcões em gasolineiras e ativos tão extravagantes como 80 Mirós e uma coleção de arte egípcia.

O enredo é fabuloso. Dava um filme indiano. Só espero que, na venda ao BIC, o Estado tenha tido o bom senso de reservar os direitos de adaptação ao cinema desta história, que estou certo será disputada por Hollywood e Bollywood. Sempre será algum dinheiro que entra para minorar o prejuízo de seis mil milhões.

[do JN]

2 comentários:

  1. Tantos actores, que se viesse uma revolução a sério eram todos fuzilados.
    Esta fraude, roubo , vigarice do século, é muito pior que a fraude do Alves dos Reis.
    Mas qual filmes Indianos ó da Máfia, este foi feito por pé rapados, a coberto de gente dita, de colarinhos brancos ou engomados como quiserem, eles sabiam o que estavam a fazer.
    Neste país, com políticos destes e com a justiça que temos, só dá filmes de Ladrões.

    O PORTO É GRANDE, VIVA O PORTO

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  2. Parabéns Jorge Fiel.
    Grande artigo.

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