05 janeiro, 2012

F.C.Porto / Lisboa





Por que chegamos à indigência social e económica do Norte? Situo no tempo o ano de 1995 - quando o Banco Português do Atlântico (BPA) foi entregue ao BCP, depois fundido e arrasado na sua matriz de instituição com centro de decisão no Norte.

O BPA era o braço da indústria e o seu centro de estudos um alforge de pensamento estratégico para as universidades e Poder Político. Quem tomou a decisão de o comprar e levar para Lisboa? Um homem do Porto na capital, Jardim Gonçalves.

Quando um grupo dos empresários, liderados por Belmiro de Azevedo, tentou fazer frente à aquisição hostil (OPA) do BCP, a coesão do grupo nortenho falhou e venceu a lógica do encaixe rápido. Poderia ter sido diferente? O que seria hoje da Sonae, Mota (Engil), Riopele, entre outros, se um importante motor financeiro como o BPA tivesse existido?
E Portugal seria diferente se o portuense Valente de Oliveira, o ministro do Planeamento e Ordenamento do Território, não tivesse fomentado, durante o cavaquismo, a teoria de Lisboa como "centro de difusão de riqueza" para o resto do país?
Outra circunstância histórica: a globalização fez entrar os produtos asiáticos a preços imbatíveis. Uma boa parte da geração dos "capitães da indústria" do Norte vendeu ou fechou as empresas. Muitos dos que conseguiram aguentar-se transferiram boa parte do capital ganho na indústria para os negócios financeiros (acções de bancos, por exemplo). Ora, o mundo financeiro é controlado na capital. O Norte financiou a explosão do lobby financeiro gerido a partir de Lisboa... Obviamente, reconstruir uma geração de exportadores fortes e com força política para ser ouvida pelo Governo demora décadas. Estamos a meio deste processo.

Outra questão central é a dos média. E, neste ponto, o cenário é de catástrofe. Ainda há bem poucos anos havia pelo menos três órgãos de comunicação com dimensão e capacidade de influenciar as decisões em Lisboa: o Público, que lentamente perdeu pessoas e meios e cujo futuro é incerto; a TSF, hoje muito mais reduzida no Norte do que já foi; e a RTP, a única televisão com uma grande Redacção no Norte.

O actual processo de privatização da RTP é o novo momento de desmantelamento do que resta de "televisão com força política" fora de Lisboa. Sem média fortes, sem políticos, universitários e comentadores em estúdio, sem programas e notícias pensados e emitidos doutro sítio que não da capital, o mundo português é o eixo Lisboa-Cascais. Curiosamente, os média no Porto têm ignorado olimpicamente a questão da provável dissolução da RTP no Norte como se isso até fosse positivo.

Por fim: a pior coisa que nos pode acontecer é fazer do F. C. Porto o líder do processo político de combate à macrocefalia lisboeta, por muito que se goste do clube (e eu gosto). O F. C. Porto não é uma instituição pública imitável. É uma "empresa" notável e quase global, de um líder absoluto, mas com uma capacidade de acção (e métodos) que não se compaginam com decisões democráticas.
Infelizmente, a frase "Lisboa a arder" e a dúbia posição do presidente do clube contribuíram para tribalizar a gestão do território, como se ela fosse futebolística. Portanto: se o país não esquece as ameaças separatistas de Pinto da Costa e não deixa o Porto (o Norte?) ser "livre", qual o passo seguinte? Só vejo o caminho da internacionalização da economia. Exactamente o que aos poucos se vai fazendo. O que dará novo fôlego político à região.
E a regionalização? Sou a favor da ideia de que "perto" se gere melhor do que "longe". Não é um João Jardim que apaga milhares de bons autarcas (e não, a única rotunda boa do país não é a do Marquês do Pombal...). Mas estou convencido de que só haverá regionalização se a medida for imposta já que Portugal é o único país da União Europeia não regionalizado. Ora... alguém conhece um dos membros da troika e o convence a meter isso na agenda? Só assim. Não vejo a maioria dos portugueses a querer deixar de depender do "Estado centralista" gerido a partir da capital. Está tudo escrito há muito pelo Eça de Queiroz.

2 comentários:

  1. Já tinha lido o artigo e se concordo, com o diagnóstico, tem partes em que acho que dá uma no cravo e outra na ferradura. No que diz respeito ao F.C.Porto e ao seu líder, por exemplo, mostra um complexo típico de alguns nortenhos, para quem PC não é exemplo a seguir - fica sempre bem na capital do império. Fala em poder absoluto, falta de democracia? Não, não há poder absoluto, há liderança, no F.C.Porto sabe-se quem manda, quem traça a estratégia, quem deve ou não deve aparecer a falar em nome do clube. Falta de democracia?! Como? Não cumpre o clube os estatutos, com prazos correctos para eleições e a todas as possibilidades para quem se quiser candidatar? Ameaças separatistas e Lisboa a arder?!
    Quem mais contribui para que se fale em separatismo e em Lisboa a arder - é apenas uma metáfora - senão aqueles para quem Portugal é Lisboa e o resto é paisagem? É, lamentavelmente, o F.C.Porto é a única instituição que luta, sem medo, contra o centralismo. Culpa de muitos, como é óbvio, nunca do F.C.Porto.
    Culpa daqueles que não assumem sem medo e sem complexos, deixam sempre uma espaço para agradar aos mesmos de sempre.
    Enfim...

    Abraço

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  2. Caro amigo,

    você nem me deu tempo para comentar o post, mas pode lê-lo já a seguir.

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