01 março, 2016

Economia do hermetismo



Descontando raras excepções, poucas são as pessoas dispostas a preferir pouco dinheiro e boa qualidade de vida, que ter dinheiro a mais, e uma qualidade de vida relativa. E a razão, explica-se bem. 

Em países como Portugal, onde o poder económico subjuga o equilibrio social, com salários cotados na lista dos mais baixos da Europa, é praticamente impossível usufruir de uma boa qualidade de vida. Isto, independentemente do estilo e gostos de cada um, dada a influência perniciosa da promoção consumista típica do liberalismo social.

Mesmo alguns excêntricos, como por exemplo, os hippies (já em vias de extinção), teriam muitas dificuldades para sustentar e educar uma família em Portugal. 

Optando  por viver de modo simples, e convencionalmente no meio da natureza, em roulotes ou cabanas, abdicando da roupagem contemporânea tradicional, da vida citadina, dos gastos por eles considerados surpérfluos, e até da própria higiene pessoal, poucos hippies teriam capacidade para resistir muito tempo às imposições culturais das maiorias regimentais. Bastaria a necessidade de educar os filhos, para os forçar a integrá-los em escolas com crianças e professores com hábitos diferentes, para tornar utópico e dispendioso essa opção de vida.  Em Portugal, só alguns estrangeiros priveligiados (alemães, americanos, ou escandinavos), com boas reformas, é que ainda se podem dar ao "luxo" de viver segundo esse padrão, com alguma qualidade de vida e poucos recursos, sendo que o "poucos recursos" de um alemão, ou de um nórdico, para um português, quer dizer, muitos recursos. 

Tudo isto, para enfatizar o realismo daí decorrente, a inutilidade dos discursos economicistas que nos impingem os media. Na política, a economia jamais ultrapassará o patamar teórico da importância, enquanto não souber contabilizar e provar, em números concretos, a relação causa-efeito da economia com a qualidade de vida dos cidadãos. Para ser levada a sério, essa avaliação deverá comportar obrigatoriamente  o acesso a todos os bens de consumo que esses mesmos media promovem, em benefíco próprio, para um público indiscriminado, como se a distribuição da riqueza fosse equitativa e tivesse uma relação directa com o estudo da produção/distribuição/consumo de bens e serviços (vulgo economia). 

Daí, me parecer inútil, por vezes ridícula, a discussão hermética das questões económicas, enquanto os especialistas na matéria não perceberem que na política, o interesse público é muito mais abrangente e heterogénio que um grupo restrito de economistas. Por isso, também, duvido que enquanto não houver capacidade para simplificar a utilidade da discussão da ciência económica na vida prática das pessoas, sem a enquadrar noutra modelo social, que não este onde vivemos, mais justo e transparente, dificilmente se aliciará o interesse popular pelas questões económicas, e apenas servirá para auto-realizar, mesmo que alucinadamente, os seus conselheiros.

Off topic:


Porto Canal: NOS interpõe providência cautelar contra a MEO

Em causa a suspensão, por parte da MEO, da distribuição do Porto Canal na operadora NOS

A NOS interpôs esta terça-feira uma providência cautelar contra a operadora MEO, no Tribunal da Comarca de Lisboa, no sentido de recuperar o direito de transmissão do Porto Canal. Se o Tribunal atender aos motivos invocados, dará seguimento à providência cautelar, que é uma ação provisória com "validade" de 30 dias, e a MEO será obrigada a libertar o sinal pelo menos durante um mês. Se até lá não houver acordo entre as partes, a NOS terá de avançar com uma ação definitiva contra a operadora concorrente, para fazer valer os direitos que a providência cautelar não acautela.

Recorde-se que a MEO suspendeu o acesso da NOS ao sinal do Porto Canal na última quinta-feira, justificando a decisão com a "ausência de contrapropostas concretas" para a distribuição do canal em causa. A decisão, de resto, foi inédita em Portugal, sendo a primeira vez que um operador suspendeu a emissão de um canal que é detentor dos direitos a outro operador sem que exista um acordo mútuo.


No mesmo sentido, O Porto Canal emitiu um comunicado em que afirmava que o contrato com a NOS havia caducado a 31 de dezembro de 2014, não tendo sido renovado automaticamente por vontade da operadora.

4 comentários:

  1. Grande texto caro Rui Valente. É por isso que enquanto os ignorantes continuam a falar de PIB (GDP), quem sabe já anda a falar de GPI (genuine progress indicator) há mais de 20 anos.

    Abaixo deixo um link com um pdf sobre o cálculo de GPI de um dos sítios onde vivi.

    Veja na página 9 por exemplo os 5 anéis económicos e na 19 as três bases do crescimento verdadeiro: economico, social e ambiental. Um país sem floresta, com lixo por todo lado e sem educação grátis e de qualidade tem um GPI baixíssimo. O PIB é uma coisa de ignorantes que os totós dos liberais inventaram para enganar os ignorantes. Mas eu quando vou a Portugal já nem discuto isso, é falar com "portas". Literalmente.

    https://www.google.no/url?sa=t&source=web&rct=j&url=http://anielski.com/wp-content/documents/Alberta%2520GPI%2520Blueprint.pdf&ved=0ahUKEwistMCMo6DLAhXjd5oKHWehBHoQFggbMAE&usg=AFQjCNEvGXjx-KslQoL1W0F2yrL68FpeCw&sig2=efeZw-wn_5T4UWdWNmOqxw

    Um abraço e bem haja.

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  2. Repare por exemplo na página 19, nos 3 pontos que medem o desenvolvimento de um país, há 48 medidas. O PIB é apenas uma entre 48 medidas.
    Cada um que tire as suas conclusões sobre esta sociedade bacoca, capitalista, individualista.

    Depois é só parolos do diário económico, JN, RTPs e que tais a discutir o PSI20, o 'Pibzito' português e europeu ("é pá hoje subiu 0,1%, ontem baixou 0,2% e tal), etc e tais.
    Enfim, é o que temos meu caro. E não vamos para muito longe, ninguém quer saber destas coisas.

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  3. Obrigado, Soren!

    Vou ler o que sugere, e depois direi alguma coisa.

    Um abraço

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  4. Soren,

    recolhi apenas este pedacinho de texto da página 9, que traduz em parte o n/ atraso em relação ao Canadá:

    «A palavra "economia" que vem do grego oikonomia, significa "gestão da casa"(oikos). A economia devia, portanto, preocupar-se com a qualidade de vida das famílias
    e para as famílias.
    Em princípio, os economistas deviam estar preocupados com a medição das condições do bem-estar das famílias de uma comunidade, ou nação, bem como das condições do ambiente natural que contribuiem para o bem-estar humano. Talvez a economia moderna esteja alheada das condições físicas e do bem-estar, e demasiado focada em valores monetários.»

    Isto, é demasiada areia para a camionta dos portugueses. Continuamos a sofrer do mal de sempre:andar sempre a reboque das ideias que outros já rejeitaram. Não sei, é se é propositado ou por pura ignorância.

    Mais uma vez, obrigado pelas dicas

    Um abraço

    PS-A propósito, onde está agora? Pode responder-me à vontade que respeitarei a s/ privacidade.

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