Germano Silva |
A história é conhecida, mas vale a pena relembrá-la. Camilo Castelo Branco conheceu Ana Plácido, a sua “paixão fatal”, por 1850, aqui no Porto
"Era num baile. Ondulava / d’ouro e sedas o salão…” Ela, “ beleza de Rubens, colo de jaspe, talhe de haste flexível que o mais leve sopro derruba “ tinha, então, dezassete anos e estava noiva de Manuel Pinheiro Alves, um homem bastante mais velho, quadragenário, rico comerciante da rua do Almada.
O casamento realizou-se em setembro daquele ano. Durante nove anos Ana Plácido, culta, romântica, idealista, resistiu ao fogo da paixão. Mas em 1859 deu o passo fatal: abandonou o marido e foi refugiar-se nos braços de Camilo levando com ela o único filho ainda pequeno.
O resto é por demais sabido: um ano depois de ter abandonado o lar conjugal (26 de março de 1860) Ana Plácido foi presa na Cadeia da Relação do Porto, onde Camilo também daria entrada, uns meses depois (5 de maio), acusados, ambos, do crime de adultério.
O caso subiu a tribunal onde veio a ser julgado pelo juiz José Maria de Almeida Teixeira de Queirós, pai do nosso grande Eça de Queirós que, no princípio não quis intervir no caso, “ por razões de consciência”, mas acabou por presidir ao julgamento de que os réus saíram absolvidos.
Três anos mais tarde (15 de julho de 1863) Pinheiro Alves estava às portas da morte. Vivia, então, hospedado num hotel de Vila Nova de Famalicão. Pediu que lhe levassem um confessor ao leito da morte. A ordem foi cumprida e lá compareceu o padre para assistir aos últimos momentos do moribundo. Confessou-se e no final o sacerdote advertiu-o de que só lhe podia dar a absolvição se ele perdoasse quantos o haviam ofendido.
Ofegante, Pinheiro Alves condescendeu. Que sim, que perdoava a todos, incluindo à mulher adúltera, “ exceto àquele homem…” – frisou. Aquele homem era Camilo. O sacerdote insistiu: Tem que perdoar a todos senão… Resposta pronta do moribundo: “ A esse não perdoo…” Então não o absolvo”, tornou o confessor. “ Irei para o inferno, retorquiu Pinheiro Alves, mas não perdoo…” E não perdoou.
Coisa curiosa. No dia e à hora a que Pinheiro Alves expirava, no silêncio de um modesto quarto de um hotel de Famalicão, Camilo, recostado no leito de um hospital de Lisboa, onde fora procurar solução para os seus muitos achaques, lia um romance. A Alberto Pimentel, um dos seus biógrafos, contou mais tarde que, exatamente à hora em que Pinheiro Salves morria, sentiu, de repente, “ um aperto misterioso e inexplicável nos gorgomilos, como se uma hercúlea mão invisível o estivesse a estrangular.” Ele há coincidências…
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