Pinto da Costa absolvido do crime de ofensa de pessoa colectiva
Corrupção (II)
Na crónica que aqui escrevi em 22 de Maio do ano passado abordei o problema da corrupção em Portugal. Analisei então as suas nefastas consequências para a economia e para o desenvolvimento, já que ela distorce as regras da concorrência, promovendo não as melhores empresas mas sim as que proporcionam vantagens aos decisores públicos. A aquisição de bens e serviços pelo estado (em sentido amplo) bem como a adjudicação de obras públicas são os sectores onde a corrupção mais se entranhou sem que se tenha logrado combatê-la com sucesso.
Há,
porém, um domínio da soberania nacional em que a corrupção se instalou
de forma quase endémica mas da qual poucos falam. Refiro-me aos
tribunais, onde o problema atingiu proporções devastadoras para a
credibilidade da justiça e do estado de direito democrático. Não se
trata de um fenómeno igual ao que ocorre na administração pública
(central e local), na instância política ou nas empresas ou institutos
públicos, onde a corrupção se deve sobretudo às vantagens patrimoniais
directas que proporciona aos decisores ou a terceiros, como familiares,
partidos políticos ou clubes de futebol. A corrupção que se instalou nos
nossos tribunais é sobretudo uma corrupção moral resultante do facto de
a justiça ter sido apropriada pelos magistrados e ser usada ao sabor
dos seus interesses corporativos ou mesmo dos seus caprichos pessoais.
Nem só o dinheiro corrompe. O poder também corrompe, por vezes, muito mais do que o dinheiro. E - como é, desde há muito, consabido - o poder absoluto corrompe absolutamente. Ora, o que se passa nos nossos tribunais é, precisamente, isso - a corrupção das consciências de muitos magistrados devido ao poder ilimitado que detêm e que exercem sem qualquer escrutínio democrático ou cívico. Eles escolhem-se uns aos outros, avaliam-se uns aos outros (quase sempre com a nota máxima), julgam-se uns aos outros e absolvem-se (ou exculpam-se) uns aos outros com uma impunidade que choca flagrantemente com o fundamentalismo justiceiro com que julgam os restantes cidadãos. E, quase sempre, com ostensiva pesporrência perante o escândalo causado na sociedade.
É claro que também há casos de magistrados apanhados nas teias da corrupção típica, ou seja, por dinheiro em troca de decisões. Mas esses casos são pontuais e não fazem a primavera nem se devem confundir com a floresta. Já a forma como foram absolvidos ou exculpados é um sintoma escandaloso da referida corrupção moral. Senão, o que devemos pensar quando uma pessoa é condenada num processo porque se provou que entregou dinheiro a um juiz em troca de uma decisão e o juiz em causa é absolvido porque noutro processo não se provou que (ou se provou que não) recebera o dinheiro? Das duas uma: ou nenhum era condenado ou eram ambos. E o que pensar quando magistrados, contra as leis e pareceres dos maiores mestres de direito, decidem isentar de impostos parte significativa das suas próprias remunerações? E o que pensar também quando familiares de magistrados assassinam a sangue frio pessoas indefesas e não vão para a cadeia como iria qualquer outro criminoso? E o que pensar ainda quando tribunais superiores rejeitam recursos bem feitos com a justificação de que têm conclusões a mais e - escreveram-no - conclusões a mais equivalem à ausência de conclusões?
Quer a corrupção propriamente dita quer a corrupção moral derivam da mesma degenerescência do estado de direito e medram devido à mesma anomia da sociedade democrática. As pessoas têm medo de denunciar publicamente o que se passa nos tribunais, porque sabem que sofrerão retaliações, como já aconteceu, inclusive, com magistrados que tiveram a audácia de falar em corrupção na justiça. Em Portugal, qualquer pessoa que se queixe de um juiz ao Conselho Superior da Magistratura corre sérios riscos de vir a ser perseguido criminalmente pelo visado e condenado pelos seus colegas. É (também) por isso que é tão difícil combater a corrupção.
NOTA: Dedico esta crónica aos magistrados incorruptíveis, sobretudo aos juízes honestos, que, anonimamente, um pouco por todo o país, contra ventos e marés, persistem em administrar a justiça vinculados apenas ao Direito.
Imagine agora o leitor que esse alguém é um político que obteve o seu voto jurando-lhe repetidamente que faria determinadas coisas e nunca, nunca!, faria outras ("Dizer que o PSD quer acabar com o 13º mês é um disparate"; "Do nosso lado não contem com mais impostos"; "O IVA, já o referi, não é para subir").
Um político que lhe jurou que "ninguém nos verá impor sacrifícios aos que mais precisam" e que fez o que a própria CE já reconheceu, que em Portugal as medidas de austeridade estão a exigir aos pobres um esforço financeiro (6%) superior ao que é pedido aos ricos (3%, metade).
Um político que lhe garantiu que "não quero ser eleito para dar emprego aos amigos; quero libertar o Estado e a sociedade civil dos poderes partidários" e cujos amigos aparecem, como que por milagre, com empregos de dezenas e centenas de milhares de euros na EDP, na CGD, na Águas de Portugal, nas direcções hospitalares e em tudo o que é empresa ou instituto público.
Quando os eleitos actuam impunemente à margem de valores elementares da sociedade como o da honra e o do respeito pela palavra dada não é só o seu carácter moral que está em causa mas a própria credibilidade do sistema democrático.
Nota do RoP :
Resolvi juntar no mesmo post estas duas crónicas por duas distintas razões. Uma, é porque ambos os artigos denunciam, sem rodeios, o estado putrefacto, hipócrita e altamente perigoso da sociedade portuguesa política e judicial da actualidade. A outra, porque parecendo ter tanta coisa em comum, me causa estranheza ver estes dois cronistas crispados um com o outro, por qualquer coisa que ainda não consegui perceber, mas que me parece não ter passado de um momento infeliz ou de uma interpretação exacerbada de algo que um escreveu sobre o outro.
Não sei porquê, mas eram mais úteis e ficavam melhor do mesmo lado da barreira... É por estas e outras, que os políticos fazem o que querem. Temos mais prazer em nos abespinharmos com futilidades, do que vontade de nos unirmos em torno de causas sérias.
Nem só o dinheiro corrompe. O poder também corrompe, por vezes, muito mais do que o dinheiro. E - como é, desde há muito, consabido - o poder absoluto corrompe absolutamente. Ora, o que se passa nos nossos tribunais é, precisamente, isso - a corrupção das consciências de muitos magistrados devido ao poder ilimitado que detêm e que exercem sem qualquer escrutínio democrático ou cívico. Eles escolhem-se uns aos outros, avaliam-se uns aos outros (quase sempre com a nota máxima), julgam-se uns aos outros e absolvem-se (ou exculpam-se) uns aos outros com uma impunidade que choca flagrantemente com o fundamentalismo justiceiro com que julgam os restantes cidadãos. E, quase sempre, com ostensiva pesporrência perante o escândalo causado na sociedade.
É claro que também há casos de magistrados apanhados nas teias da corrupção típica, ou seja, por dinheiro em troca de decisões. Mas esses casos são pontuais e não fazem a primavera nem se devem confundir com a floresta. Já a forma como foram absolvidos ou exculpados é um sintoma escandaloso da referida corrupção moral. Senão, o que devemos pensar quando uma pessoa é condenada num processo porque se provou que entregou dinheiro a um juiz em troca de uma decisão e o juiz em causa é absolvido porque noutro processo não se provou que (ou se provou que não) recebera o dinheiro? Das duas uma: ou nenhum era condenado ou eram ambos. E o que pensar quando magistrados, contra as leis e pareceres dos maiores mestres de direito, decidem isentar de impostos parte significativa das suas próprias remunerações? E o que pensar também quando familiares de magistrados assassinam a sangue frio pessoas indefesas e não vão para a cadeia como iria qualquer outro criminoso? E o que pensar ainda quando tribunais superiores rejeitam recursos bem feitos com a justificação de que têm conclusões a mais e - escreveram-no - conclusões a mais equivalem à ausência de conclusões?
Quer a corrupção propriamente dita quer a corrupção moral derivam da mesma degenerescência do estado de direito e medram devido à mesma anomia da sociedade democrática. As pessoas têm medo de denunciar publicamente o que se passa nos tribunais, porque sabem que sofrerão retaliações, como já aconteceu, inclusive, com magistrados que tiveram a audácia de falar em corrupção na justiça. Em Portugal, qualquer pessoa que se queixe de um juiz ao Conselho Superior da Magistratura corre sérios riscos de vir a ser perseguido criminalmente pelo visado e condenado pelos seus colegas. É (também) por isso que é tão difícil combater a corrupção.
NOTA: Dedico esta crónica aos magistrados incorruptíveis, sobretudo aos juízes honestos, que, anonimamente, um pouco por todo o país, contra ventos e marés, persistem em administrar a justiça vinculados apenas ao Direito.
A honra perdida da política
Que
pensaria um cidadão comum se alguém em quem tivesse confiado e com quem
tivesse feito um acordo, apanhando-se com o acordo na mão, violasse
todos os compromissos assumidos fazendo exactamente o contrário daquilo a
que se comprometera?
Imagine agora o leitor que esse alguém é um político que obteve o seu voto jurando-lhe repetidamente que faria determinadas coisas e nunca, nunca!, faria outras ("Dizer que o PSD quer acabar com o 13º mês é um disparate"; "Do nosso lado não contem com mais impostos"; "O IVA, já o referi, não é para subir").
Um político que lhe jurou que "ninguém nos verá impor sacrifícios aos que mais precisam" e que fez o que a própria CE já reconheceu, que em Portugal as medidas de austeridade estão a exigir aos pobres um esforço financeiro (6%) superior ao que é pedido aos ricos (3%, metade).
Um político que lhe garantiu que "não quero ser eleito para dar emprego aos amigos; quero libertar o Estado e a sociedade civil dos poderes partidários" e cujos amigos aparecem, como que por milagre, com empregos de dezenas e centenas de milhares de euros na EDP, na CGD, na Águas de Portugal, nas direcções hospitalares e em tudo o que é empresa ou instituto público.
Quando os eleitos actuam impunemente à margem de valores elementares da sociedade como o da honra e o do respeito pela palavra dada não é só o seu carácter moral que está em causa mas a própria credibilidade do sistema democrático.
Nota do RoP :
Resolvi juntar no mesmo post estas duas crónicas por duas distintas razões. Uma, é porque ambos os artigos denunciam, sem rodeios, o estado putrefacto, hipócrita e altamente perigoso da sociedade portuguesa política e judicial da actualidade. A outra, porque parecendo ter tanta coisa em comum, me causa estranheza ver estes dois cronistas crispados um com o outro, por qualquer coisa que ainda não consegui perceber, mas que me parece não ter passado de um momento infeliz ou de uma interpretação exacerbada de algo que um escreveu sobre o outro.
Não sei porquê, mas eram mais úteis e ficavam melhor do mesmo lado da barreira... É por estas e outras, que os políticos fazem o que querem. Temos mais prazer em nos abespinharmos com futilidades, do que vontade de nos unirmos em torno de causas sérias.
Dois artigos de duas personalidades importantes do nosso jardim à beira-mar plantado, que retratam fielmente a conjuntura política actual!
ResponderEliminarPois é!
ResponderEliminarPor causa das pessoas andarem de costas voltadas umas para as outras, é que estes gajos continuam no governo, a mentir descaradamente,alguém tem feito o trabalho de casa,dividir para reinar,pondo trabalhadores dos privados contra os funcionários públicos etc.,etc.,enquanto as pessoas não se concentrarem no inimigo,vão continuar a disparar em todas as direcções,e com isso gastam todas as energias em guerras fúteis,e eles do cimo do seu pedestal vão continuando o saque aos nossos direitos,conseguidos com tantas lutas e ao fim de tantos anos.Se continuarmos assim, em poucos meses
não teremos nada,voltamos ao tempo em que eu nasci,que para ir ao médico, o meu pai tinha que pedir vinte escudos emprestados.Abaixo estes politicos aldrabões e quem os continua a apoiar!
Um abraço
Manuel Moutinho
Começando pela absolvição de Pinto da Costa, convém lembrar a quem não se der ao trabalho de ler o artigo, que vão 5-0 frente ao Ministério Público.
ResponderEliminarMarinho e Pinto fala do que sabe e fala bem, denunciando casos que nos deixam com os cabelos em pé. Que nunca se canse, é o que desejo.
O artigo de Manuel António Pina fala das promessas não cumpridas. Dando de barato que os políticos não deviam mentir, mas todos mentem, ninguém mentiu tanto como o Passos.
Ontem coloquei no Facebook a seguinte frase:
"Quando pensavamos que depois de Sócrates já não podia haver pior, alguém tirou um coelho da cartola..."
Neste país que não é para velhos, coitados dos que não são políticos...
Abraço