21 agosto, 2014

A justiça popular versus quaresmismo

É um facto que nem sempre se confirma a tão afamada sabedoria popular. Só de vez em quando mesmo.  Talvez por isso, nunca fui grande simpatizante de grandes concentrações de massas. A única que tolero é no futebol para ver o FCPorto jogar, e no Dragão, por amor ao clube. 

Ainda ontem fiquei completamente siderado com a reacção do povo de Carrazeda de Anciães à detenção de um pastor por suspeita de esfaquear duas mulheres provocando a morte a uma delas. Declarações do género: "ele não fez mal a ninguém e tem muita gente aqui a apoiá-lo". Ou, "ele não se metia com ninguém, era muito calmo", como se só as pessoas nervosas fossem capazes de um acto de loucura ou as calmas tivessem, à priori, um lugar reservado no céu.

A subjectividade a que as emoções muitas vezes conduzem justificariam a frieza da Justiça se ela fosse, como diz o ditado, cega. O drama é que a Justiça vê e olha demais para o estatuto dos julgados, e é a partir daí que muitos preferem fazê-la pelas próprias mãos. Não sei se terá sido o caso. Seja como for, ninguém de bom senso devia apoiar um assassino excepto possuindo provas claras da sua inocência, e por aquilo que ouvi do povo ninguém parecia saber ao certo o que terá gerado a tragédia.

Tenho portanto dificuldade em entender tanto a atitude do criminoso como a do povo que o apoia. Não creio que o que aquelas duas vítimas fizeram ao pastor (se é que fizeram), tenha sido mais grave que os crimes colossais e recorrentes que os governantes do passado recente e da actualidade têm cometido com os portugueses, jovens e reformados, retirando-lhes o direito ao emprego (não disse trabalho propositadamente, porque aqui trabalha-se práticamente de borla) e saquendo-lhes as reformas, e contudo ainda ninguém se lembrou de lhes dar um tiro... (merecido, acharia eu). A "coragem" do povo apenas se faz notar nas causas "domésticas", de proximidade, mas encolhe-se nas verdadeiramente importantes.

Não posso deixar de fazer uma analogia entre estas reacções emocionais com a postura de certos jornalistas e de alguns adeptos portistas, com o estatuto de intocável de Ricardo Quaresma no plantel do FCPorto. Tal como querer o sol na eira e a chuva no nabal são uma utopia, há quem acredite na possibilidade de existir um treinador líder abdicando da sua autoridade em prol de um jogador "intocável" e ao mesmo tempo controlar toda uma equipa. Impossível. Um líder não pode ser pressionável. Se o fôr, é porque não é líder.

Se Ricardo Quaresma for inteligente, se souber aproveitar a oportunidade que o FCPorto lhe deu para se impor como jogador e sobretudo como homem, o benefício será de todos. Em primeiro lugar dele próprio que se revalorizará  se jogar mais para equipa, e depois para o clube e os adeptos. Agora, se não o fizer, se entender continuar no caminho caprichoso do individualismo inconsequente e se deixar fintar pelas perguntas armadilhadas dos pasquineiros, estará a dar um tiro nos pés e a deixar a imagem de um jogador eternamente inacabado. Por sua culpa exclusiva.

Por todas estas razões, espero que o actual treinador Julen Lopetegui não abdique nunca de lierar. É ele o treinador, quem não estiver disposto a aceitar as suas decisões, só tem um caminho: a porta de saída. Mas não é isso que eu desejo. Quero um Quaresma que entenda que o futebol não é o ténis, o futebol é jogado com 11 jogadores contra outros 11 adversários, por isso se chamam equipas. Se assim fôr todos terão a ganhar, inclusivé o Quaresma. Além de que aceitar os factos pela ordem correcta da hierarquia é também um sinal de inteligência...
    

2 comentários:

  1. É caso para dizer, correto afirmativo. É um mundo de hipocrisia de insinuações da treta de respostas fáceis de gente que fala muito com coração e pouco com a cabeça.

    Abílio Costa.

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