08 junho, 2010

Nós e os outros

Nós, portugueses, temos um pouco a mania de fazer coisas porque "lá fora faz-se assim". Isto não é bem uma crítica, pois acho bem que não tentemos inventar a roda se outros já o fizeram. Acontece é que, com a falta de rigor de que padecemos (somos o povo do "mais ou menos") não tomamos em consideração as circunstâncias e particularidades que rodeiam o que pretendemos copiar "lá de fora".

Hoje em dia fala-se muito da Grécia, da similitude -ou não- dos seus problemas económicos com os nossos, e das soluções que eles pensam adoptar. É assim que já vi referido que, porque eles pensam em reduzir o número de municípios, nós deveríamos fazer o mesmo em Portugal, como medida de contenção de despesas.

Estamos a falar de duas situações muito diferentes,embora as populações sejam semelhantes e as áreas não façam uma grande diferença. A verdade é que a organização administrativa grega é bastante pesada. Têm 13 Regiões, mas entre estas e os municípios e as comunidades (que são municípios mais pequenos mas com a mesma autonomia) existem os nomos ,que são 57 e têm um determinado grau de autonomia administrativa. Até 1997 havia quase 6000(!) municípios e comunidades. Nesse ano fizeram fusões de muitos deles,e hoje são pouco mais de mil. Mesmo assim há cerca de 90 com menos de 1000 habitantes, ocorrendo mesmo a excentricidade de existir uma comunidade com 28 habitantes, e outra com uma área inferior a 1 km2. Por tudo isto se compreende que a Grécia pense eventualmente em reduzir ainda mais o número das suas unidades administrativas.

Penso que nós em Portugal temos uma problemática diferente, mas é indiscutível a necessidade de uma enorme reforma do mapa administrativo. Desde logo por, no mínimo, três motivos : não temos Regiões instituidas, temos Distritos que hoje não significam rigorosamente nada, e temos um mapa municipal que data dos meados do século XIX, quando a realidade demográfica era bem diferente da actual.

Isto para não falar das 4257 freguesias, o que à primeira vista parece um número excessivo , talvez passível de redução. Esta no entanto é uma questão de uma susceptibilidade imensa. Eliminar ou fundir freguesias num meio urbano, é uma coisa e não mexerá muito com as pessoas envolvidas. Fazê-lo num meio rural é completamente diferente, porque a freguesia tem um significado profundo para os seus habitantes. Está mais que provado que os burocratas do Terreiro do Paço não têm conhecimento, nem sensibilidade nem sequer humildade para fazer uma reforma destas. Será predominante a sua prepotência que os levará a não ouvir as populações envolvidas e a ignorar os seus argumentos e sugestões que por ventura cheguem aos seus ouvidos. Isto será particularmente verdade no Norte, como é habitual. Esta reforma das freguesias, a fazer-se, tem de ser comandada a partir das respectivas Regiões, porque só estas têm a sensibilidade que evitará ou minimizará grandes problemas humanos.

3 comentários:

  1. «Eliminar ou fundir freguesias num meio urbano, é uma coisa e não mexerá muito com as pessoas envolvidas.» Meu caro Farinas, não concordo nada, acho que mexe e muito. As pessoas estão habituadas à proximidade, a ir à junta tratar dos problemas, resolver problemas junto de pessoas que conhecem, nalguns casos desde sempre. Se lhes alterassem isso não iam gostar, iam reagir e muito, muito mais que no caso das Câmaras. Falo por experiência própria e no caso, freguesias do grande Porto.

    Um abraço

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  2. Se calhar até tem razão, meu caro amigo, mas penso que será pior nas freguesias rurais, longe dos grandes centros, onde acredito que seja maior o amor à "sua" freguesia, e onde às vezes há até rivalidades ancestrais entre freguesias vizinhas.Seja como for, acho que mexer nisso é mexer num vespeiro. Um abraço.

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  3. As reformas [as más, e também as boas] provocam sempre descontentamento a alguém.É incontornável. Há quem viva bem com aquilo que está feito, mesmo que seja ineficiente para a realidade actual do país. É o eterno problema: «o país, sou eu».

    Perguntem aos Ministros,aos adjuntos e aos secretários de estado se querem sair do poleiro, e eles dão-vos a resposta.

    Quanto ao hábito dos portugueses dizerem "lá fora também se faz assim", é um vício antigo, usado mais por governantes e empresários, normalmente para justificar as piores decisões. Já não usam esse discurso quando é para benefício do povo. Os salários e outras regalias, por exemplo...

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Abrimos portas à frontalidade, mas restringimos sem demagogia, o insulto e a provocação. Democraticamente...