Se há palavra hoje abastardada é a palavra "coragem". De um eleito que
faz o contrário do que prometeu dizem os apaniguados que é "corajoso",
apesar de um dos sinónimos mais nobres de "coragem" ser "constância"; o
mesmo ou outro eleito conformam servilmente e obedientemente as suas
politicas a ditames externos, e isso é "coragem" e não cobardia; medidas
de austeridade impostas aos mais pobres e vulneráveis são "corajosas"; o
destempero de uma velha política, agora dita "senadora", contra o
direito à saúde dos mais idosos é um "acto de coragem"; um presidente
titubeante que assina, sem pestanejar, o que lhe põem à frente e tolera a
subversão de valores e direitos que jurou defender é, também ele,
"corajoso".
"Coragem" chegou ao português vindo do francês"courage" que, por sua vez, deriva de "coeur", "coração", em cujas cavernas habitam, na generalidade das culturas, não só a inteligência e a sabedoria como a própria divindade, além de "disposições interiores" como a constância, o ânimo ou a rectidão, em oposição ao que é traição, pusilanimidade e fraqueza e pequenez de carácter .
Assim, "corajosos" são hoje os que, humilhados e ofendidos, sobrevivem sem ceder à tentação da servidão; os que não traem por um prato de lentilhas ou uma assessoria; e todos aqueles (jornalistas, magistrados, funcionários, cidadãos em geral) que, em tempos de debandada moral, teimam, apesar de tudo, em manter-se inteiros.
Nota de RoP:
Se o leitor é pessoa bem formada, e livre de amarras partidárias, diga lá se o que Manuel António Pina aqui escreve sobre a ideia que os políticos hoje têm da "coragem", não é exactamente assim. Eles invertem e pervertem tudo, o carácter dos Homens e das palavras! Como é possível haver quem vote nesta gente e queira com ela mudar o país? Como?
Ao fim de, algumas eleições, jurei para mim mesmo que nunca mais na vida irei votar em alguém, o meu voto passará a ser eternamente livre, votarei em branco ou nulo para todo o sempre...chega de vilipendiagem!
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