Apreciei a candura com que o secretário de Estado dos Transportes nos informou que afinal vai conseguir financiar a terceira travessia do Tejo aproveitando os dinheiros comunitários poupados com o adiamento para as calendas das duas linhas do TGV que ligariam o Porto a Vigo e Lisboa, e assim coseriam a segunda maior metrópole europeia (a seguir à Grande Londres), ao aproximar uma comunidade de nove milhões de pessoas que vivem a trabalham no eixo atlântico Corunha-Setúbal.
Como portuense senti-me apalpado pela simplicidade desarmante com que esse secretário (um tal Correia da Fonseca) expôs a questão, mas isso não é mau pois fez-me logo lembrar a anedota da mulher que ao aperceber-se que estava a ser ludibriada se virou para o homem que a estava a tramar e disse: “Apalpa-me as mamas!” - antes de desfazer o espanto dele, e de todos os outros participantes na reunião, ao esclarecer: “É que eu gosto que me apalpem as mamas quando me estão a foder...”
Terça à noite, o primeiro ministro foi à RTP tentar convencer-nos de que está inocente e que a culpa do actual cortejo de horrores é do resto do mundo e da conjuntura que mudou radicalmente nas últimas três semanas. Como sou hipertenso, para não me enervar, a partir de determinada altura deixei de o ouvir e distraí-me com o azul da gravata (bem bonita), o branco dos cabelos (tão excessivo que desconfio ser pintado...) e a curiosa forma do seu longo nariz, uma tentação que convida os cartoonistas a caricaturarem-no como Pinóquio.
Lamentavelmente o drama não está nas três últimas semanas. A culpa de uma década de estagnação, da maior recessão desde o 25 de Abril, do recorde do desemprego, da maior carga fiscal de sempre, não pode ser atirada para as costas largas dos tubarões especuladores que atacaram a nossa divida porque Portugal lhes cheirava a sangue. Quando uma ponte cai ninguém no seu perfeito juízo atribui a responsabilidade ao último camião que lá passou - mas sim aos engenheiros que a projectaram e aos empreiteiros que a construíram.
Um parágrafo de um relatório da União Europeia sobre o impacto dos fundos comunitários na última década, chega para passar um atestado de incompetência aos engenheiros e empreiteiros (Guterres, Durão e Sócrates) que projectaram e construíram o modelo centralista e falido de governo em que sobrevivemos:
“Portugal foi o país que mais verbas recebeu em peso no PIB e mais beneficiou desses fundos. Mas foi o país que menos cresceu e onde as disparidades regionais aumentaram mais”.
Se escrevessem isto sobre mim, eu cobria a cara com vergonha, fazia as malas e mudava de profissão.
Jorge Fiel
Esta crónica foi hoje publicada no Diário de Notícias
Nota do RoP:
Este post foi copiado do blogue Bússola.
É o problema do eleitoralismo já referido por mim.
ResponderEliminarOs partidos da direita juntamente com o PS (esquerda só no programa eleitoral)que faz uma política de centro direita são essencialmente eleitoralistas. A preocupação dos dirigentes destes partidos não é resolver os problemas das assimetrias do País, mas a manutenção dos seus tachos e da demais clientela.
É no distrito de Lisboa que vive a maior parte da população portuguesa e onde por conseguinte se decidem as eleições. Por isso o frenesim dos políticos em só prestarem atenção à Capital.