Confesso nunca ter lido a Constituição Portuguesa, mas julgo saber que nela está consignado que os deputados à Assembleia da República são deputados "nacionais" o que de certa maneira os obriga a "despir" as suas proveniências distritais. A situação parece-me estranha porque leva a perguntar o que então diferencia dois deputados do mesmo partido, eleitos por exemplo, um pelo Porto e o outro por Évora. Acresce ainda que, na hora da votação, todo e qualquer deputado tem de votar não com os interesses do seu distrito, mas sim com as instruções do seu partido. Deputado que assim não proceda, que coloque o interesse do seu distrito ou município à frente do chamado interesse nacional, pode ficar seguro que perde o "emprego". O chamado caso do "queijo limiano" está de certo presente na memória de todos.
E a situação é ainda mais estranha, diria mesmo escandalosa, quando se pensa nos deputados chamados "paraquedistas". A que propósito, por exemplo, um autarca de Almodovar aparece actualmente como deputado pelo Porto? Creio que nem mesmo a adopção dos círculos uninominais, por muito que pareça ser um modelo mais razoável, irá modificar essa situação. E a situação é que, na realidade, existe um sistema de bloqueio das vontades e interesses da grande maioria do país, criado pelo Poder Centralista a fim de continuar a conservar o poder total, assemelhando-se deste modo a uma ditadura sob a capa de uma democracia.
Penso que um sistema de obviar a esta ambiguidade da posição dos deputados - nacionais ou distritais? - passaria pela criação de partidos ditos regionais, mas estes partidos são practicamente proibidos pela Constituição.
Se, na época em que a Assembleia Constituinte funcionou, se compreendia a preocupação de evitar a criação indiscriminada de partidos políticos, hoje este argumento carece de qualquer valor. É tão sómente mais um artifício a assegurar a manutenção do tal poder central. A existência de um partido com deputados eleitos e portanto com a capacidade de, através de alianças pontuais com o Parlamento, e tendo como base os interesses dos seus eleitores, poder quebrar a hegemonia dos partidos tradicionais, deve dar pesadelos ao Terreiro do Paço.
Acredito que esta solução funcionaria, ainda por cima com a vantagem de termos num país aqui ao lado, uma experência vitoriosa onde se poderia aprender. Imagino que nos seus primeiros tempos, os membros do BNG( Bloco Nacionalista Galego) foram olhados como uma rapaziada excêntrica e sonhadora. Persistiram, lutaram, foram convincentes perante os eleitores: hoje governam a Galiza. Algo semenhante poderá estar a acontecer na Andaluzia.
Poderá alguém dizer que em Espanha é diferente, na medida em que existem as Regiões e as eleições são portanto efectuadas num âmbito regional limitado. É diferente mas não é, porque o ponto crucial é que os deputados regionais têm de estar no local onde se tomam decisões que interessam às populações que representam. Se esse local é na capital do país, como acontece conosco, eles têm de estar em Lisboa na Assembleia da República. Se houver Regiões e o centro decisório estiver numa Assembleia Regional, então será nesta que os deputados dos partidos regionais devem estar.
Desbloquear a proibição constitucional da existência de partidos regionais seria, em minha opinião, um importante primeiro passo na direcção certa.
Fico a aguardar com muito interesse e curiosidade, se o PSD de Luis Filipe Menezes irá incluir esta medida no prometido projecto de redacção de uma nova Constituição Portuguesa.
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A cegueira dos governantes é tão grande que, com esta política aberrante e contínua de concentração do poder na capital, estão exactamente a gerar as condições ideais para futuras manisfestações extremistas. As de natureza independentista, são só uma delas. Mas só eles, é que parece não compreenderem o fenómeno que andam a fabricar.
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