22 junho, 2009

O manifesto dos vinte e oito

O manifesto publicado por perto de 30 conceituados economistas, em que dizem ao governo para "parar e pensar" no que diz respeito às obras faraónicas (é o termo exacto!) que pretendem implementar de imediato, é um documento da maior importância. Não é somente por demostrar o enorme erro económico constituído pelo tipo e pelo timing dos investimentos previstos. Penso que não é necessário dominar as teorias económicas para compreender. O chamado homem vulgar, com doses medianas de inteligência e de bom senso, é forçosamente sensível à racionalidade dos argumentos apresentados pelos signatários.

Penso que há um aspecto que o grupo dos 28 não censura, o que provavelmente até seria descabido em função da finalidade do documento. Trata-se da verificação de que talvez 80% do investimento total ( não disponho de números precisos, limito-me a dar um "palpite" intuitivo) seria direccionado para Lisboa: TGV até ao Caia, terceira travessia do Tejo, novo aeroporto de Lisboa. Mais uma achega para o desequilíbrio que fará aumentar o fosso entre Lisboa e o resto do país. Para o Norte sobraria a ligação em alta velocidade Porto-Valença. O troço ferroviária Porto-Lisboa seria de interesse mútuo. Claro que estamos, aqui no Norte, habituados a sermos preteridos, mas essa não é razão para deixarmos passar em claro todas as decisões centralizadoras que nos prejudicam. Por isso faço questão de sublinhar este aspecto.

O outro motivo que me faz pensar que o documento dos 28 é importante, é o facto de não estarmos habituados em Portugal a que sejam expressas opiniões de conjuntos de individualidades, a menos que no âmbito de associações profissionais ou institucionais. Estes subscritores provêm de diferentes quadrantes políticos e geográficos, e no entanto abdicaram do habitual individualismo nacional, decidindo trabalhar numa declaração conjunta, o que lhe confere mais força do que o símples somatório de intervenções individuais desgarradas. Gostaria que este espirito gregário se manifestasse em relação so problemas do Norte, permitindo públicas posições conjuntas de gente relevante, que alertassem e esclarecessem os inúmeros indiferentes /comodistas da nossa terra em relação aos incontáveis problemas que condicionam os tempos presentes, e que apontassem soluções possíveis.

O manifesto dos 28 tem uma referência à rede viária nacional que julgo merecer um comentário. Proponho-me fazê-lo em próximo post.

5 comentários:

  1. Desculpe Rui, mas não resisti.

    Cantiga do Monte

    Fragância morena
    Portal de marfim
    Ondina açucena
    Chamando por mim,

    Cantiga do monte
    Clareira do ar
    Dançando na nuvem
    Mudando em mar,

    Na flor da montanha
    Na espuma a cair
    Nos frutos de Agosto
    Na boca a sorrir,

    Na crista da vaga
    Tormento alonguei
    No vento e na fraga
    Só luto encontrei,

    Abriram-se as velas
    Mal rompe a manhã
    Na luz e nas trevas
    Foi-se a louçã,

    Ai húmida prata
    Meu sonho sem ver
    Ai noite de Lua
    Meu lume de arder,

    Ó finas areias
    Ó clara manhã
    Ó rubras papoilas
    Da cor da romã,

    Ó rosto da terra
    E abismos do mar
    Ouvide o seu canto
    De longe a arfar,

    Abriram-se as velas
    Mal rompe a manhã
    Na luz e nas trevas
    Lá vai a louçã.


    José Afonso.

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  2. Papuça:

    Olha, enfia a carapuça
    Mas não compres o velho fato de ananás,
    O estilo não se empresta e nada tem sentido,
    A tua falta meu papuça,
    se podes ou não podes, tanto faz...

    Experimenta sair um pouco,
    está bom tempo na Arrábida para os ninhos meu rapaz,
    Amanhã é feriado em Paio Pires,
    Aguça o teu ouvido rouco-mouco em aguarrás...

    A multidão na rua-é Zé!
    Ouve-se a banda tocando o MFA,
    Vai o Borges, o Pina, o Xaimite e o Bibas balouçando,
    A Revolução é p'ra já...

    A bola trocada, o canto na varanda,
    De rota batida para Luanda,
    Só menos um furo no cinto apertado,
    É já primavera, amar não é pecado...

    Na fímbria da saia a lagartixa verde,
    Que um dia, alegra não se espera, bebe
    Estamos na seca. A paz é pouca, dorme uma soneca, a tia louca...

    Limpa os sovacos com este spray,
    Amanhã é dia de "Dancing Days",
    Põe nessa boca uma chupeta,
    Amanhã é dia de "Dona Chepa"...

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  3. Rui desculpe eu ter inserido dois textos do Zeca Afonso, mas estava a ouvir um disco recente do João Afonso e não resisti a transcrever estas duas...Quanto ao seu Post eu acredito que quanto maior for a clarificação melhor...Nestes investimentos gigantescos, deve Haver ainda mais aprofundamento para evitar erros grosseiros...E parece-me pelo que já ouvi que o principal problema é conseguir conciliar o tráfego de longo, médio curso e velocidade e também o de mercadorias...A única via aceitável, será a construção de pelo menos uma nova linha Porto Lisboa que disponibilize a existente para tráfego menos veloz e de mercadorias...Ora o que parece existir é a vontade de passar à construção da linha Lisboa Madrid deixando a ligação ao Porto para outras núpcias...E o que se defende nos 28 é a valorização do território do Litoral Hispano-Português entre a Galiza e Setúbal para que se modernize ainda mais toda essa enorme Região...

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  4. Caro Meireles,

    o Rui Farinas nem sempre tem o computador disponível, por isso não estranhe que não responda logo aos seus comentários. Quanto a mim, pode colocar os poemas do Zeca Afonso e de outros que goste, porque a poesia é uma mão estendida à fraternidade.

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  5. Amigo Rui Valente, obrigado pela explicação (correcta!) dada ao nosso caro Meirelesportuense.

    A este, quero dizer que não sou particularmente adepto de poesia, mas há poemas (ai os sonetos de Camões!) que me encantam. É o caso do primeiro poema do Zeca Afonso, com uma musicalidade extraordinária que nos faz ver bailar figuras nos olhos da imaginação. Por mim, poemas destes, pode postar quantos quiser! (e o Rui Valente também está de acordo...).

    Quanto à rede de alta velocidade em Portugal, devo confessar-lhe que estou pelo menos tão confuso como o governo, que parece estar (é um velho ditado gaúcho do Rio Grande do Sul) "mais perdido do que cego em tiroteio". Parece totalmente confuso e desorientado, não entende o que está a passar-se, ignora de onde veem os tiros e não sabe para onde fugir!. Falando seriamente, o governo dá toda a impressão de não ter ideias claras sobre o assunto, o que terá originado decisões tomadas em cima do joelho e sem nenhuma convicção. Ou isso, ou há uma gritante falta de comunicação com o povo português. Que diabo, não somos todos analfabetos e há quem consiga entender raciocínios lógicos. Assim nos expliquem o fundamento das decisões.

    Quanto ao manifesto dos 28, fiquei com a ideia de que, mais do que indicar soluções, eles quiseram emitir um grito de alerta e um valioso conselho ao governo: parem de investir em frente como um touro e comportem-se não como políticos demagogos, mas como seres pensantes que têm a responsabilidade de tomar decisões cruciais para o presente e para o futuro do país.

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Abrimos portas à frontalidade, mas restringimos sem demagogia, o insulto e a provocação. Democraticamente...