Os media, aquelas multifacetadas agências noticiosas que dizem viver em função do interesse público, persistem em não querer perceber que o público não é uma massa acéfala e abstracta de pessoas a quem se pode impingir tudo.
É-me permitido falar assim, generica e afirmativamente, porque em determinados momentos, mesmo os mais conceituados orgãos de comunicação, parecem não se incomodar muito em copiar os pasquins mais ordinários que por aí pululam. Nem precisamos de dar muitas voltas aos miolos para descobrir o argumento-chave que está por detrás destes descarrilamentos editoriais: é o mercado.
O público "gosta" de trampa, dá-se-lhe trampa, porque a trampa além do mais, vende. Dito assim, ou quase assim, este argumento apenas reforça a confusão do público mais criterioso sobre a credibilidade a dar ao jornalismo na abordagem que faz a assuntos sérios, como a justiça e a actividade política, por exemplo. Por que terá então o leitor, ou espectador de TV, de valorizar o jornalismo dito de referência se o próprio se abastarda quando lhe convém? Desculpem-me se mal comparo, mas é da necessidade de ganhar dinheiro fácil que nasce a motivação primeira, que explica o fenómeno da prostituição e da pornografia. Ou não é? Estão a ver a proximidade argumentativa entre as diferentes "profissões"?
Quando se gastam rios de tinta, dias seguidos, a especular sobre os 94 milhões de euros oferecidos pelo passe do Ronaldo e das suas promiscuas performances sexuais com uma americana podre de rica mas fútil como um dejecto, sem daí extrair conclusões mais altruístas do que a inevitabilidade do mercado, está-se a dar palha ao público. Quando se abrem telejornais a comparar os décibeis de uma tenista portuguesa aos produzidos pelo motor de um Ferrari, está-se a relevar o acessório [hábito tipicamente bacoco-lisboeta] para disfarçar o essencial, que é a qualidade versus/vitórias, da atleta, perturbando eventualmente a sua evolução natural, dada a sua juventude. Quando se dramatiza a morte de Michael Jackson - apesar das suas qualidades artísticas -, promovendo-lhe a imagem ao nível da canonização, está-se a desprezar a vida de algumas crianças de quem [segundo fontes juridicamente fiáveis], consta ter abusado em práticas sexuais pedófilas.
Respeitar a morte de alguém com este estigma, é aceitável, mas sacrilizá-lo é uma tremenda injustiça. E hoje, todos os jornais sem excepção, fizeram gala em provar que o crime compensa desde que o criminoso seja colunável e... garanta vendas.
Nota RoP:
Sobre M. Jackson muito se escreveu cá e lá fora, a conotá-lo com práticas pedófilas. Se foi absolvido, com ou sem justiça, não há garantias, mas a imprensa mundial, já o tinha condenado. Agora, coloca-o num santuário!
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