O território de Portugal continental é, grosso modo, um rectângulo com cerca de 600 km de comprimento e 200 de largura, situado no lado mais ocidental da Europa. Penso haver um consenso geral no país sobre este resumo da nossa localização geográfica.
Mas este consenso volatiza-se quando se passa da teoria geral para a prática. No dia a dia, e vista de Lisboa, a geografia do nosso país modifica-se por completo, evoluindo do simples rectângulo para uma organização bem mais complexa com óbvias semelhanças ao Sistema Solar.
No centro, no lugar do Sol, está Lisboa (a região mais rica da Península Ibérica em termos de paridade de poder de compra) girando à sua volta três planetas: dois planetas anões, que lhe estão próximos, e um outro, enorme e distante como Neptuno.
Os dois planetas anões são o Alentejo (onde os lisboetas com contas bancárias mais desafogadas ou níveis de endividamento mais elevados têm o seu «monti») e o Algarve (destino de veraneio alternativo para as pontes e as férias da Páscoa e Verão). Trata-se de planetas poucos povoados, que dispõem de um clima agradável e têm uma serventia essencial de diversão.
A anos luz de distância está o terceiro planeta do Sistema Portugal, vulgarmente designado pelas expressões «lá em cima» ou «província». «Norte» é o nome politicamente correcto.
O planeta Norte é densamente habitado por gente que fala com uma pronúncia parola, tem um clima horrível (é frio e húmido e está sempre a chover) e muitas fábricas onde abusam do trabalho infantil – em vez de andarem na escola as criancinhas passam o dia a coser sapatos e roupas para a Zara. O pessoal «lá de cima» diz muitos palavrões e tem a mania do futebol, onde só ganham devido às trampolinices do Pinto da Costa (mas isso vai acabar).
Não é simples estabelecer os contornos exactos do planeta Norte. Eles são realmente bastante difusos e alargados.
Durante os cinco anos em que chefiei a Redacção no Porto do Expresso recebi dezenas de telefonemas de colegas meus de Lisboa perguntando-me se era possível mandar um jornalista «dar uma saltada» a locais tão diversos como Vieira de Leiria, Monção, Tomar, Guarda, Mirandela, Termas de Monfortinho, Régua, Arganil, Fundão, Cantanhede, Viseu ou Alcafache.
Ou seja, tudo quanto está fora de Lisboa e não é Alentejo ou Algarve, integra o planeta Norte, cuja órbita está cada vez mais larga, afastando-se lenta mas inexoravelmente do Sol. E a força de gravidade exercida por atrai pequenos asteróides que se soltaram do grande planeta.
É o caso da Ota, que há muitos anos não passava de um satélite do planeta Norte, do qual se soltou entrando em rota de colisão com Lisboa. Quando a questão da localização do novo aeroporto foi recolocada, a Ota distava 66 km de Lisboa. Nos últimos estudos já estava só a 50 km. Não tarda nada, fica ali mesmo à saída de Sacavém…
Jorge Fiel (do blog "Bússola")
PS. Se quer poupar-se às maçadas sofridas por Galileu, deve abster-se de insistir com os lisboetas dizendo-lhes que o rectângulo Portugal faz parte do sistema Europa, com centro de gravidade em Bruxelas.
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