30 abril, 2008

Ainda sobre a Liberdade

Já aqui se falou da Liberdade e das suas presumidas propriedades "terapêuticas" na vida dos cidadãos, mas nunca é demais voltar ao tema. Do 25 de Abril de 1974 que tanto nos prometia, já só resta mesmo a Liberdade.

Não vou falar agora das pontes ou das auto-estradas construídas desde então, e muito menos, das obras faraónicas de Lisboa, nem da sua pertinência, porque me recuso a reconhecer nelas sinais paradigmáticos de progresso. Pior seria, se depois de tantos financiamentos provindos de fundos comunitários nada se tivesse feito entretanto.
Mais importante, era sabermos, com rigôr e transparência, aonde, e em quê, é que esses fundos foram aplicados, mas isso ficará para outra ocasião. Outra coisa importante, é vincar bem a noção de que esses fundos não foram fruto do nosso desenvolvimento económico, mas apenas o resultado da nossa adesão à União Europeia.

Retomando a Liberdade, o tema dilecto da Comunicação Social no 25 de Abril, mas tão ferido de orfandade e compreensão, talvez seja tempo de nos questionarmos se há só um tipo de Liberdade ou se, decididamente, ele tem ou não uma relação directa com o nível sócio-económico das populações. A resposta, é obviamente, afirmativa, mas o facto de termos de o lembrar já é, de per si, um sinal de que se anda há muito anos a fazer jogo sujo.

Quem, porventura, me ler de má fé, e quiser fazer de conta que não percebe onde pretendo chegar, dirá que estou a defender o regresso à censura de regimes totalitários. Nada mais errado. Com todo o respeito, duvido que exista alguém que ame mais a Liberdade do que eu, porque ela já nasceu comigo, está-me na massa do sangue. Se assim não fosse, não dizia o que digo e como digo, preocupar-me-ia (como muitos) mais em ser aceite pelos apoiantes do regime que não se resumem apenas aos que estão no poder, mas também aos que vivem dele. E não são poucos.

Recordo-me bem, das muitas noites sem sono nem cama, em que ficava na rua com os amigos, em animada cavaqueira até ser dia, a discutir sobre a vida e a política do país. Francamente, não me apercebi nunca de ver "pides" atrás de nós quando essas reuniões espontâneas aconteciam. Ou tivemos sorte, ou a PIDE/DGSE não era tão eficiente quanto isso, mas que ela existia, disso não há dúvidas.

Verdadeiramente, só tive noção da existência da PIDE, poucos dias depois do 25 de Abril, em Lisboa, em pleno Rossio, quando, na companhia de uma namorada, me apercebi de um ambiente invulgarmente sinistro entre os cidadãos, a PSP, e uns tipos vestidos à civil que depois soube serem agentes da PIDE. Com os meus vinte e poucos anos, era tal a minha imaturidade política que, quando vi aqueles "gorilas" a dispersar e agredir indistintamente quem circulava em paz, dirigi-me furioso a um chefe da PSP a perguntar-lhe o que se estava a passar e porque não fazia nada para o impedir. Lembro-me só do homem, um pouco atrapalhado, me ter aconselhado a seguir o meu caminho e de ter sentido uma indignação profunda.

Bem, mas a narração deste episódio pré-revolucionário não quer ter carácter histórico ou ser auto-biográfico, mas fundamentalmente salientar que apesar da Ditadura, do Estado Novo, eu(como outros), já tinha a minha liberdade pessoal, ninguém ma ofereceu. Cada qual tinha a liberdade que o seu temperamento permitia. Eu tinha a minha. A liberdade de regime é outra coisa, e essa, foram os capitães de Abril quem a corporizou e restituiu ao país. Sem eles, não sei se os partidos políticos clandestinos mais expressivos (PCP, PS e PSD) bastariam por si só para destronar a Ditadura.

Por conseguinte, acabemos de uma vez com esta veneração à Liberdade utópica e passemos a construir a Liberdade concreta que se alicerça na qualidade de vida do povo. É dessa que é importante falar.

A blogosfera, não obstante ser ainda muito pouco difundida, vai acabar por se transformar num veículo de comunicação e de debate público mais credível do que os restantes mídia, da imprensa, rádio e televisão, e pode vir mesmo a constituir-se a principal responsável pela sua renovação. Precisamente, porque é mais livre do que elas todas juntas.

Os jornalistas não passam de meros funcionários ao serviço dos critérios editoriais das suas chefias que só usufruem verdadeiramente da sua liberdade de opinião quando saem das empresas onde trabalham. A seriedade do seu trabalho é sempre condicionada pela da própria entidade patronal, que pode ser mais ou menos credível mas, ainda assim será sempre condicionada.

Daí a importância de procurarmos sempre "filtrar" muito bem tudo o que lemos, para o melhor e para o pior. As audiências e os números de jornais vendidos só são importantes para a área comercial das respectivas empresas, não para o consumidor. Nós consumidores, é que teremos de ter sempre a última palavra. E pensar pela nossa cabeça é a primeira das últimas.



JEAN PAUL SARTRE
Para Jean-Paul Sartre, a liberdade é a condição ontológica do ser humano. O homem é, antes de tudo, livre. O homem é livre mesmo de uma essência particular, como não o são os objetos do mundo, as coisas. Livre a um ponto tal que pode ser considerado a brecha por onde o Nada encontra seu espaço na ontologia. O homem é nada antes de definir-se como algo, e é absolutamente livre para definir-se, engajar-se, encerrar-se, esgotar a si mesmo.
A liberdade humana revela-se na angústia. O homem angustia-se diante de sua condenação à liberdade. O homem só não é livre para não ser livre, está condenado a fazer escolhas e a responsabilidade de suas escolhas é tão opressiva, que surgem escapatórias através das atitudes e paradigmas de má-fé, onde o homem aliena-se de sua própria liberdade, mentindo para si mesmo através de condutas e ideologias que o isentem da responsabilidade sobre as próprias decisões.

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