04 agosto, 2008

Automóvel eléctrico, mais um flop?

Empresas interessadas na rede logística de baterias estão insatisfeitas com a pequena dimensão do projecto e com a perspectiva de exclusividade para o grupo de Carlos Ghosn A fasquia para a introdução dos carros eléctricos em Portugal pode ficar abaixo do seu "patamar mínimo" e não ter impacto na indústria nacional.
O PÚBLICO apurou que as negociações com a Nissan-Renault, para uma parceria para estes veículos limpos, se encaminham para uma versão "reduzida", ficando-se apenas pela sua comercialização, sem qualquer produção industrial associada. O risco de desmobilização de várias empresas portuguesas, que se propunham avançar com uma rede logística de carregamento e substituição de baterias para os carros eléctricos, também é considerado real por parte de alguns dos seus promotores.
Apontam-se, neste momento, vários pontos de pressão, incluindo-se uma crítica ao ministro da Economia, Manuel Pinho, por deixar cair esta oportunidade para captar novo investimento industrial. As negociações entre o Governo português e a Renault-Nissan arrancaram em Março, visando uma série de investimentos que acelerassem a investigação, desenvolvimento e produção de carros eléctricos, de componentes, nomeadamente motores e baterias, sendo para isso necessárias também infra-estruturas específicas que os projectos automóveis convencionais não incluem. Este era o plano "óptimo". O "patamar mínimo", nestes termos, limitar-se-ia, na perspectiva portuguesa, à produção de baterias, implicando um provável aumento da produção da fábrica de Cacia.
No final de Junho, já se reconhecia o risco de esse objectivo não se encaixar nos planos do construtor, que excluiria Portugal da rota prioritária de países europeus com os quais quer formar parcerias para a investigação e desenvolvimento destes seus novos modelos ainda centrados na utilização citadina.
Em cima da mesa está agora uma versão que, para quem conhece as negociações, é um projecto basicamente de "retalho" - importação e venda de carros eléctricos da Nissan-Renault -, com alguma antecipação em relação à concorrência e para o qual o construtor quer rede logística exclusiva e incentivos para o projecto. O protocolo assinado dia 9 de Julho passado entre o primeiro-ministro, José Sócrates, e o líder da Nissan-Renault, Carlos Ghosn, já é nesse sentido que vai. O estudo de viabilidade do projecto, que deverá ser conhecido em Novembro, aponta para a importação de quatro mil veículos em 2011. Dentro do consórcio formado pela EDP, Galp, Brisa, Efacec, Martifer, Jerónimo Martins e Sonae, para a construção da rede de recarregamento e substituição das baterias eléctricas, o clima é de cepticismo. Feitas as contas, a perspectiva de uma rede logística para apenas quatro mil veículos, quando inicialmente se falava numa margem entre quatro mil a onze mil carros, acrescendo o facto de a Renault-Nissan querer um sistema exclusivo, não agrada."Não tem dimensão, ninguém vai fazer [a rede] e não faz sentido ser exclusiva de uma marca. O sistema deve ser aberto", defende um dos gestores ligado ao projecto, esperando que o Governo associe outras marcas à iniciativa, nomeadamente a VW e a BMW, também a desenvolverem veículos híbridos.
As empresas alertam ainda para o risco de os municípios olharem para este tipo de projectos como uma nova fonte de receita, o que pode onerar o custo do investimento e o acesso ao financiamento.
Apesar de contactado o gabinete do ministro da Economia, não foi possível obter qualquer comentário de Manuel Pinho por se encontrar em férias.
O investimento em carros eléctricos tem duas grandes implicações, o que faz com que as políticas governamentais o tratem ainda com desconforto: seca a receita fiscal que o sector automóvel garante ao Orçamento do Estado e exige outros investimentos a montante, nomeadamente na rede eléctrica, de modo a garantir que a energia fornecida às baterias é também limpa e não produzida a partir do carvão e do gás natural. Quantos mais carros eléctricos circularem, menos o Estado cobra em Imposto sobre Veículos (os carros eléctricos estão isentos) e Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (não usam combustíveis fósseis), responsáveis por cerca de 10 por cento das receitas fiscais totais.
(Lurdes Ferreira, no "Público")

Sem comentários:

Enviar um comentário

Abrimos portas à frontalidade, mas restringimos sem demagogia, o insulto e a provocação. Democraticamente...