04 julho, 2009

Piruetas

Henrique Raposo, cronista do Expresso, no passado dia 20 de Junho escrevia no seu blogue um texto apologista da ligação TGV Lisboa-Madrid e apelidava de “grã-finismo tonto” a ligação Lisboa-Porto. O homem ia mais longe (efeitos com certeza da velocidade estonteante deste tipo de comboios) e falava até de um TGV Lisboa-Lyon. Do seu texto transcrevo as seguintes frases que me parecem resumir o pensamento do citado sobre o assunto.

“Parece-me evidente que Portugal precisa de uma Ligação de TGV à Europa. Lisboa - Madrid é precisa. Já me parece novoriquismo a ligação Lisboa-Porto.”

“Mas a questão continua a ser a mesma: temos dinheiro para o fazer nos próximos anos? A dívida externa passou de 14% do PIB, em 1999, para 100%, em 2008. Saber esperar é uma virtude. E saber as prioridades também. Lisboa/Madrid é necessário. Lisboa/Porto é grã-finismo tonto.”

Numa breve troca de emails fiz-lhe ver que, além do facto dos TGV’s serem competitivos apenas para distâncias de 500 a 700 km e tempos de viagem até 3 horas – Lisboa-Lyon é lirismo -, o traçado proposto era uma aberração que deixava mais de metade de Portugal de fora, pois ninguém de Braga ou do Porto estaria disposto a descer de comboio 350 km para sul, 200 para leste atravessando o Alentejo e, depois, mais 400 km para nordeste em direcção a Madrid. Isto é, uns absurdos 400 km suplementares quando afinal Madrid se situa à latitude de Coimbra (dado desconhecido lá para o sul) e a escassos 500 km desta região que vai do Minho até Coimbra. Provei-lhe também que os próprios estudos da Rave provavam que o corredor Grande Porto e Norte Litoral – Madrid teria mesmo maior procura que o corredor Lisboa-Évora-Badajoz-Madrid tanto em passageiros como em mercadorias. Mais importante ainda: informei-o que o corredor Lisboa-Porto seria mesmo o único que poderia gerar tráfego suficiente para se auto sustentar. A isto respondeu-me que defendia o TGV Lisboa-Madrid não por causa de quem “vai daqui para lá, mas quem vem de lá para cá”. A isto questionei-o se “quem vem de lá para cá” seria suficiente para pagar tal quimera. Até hoje não obtive resposta.

Mas verdadeiramente espantoso foi ler a crónica de Henrique Raposo no Expresso do passado dia 27 de Junho. Passados apenas 7 dias, sem qualquer explicação prévia, o TGV passou a ser “uma mania sem valor acrescentado” e o que era bom era o eterno elefante branco de Sines e o novel aeroporto de Beja - mais um elefante branco em perspectiva que se arrisca a ser inaugurado em Setembro sem qualquer contrato firmado*. Lá pelo meio faz inclusivamente analogias com D. Quixote e Sancho Pança e postula que Sines poderá mesmo competir com as “Roterdões” lá do norte da Europa. Como se alguém da Ásia ou da América com mercadorias destinadas ao centro e norte do velho continente as fosse descarregar em Sines e embarcá-las num comboio para percorrerem 2 a 3 mil km por terra. O comboio é competitivo em terra, mas havendo mar o transporte marítimo é mesmo o mais competitivo dos transportes no que respeita a mercadorias. Quixotismos à parte, é impressionante os mortais triplos à retaguarda que certos plumitivos são capazes de fazer para defenderem o seu provincianismo cego. Provinciano é garantidamente aquele que é incapaz de ver para além das fronteiras da sua província.

* Em relação a este assunto, e pelo discurso que ouvi ontem ao responsável da Ryanair, desconfio que uma das contrapartidas dadas pelos irlandeses será mesmo alguns voos a partir de Beja.

3 comentários:

  1. “Parece-me evidente que Portugal precisa de uma Ligação de TGV à Europa. Lisboa - Madrid é precisa. Já me parece novoriquismo a ligação Lisboa-Porto.”

    As evidemcias do Sr. Raposo, além de absurdas, são demasiaso volúveis e efémreas.

    Um abraço

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  2. Enquanto muitos lisboetas ou provincianos lá instalados continuarem a ter este tipo de mentalidade de que Portugal é só Lisboa e arredores, nós, os Portugueses do Norte (de Rio Maior até Valença), continuaremos a ser roubados e discriminados, como se vê nos dinheiros recebidos da União Europeia, destinados às regiões mais atrasadas e que são gastos em Lisboa que a eles já não tem direito.
    Cada vez mais, a regionalização e autonomia que pretendemos parece que já não chega, pelo que, provavelmente, só a nossa independência em relação ao centralismo e colonialismo lisboetas nos permitirá alcançar o desenvolvimento e os direitos de portugueses livres.
    Cumprimentos.

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  3. Meu caro A.Alves duas notas: para eles nós não existimos.
    Depois houve a tentativa de negócio PT/Média Capital e o grupo de Balsemão começou a bater em tudo o que mexia.

    Um abraço e bom fim-de-semana.

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