Houve um comentador que, sobre o que foi anteriormente escrito se limitou a dizer: "tanto blá-blá-bá e não acontece nada!" . Estive quase para lhe responder que tinha razão, se não considerasse essa resposta profundamente injusta e simplista para aqueles que, como muitos de nós, sentem terrivelmente o peso e as consequências da forma ultrajante como o Porto e, genericamente, o Norte do país, vem sendo tratado pelo Governo central.
No meio desta enorme massa de gente descontente há situações específicas para cada caso. Uns, estão empregados, vivem relativamente bem, mas não se conformam com o que vêem, outros estão já reformados com reformas razoáveis, assim-assim, ou miseráveis [a maioria], e outros estão desempregados, quase desesperados, sem vislumbrar no horizonte próximo qualquer saída para as suas vidas. É assim que devemos começar por analisar a situação. Ela é ambígua, como se percebe, porque se os que estão menos mal temem perder o que têm e receiam envolver-se em movimentos que possam fazer perigar o seu relativo bem estar, os que estão mal deviam ser em teoria os mais inconformados [e se calhar até são], mas não têm como se defender.
Posto isto, é simples de perceber porque é que, por regra natural, são as pessoas melhor instaladas na vida, as mais "optimistas", mais cautelosas e "tolerantes". Elas sabem que o país não tem ponta por onde se lhe pegue, mas nos seus casos pessoais vai dando para viver bem, por isso tendem sempre a deitar água na fervura no caos governativo, para sua própria segurança. Daí considerar ser uma tremenda demagogia pensarmos que isto se resolve com associativismos e voluntarismos. Os resultados destes movimentos, na prática, assemelham-se aos das [poucas] casas reabilitadas do centro histórico do Porto pela Porto Vivo [Sociedade de Reabilitação Urbana] que são incomportáveis para quem precisa mesmo, e acessíveis para quem já tem outras casas.
Por outro lado, o povo é pacífico, não quer realmente recorrer ao único recurso que lhe resta, partir para a violência, e vai deixando passar o tempo à espera que algum Messias lhe resolva os problemas. Na vida selvagem é a Lei do mais forte que conta para sobreviver, na sociedade humana também, mas com limites. Esses limites não podem ser ultrapassados e foi para isso que se inventaram as regras. Sucede que, em sociedade, o mais forte não pode ser quem viola as regras, com maior ou menor habilidade, porque esse é precisamente o primeiro sinal de fraqueza do ser humano. Nestes casos, teria obrigatoriamente que intervir a força cega da Lei, doesse a quem doesse, mas a Lei não intervém*.
Ora, descendo de novo à terra, são exactamente esses pontos débeis humanos que vemos a serem disseminados pela nossa classe política [e empresarial], dia após dia. Impunemente. Tal situação, associada ao desemprego, ao desprezo por uma região historicamente importante do país, à acentuação do seu empobrecimento em benefício da capital e daqueles que o desgovernam e infligem fracturas na coesão, só pode degenerar em violência. É uma questão de tempo.
A União Europeia, se arrepiar caminho [estou a ser optimista] e exercer um controlo efectivo na gestão dos respectivos países, corrigindo-lhes este tipo de desvios e ilegalidades, ainda pode funcionar como um travão à desordem pública, caso contrário, o povo, mais ou menos organizado, começará a fazer estragos.
Aquilo a que assistimos pela TV há uns mêses em Paris [carros incendiados e lojas saqueadas], pode acontecer aqui, na América Latina, em qualquer lado. Responsáveis? Quem? Toda esta comandita de políticos e governantes fúteis e acomodados que se entretêm a golpear os restos de democracia do regime, à espera que ela sangre e morra de vez.
* Memorete:
Caso Casa Pia e respectivo elenco que todos conhecem [tudo gente bem], Moderna, Freeport, BPN, BCP, BPP, Dias Loureiro, Operação Furacão, e mais recentemente Face Oculta, etc. Todos os tubarões saem dos processos [quando chegam a entrar], sistematicamente ilibados. Conclusão: a primeira das fraudes em Portugal chama-se Justiça!
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