21 julho, 2008

Os nossos doutores e a Sorbonne

Hoje, fui comprar o sêlo do carro, agora chamado IUC (Imposto Único de Circulação). Como me encontrava na zona das Antas, decidi deslocar-me à Loja do Cidadão ali situada. Já não ia lá há alguns anos e - para não variar -, daí até hoje, as coisas pioraram muito.

Não sou doutorado, mas também não tenho nada contra quem o é. Só tenho, isso sim, é contra quem parte do princípio que o doutoramento é, de per si, um certificado de garantia para o que quer que seja. Efectivamente, não é, principalmente, uma garantia de qualidade. A prova mais óbvia da minha convicção é publicamente facultada através dos desempenhos da classe política.
O que mais há na política e nos govêrnos, são doutores. De advogados, economistas, arquitectos, médicos a engenheiros, não tem havido penúria e os resultados, só agradam - como é já tradicional - aos próprios. Certamente que ninguém esperará (porque não há seriedade q.b.) que sejam eles a reconhecer as suas incapacidades. Era o que faltava...
Ora, como hoje é preciso ser-se doutor, até para manusear uma chaves de parafusos, não surpreende que as suas qualificações técnicas específicas acabem por não ser muito elevadas e que, à falta delas, muitos licenciados se desloquem para o mundo da política onde as exigências académicas são mais para impressionar do que para trabalhar.
A organização de instituições públicas como as Lojas do Cidadão têm, seguramente, muitos doutores por detrás, seguramente também bem remunerados e, contudo, funcionam como se fossem geridas por verdadeiros analfabetos. Os seus conceitos de serviço público caracterizam-se inicialmente por acções positivas destinadas a impressionar, mas com o tempo, vão-se degradando até patamares de disfuncionalidade pré-caóticos. É o que parece estar a acontecer na loja do Cidadão do Porto.
Orfãos como estão de um líder político que saiba "puxar" pela região (não confundir líderes, com "salvadores" da pátria), os portuenses assistem impotentes à inauguração de sucessivas lojas na região de Lisboa (se não me engano, já existem sete!) e lá têm mais uma vez de pagar a factura de um tratamento abaixo de cão pela parte desta catraiada que pensa estar a governar o país.
Sócrates, não foge à regra, e autista como é da realidade do país, imagina que a maioria dos portugueses tem dinheiro de sobra para comprar pc's (portáteis ou não) e para aceder à Net como ele acedeu ao sofá confortável do Poder, mas não tem, e por isso, depois, a super publicitada "flexi-segurança" resulta num fiasco total. Como é aqui o caso.
Pude assistir ao seguinte, na Loja do Cidadão da torre das Antas: os diversos stands espalhados pela envolvente circular do corredor do edifício estão quase encavalitados uns nos outros. O espaço, outrora amplo e bem distribuído, com os respectivos painéis informativos bem expostos, está agora transformado numa autêntica lata de conservas onde as pessoas se atropelam involuntariamente. É tal a confusão, que mesmo arregalando os olhos para as placas indicadoras, torna-se difícil fazer uma leitura rápida e precisa da respectiva informação. A máquina de retirar as senhas de atendimento da secção da DGI onde me dirigi, tinha dois botões, um para o atendimento geral, outro para a tesouraria. Retirei uma senha do que dizia Tesouraria com o nº.29 e aguardei. O placard electrónico indicava o nº.24 o que significava que tinha 5 pessoas para serem atendidas antes de mim.
Esperei 45 minutos! A "ferver", como devem imaginar. A ferver, porque entretanto pus-me a observar o desempenho dos funcionários. Havia 4 guichés para 4 funcionários, só 3 funcionavam e uma delas esteve seguramente 10 minutos sem fazer nada, a não ser... a palitar os dentes. Contive-me, porque se dissesse o que me ia na alma, o mais certo era ter que adiar o problema para outra ocasião.
Outro exemplo. Suponho que não haverá ninguém que não reconheça a melhoria do funcionamento dos CTT desde que foram privatizados, mas já tenho as minhas dúvidas que mantenha hoje a mesma opinião. Acabamos sempre por ficar com a convicção de que mais acima falei. Estes gestores doutorados (ou não) gostam, numa 1ª. fase, de impressionar o público à laia de quem coloca o isco no anzol, mas depois do "peixe" morder, abusam e já não querem saber do peixe (o público) para nada e subvertem a qualidade do serviço inicial. Antes, quando nos dirigíamos a um balcão dos CTT, o espaço era agradável, moderno e funcional. Agora, cansaram-se de nos servir com conforto. Em nome da ganância estúpida, decidiram transformar as estações de CTT em mini-mercados. Os recintos destinados ao público, foram literalmente ocupados por toda a sorte de expositores de livros, mesas com artigos de papelaria e escritório, etc., etc. Resultado: o benefício de conforto e funcionalidade que o utente gozava inicialmente está agora a ser-lhe retirado sem pagar menos por isso.
Não me choca que os CTT possam explorar o negócio com estes pequenos "ganchos" comerciais mas nunca sacrificando a qualidade do serviço ao consumidor. Se querem vender outros produtos, então que os exponham em locais onde não interfiram com a comodidade e a boa circulação dos utentes.
Deixemo-nos de snobismos: será necessário frequentar a Sorbonne para aprender o oportunismo destes ilustres doutores? Mas, quando é que, afinal, acabará esta praga de fiteiros licenciados neste país de incompetentes?

2 comentários:

  1. Meu caro Rui Valente, foi uma grande ideia ter levantado este problema.

    A Loja do Cidadão foi vítima do seu próprio sucesso. O conceito era inovador e continua a ser valioso no que diz respeito à vantagem de permitir que se trate, no mesmo local, de assuntos referentes a várias entidades. O problema é que, como o caro Rui Valente muito bem diz, as instalações são, hoje em dia, mais que insuficientes e a circulação naqueles corredores labirinticos é uma confusão poque aquilo está cheio como um ovo. Claro que estou de acordo consigo quando diz que Lisboa vai se servindo com várias Lojas, e nós... nada. Mas também queria pedir que alguém me dissesse os nomes dos autarcas, deputados, políticos, dirigentes de associções cívicas ou profissionais, etc, que tenham batido o pé a Lisboa exigindo(não é sugerindo, é exigindo!) pelo menos mais uma loja para o Porto. Quero que também me digam as respostas obtidas. Se estamos à espera que as coisas caiam do céu como a chuva e não nos esforçamos nem nos dedicamos à causas, estamos à espera de quê? Bem podemos esperar sentados!

    Um abraço

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  2. "Heresia" sua, meu caro Farinas!

    Desculpe-me, mas não pode insinuar sequer tal coisa, do nosso honorabilíssimo autarca! Então, já se esqueceu daquela célebre frase dele (agora deve torcer a orelha de a ter dito, mas): que não era por berrar contra Lisboa que o Porto de afirmava! Pois aí temos o resultado, meu caro.
    Sabe, eu sobre Rui Rio já nem sequer me dou ao trabalho de me incomodar. Incomoda-me sim aceitar a ideia que ainda possa haver portuenses a acreditar na sua prestabilidade enquanto Presidente de Câmara!
    Abração

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